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A culpa é do Cabral (ou do Pinzón?)

Aqueles que nascemos em berço Evangélico dificilmente entenderemos como o nosso louvor publico e privado não expressa a nossa cultura. Nos sentimos bem cantando Lutero e Wesley e quem se acha avançado, sente que louva bem com Hillsong.

Aliás, essa é nossa cultura. Uma subcultura de conserva ou uma redoma cultural se assim preferirem. As muitas tentativas de se promover um louvor mais autóctone acaba revelando um retorno frio no melhor dos casos.

Isso tem lá sua razão de ser e também tem suas consequências, sendo a pior delas (tanto razão como consequência) o isolamento em compartimentos separados hermeticamente da vida cultual com a vida secular, quando é impossível separar ambas as coisas, já que Deus não o é apenas da vida cúltica ou da vida pública, ou apenas da vida privada.

Olhando para outros aspectos, a forma em que a invasão europeia se deu (isto é, aliada à invasão religiosa e cultural) perpassa nossa realidade até hoje: vindo de fora, é melhor; o produzido dentro, é pior que produto chinês. Nisso, a portuguesa e a espanhola se distinguem fortemente da expansão grega, em que Alexandre o Grande levava pessoas não apenas para conquistar (incluindo sim cultura e religião) mas também para aprender.

O que a espada espanhola trouxe junto? A inquisição. Entre invasores, indígenas, negros, mulatos, caboclos e mestiços em geral, a única forma de crença autorizada era a que havia sido formatada por Torquemada (1420-1498) e seus sequazes, absorvida pelo movimento de contrarreforma católico e colocado em prática em terras latino-americanas pelos Jesuítas. Tudo o que escapava a isso era uma mera negociação local para evitar rebeliões.

O grande fator que distingue Brasil do restante de America Latina é a forma em que a igreja católica portuguesa, assim como o reino, organizou-se em terras tupiniquins. Em lugar de fragmentar, como fez Espanha, amalgamou. Só que não homogeneizou. Os vice-reinados espanhóis se dividiram, ao passo que o vice-reinado português se manteve único para mais tarde (fugindo de Napoleão) o próprio reinado migrar para o que nalgum momento fora chamado de “Terra Brasilis”.

Claro, é digno de nota dizer que a visão cultural do imperador era muito avançada para sua época. Alguém que foge com família e livros, não é comum. Mais adiante, quando seu herdeiro deve fugir do Brasil, é França quem acolhe ele. Mas nem Portugal, nem França, nem o Brasil são mais o que eram.

Mas há um fator que se escapa a isso tudo: a autodepreciação. A frase que mais me desaponta na boca do brasileiro é “Isso só acontece no Brasil“. Essa fortíssima baixa autoestima permeia, com diferentes impactos, todas as camadas sociais. Desde a família Orleans e Bragança até os “Da Silva”, “Da Costa” passando pelos “Garcia”, “Rodrigues” e também os “Pereira”, “Oliveira”, etc.. Alguns com amarga saudade, outros com inveterada desvergonha e outros com impassível desconhecimento da própria história e potencial; todos eles padecem do mesmo mal: “Isso só se dá aqui”

Nessa questão da autodepreciação, há um espaço enorme para acreditar que tudo o que veio da Espanha, de Portugal e dos Jesuítas é ruim. Mas também há espaço para dizer que apenas o que veio de lá é bom. E é disso que se trata. Com o fim do período da colónia, dever-se-ia separar o joio do trigo, o amargo do doce. Por não ser feito (no dia a dia) me parece que é conveniente à psiquê brasileira comum pensar de forma penosa de si e atribuir todos seus males às suas origens. Conveniência essa pela qual pagam as gerações seguintes.

Não é de se estranhar, então, que tal conjunto de fatores confronte a igreja real com grandes desafios. A única solução que me vem à mente é abraçar as diferenças e focar em curar (por meio do modelo de Ser Humano certo, isto é: Jesus) esse abismo interior que cada brasileiro carrega, levando cativo todo pensamento a Cristo e não aos devaneios que estiverem na moda.