Pertenço a uma geração que se acostumou a ver as forças armadas (assim, como instituição centralizadora das três grandes forças) desfilando publicamente nas datas pátrias. Por um lado, e no momento, nos trazia um certo orgulho de ter ditos homens dedicados à defesa do país. Por outro lado, e com uma perspectiva histórica mais apurada, soubemos entender que – por trás daquela imagem de imponência – havia sórdidos usos exagerados do poder.

Seja como for, o fato é que todos os cidadãos compartilham um mesmo carinho pela palavra “pátria”. Que se bem, por um lado é um conceito abstrato e intangível, por outro se vê clara e nitidamente em coisas concretas como solo, constituição, cultura, língua e filhos (Uma leve menção a Nietzsche – “Onde está minha pátria? Onde não sou apenas cidadão, mas também pai, pois só aí começa a pátria.” em Assim falou Zaratustra e que me toca de maneira pessoal por serem meus filhos, todos eles brasileiros…)
Seja por ter caído num sábado. Seja porque não mais cultivamos certos valores por considerar-nos “avançados demais”. Seja por termos ojeriza às demonstrações de poder bélico. O fato é que este sete de setembro passou basicamente desapercebido. Foi só mais um final de semana que – se pelo menos tivesse caído em sexta ou segunda daria para chamar de “prolongado” – em nada nos chamou a atenção.
A não ser, claro, quando consideramos o lema “Brasil Soberano” enquanto manifestações políticas polarizadas tomaram as ruas com pedidos de anistia e debates sobre democracia e justiça.
Isso reflete a tensão em que vivemos com visões diferentes sobre soberania, justiça e reconciliação nacional. Esse debate sobre anistia e o papel das instituições democráticas, expôs as feridas e desafios do nosso Brasil.
Soberania de Deus e Reconciliação Humana
A neo-ortodoxia enfatiza a soberania absoluta de Deus em meio à fragilidade das instituições humanas (Barth) e a necessidade de reconciliação genuína, tendo o amor ágape como seu maior motor ou razão existencial (Nygren)
A cidade de Filipos recebeu o nome em homenagem a Filipe II da Macedônia, pai de Alexandre o Grande. Mais tarde, porém, sua maior honra foi tornar-se colônia romana. Os que ali viviam não se orgulhavam apenas do passado conquistador de Filipe, mas sobretudo do privilégio de serem cidadãos de Roma. Não ansiavam por deixar Filipos para morar na superlotada capital; ao contrário, era justamente em Filipos que viviam plenamente sua cidadania. A cidade inteira era uma pequena Roma plantada na Macedônia, refletindo em miniatura a cultura, as leis e o prestígio da metrópole.
Em Filipenses 3:20 (carta escrita quase 40 anos após Filipos se tornar colônia romana) Paulo diz a orgulhosos herdeiros de duas grandes e históricas empresas militares: “Nossa pátria está nos céus“
Assim como o cidadão filipense não precisava migrar para Roma para ser romana, os cristãos não precisam fugir deste mundo para viver como cidadãos do céu. Eles são chamados a encarnar aqui e agora os valores do Reino de Deus, sendo embaixadores em uma terra marcada pela corrupção, idolatria e divisão.
Se nos afastarmos uns minutos das coisas que nos distraem, e dedicássemos esse tempo a sermos apenas observadores do quadro brasileiro, devemos ser honestos e notar que a sociedade está polarizada, alimentando ódio mútuo.
Outra coisa que precisa destacada, é que a tentação do cristão é ou se isolar (esperando escapar do mundo) ou se alinhar cega e tribalmente a um dos polos.
Porém, o chamado é outro: ser colônia do céu no Brasil, mostrar em nossas relações, trabalho e política uma nova forma de humanidade que não é marcada pelo rancor, mas pelo serviço, amor e justiça. Aqui cabe Nygren: o motor dessa nova humanidade não é o eros da busca egoísta ou da autopreservação, mas do ágape, o amor que se doa gratuitamente, sem esperar retorno, refletindo a própria natureza de Deus
N.T.Wright (de quem extraio o paralelismo de Filipenses) destaca que a verdadeira esperança cristã não está em sistemas políticos, mas na nova criação inaugurada em Cristo.
Aplicação prática diária:
Como a Igreja (não necessariamente a instituição eclesiástica) pode ser agente de reconciliação e esperança em meio à polarização
Algumas ideias: cultivar diálogo em vez de ódio, serviço em vez de autopreservação, e esperança em vez de cinismo político.