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Maravilha, Limite e Responsabilidade

O Chamado Cristão diante da Criação

Em uma era marcada por panteísmos renovados e espiritualidades fluídas, parece mais fácil venerar uma pedra que não exige, ou meditar diante de uma árvore que não confronta.

Há um apelo sedutor em se vincular ao que é tangível e impessoal. Uma rocha não chama ao arrependimento; uma árvore não ressurge dos mortos exigindo resposta pessoal. No entanto, o Cristo ressurrecto o faz.

Panteismo e pantanteismo

Enquanto o panteísmo dissolve o Criador na criação, e o pananteísmo o dilui em um “todo que é”, a fé bíblica insiste em distinção: Deus é transcendente e mesmo assim é imanente. Ou seja, é o Deus do mais além, inatingível, inaudível, imperceptível mas é o Deus que se manifesta na sua criação de uma forma bem geral e no homem – de forma particular – mas em Jesus (Deus encarnado) de forma especial.

Deus fala – e a criação escuta (Sl. 19:1). Ele sofre – e a criação geme com ele (Rom 8:22) Ele age – e nos chama a cultivar e guardar (Gn 2:15)

Eclipses ou semi-eclipses como o de ontem, são espetáculos celestes que evidenciam ordem e beleza – mas também limitação. Eles nos situam. A Lua não brilha por si, o Sol se esconde apenas por momentos, e nós, meros observadores, somos lembrados da nossa finitude e – paradoxalmente – da nossa vocação.

Revelação, Natureza e discipulado

Perante a teología liberal – na qual nada há de sobre-natural ou miraculoso e sim tudo é uma sequência de explicações meramente racionais – teólogos do tamanho da Karl Barth resgatam a soberania de Deus e nossa necessidade de revelação. A natureza, à que muitos descrevem com atributos divinos pessoais, faz parte dessa revelação geral, mas não é a revelação integral nem de forma alguma especial.

Já perante a insistente agenda verde grandiloquente, teologos contemporáneos como N.T.Wright nos convocan a ver em Cristo o primogênito da nova criação. Uma criação que – cabe esclarescer – não é para ser descartada mas renovada. Nesse contexto, cuidar da criação não é ideologia verde e sim discipulado.

O Chamado

Portanto, o verdadeiro maravilhamento diante da criação nos empurra para além da natureza. Ele nos chama à cruz, onde o Criador tomou sobre si a dor de criação ferida. O eclipse passa, a lua minguante cresce de novo – mas o Cristo crucificado e ressurreto permanece, convocando-nos à reverência, responsabilidade e esperança

Derretimento, fluidez, desassossego

Em geral, as pessoas estão fluindo à busca de uma identidade pessoal e de uma religião que se encaixe nessa identidade. Não ao contrário.

O fenômeno pode ser explicado pelas transformações que ocorreram na sociedade e na religião atualmente à medida que a sociedade se torna mais diversa e plural.

A busca por maior autonomia e liberdade religiosa é um dos principais motivos para o desenvolvimento de novas experiências religiosas ou religiosidades não convencionais. Em vez de se vincular exclusivamente com instituições religiosas estabelecidas, as pessoas estão mais inclinadas a explorar diferentes tradições religiosas, práticas espirituais alternativas e formas personalizadas de religião formando assim seu próprio cardápio. Como se deu grande Subway espiritual se trata-se.

Além disso, ideias e práticas religiosas não convencionais têm se espalhado devido a mudanças nas dinâmicas sociais, como a urbanização, a globalização e o impacto da mídia. As tecnologias modernas também ajudaram muito, permitindo acesso a várias opções religiosas e informações.

É importante lembrar que as tradições religiosas cristãs no Brasil continuam existindo, o que mostra que essas mudanças não anulam a importância e o impacto duradouro das religiões tradicionais na sociedade. Mas não é esse meu ponto.

Meu ponto é com aqueles que estão na busca. Essa busca tem seu tempo de validade. Em algum momento você vai envelhecer e descobrir que sim há valores eternos e que sim há “certo” e “errado”. Isso está gravado a fogo no próprio ser humano e não tem como fugir disso.

Nesse ponto, não interessa se é homem, mulher; rico ou pobre; opressor ou oprimido; gay ou hétero; político ou pagador de impostos: todos têm essa lei talhada no próprio coração e não há necessidade que ninguém lhe explique nada. É apenas uma questão de tempo.

Porque todos os que sem lei pecaram, sem lei também perecerão; e todos os que sob a lei pecaram, pela lei serão julgados.
Porque os que ouvem a lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados.
Porque, quando os gentios, que não têm lei, fazem naturalmente as coisas que são da lei, não tendo eles lei, para si mesmos são lei;
Os quais mostram a obra da lei escrita em seus corações, testificando juntamente a sua consciência, e os seus pensamentos, quer acusando-os, quer defendendo-os;
No dia em que Deus há de julgar os segredos dos homens, por Jesus Cristo, segundo o meu evangelho.

Romanos 2:12-16

Inclusão cristã

No movimento de Jesus, a mensagem de liberdade e inclusão era uma das características centrais. Jesus desafiou as normas sociais de sua época, acolhendo e convidando todas as pessoas a segui-lo, independentemente de sua origem étnica, status social, gênero ou histórico de vida. Sua ênfase na amorosa inclusão ecoou nas palavras e ações dos primeiros seguidores de Jesus.

No contexto cristão dos dias de hoje, no entanto, ainda podemos identificar movimentos e teologias que, infelizmente, excluem certas pessoas da comunhão dos seguidores de Jesus. Às vezes essa exclusão é feita com base em doutrinas rígidas, diferenças sociais ou culturais, e orientação sexual ou identidade de gênero.

Isso demanda de nós um exercício bem eclético que nos leva para longe do assim chamado fundamentalismo cristão. Fundamentalismo aqui nada mais é do que tirar sempre as mesmas conclusões sem nada haver de novo ou que nos cutuque na leitura e interpretação da escritura.

Todavia, esse movimento não pode ser confundido com liberalismo mesmo requerendo liberalidade amorosa. É aquilo de se arriscar no acantilado para resgatar a ovelha.

Vivemos numa sociedade mimada que confunde o amor com liberdade irresponsável. Por outro lado, observamos que a igreja se vê acuada diante de tanta pressão social que – convenhamos – é uma pressão espiritual. Como se amar não fosse também almejar mudanças! Que o digam os pais que amam seus filhos. (Há aqueles que os detestam e também os que praticam alienação parental. Esses servem como exemplo de como não proceder)

Desde a Torá nos seus lembretes de amar a Deus por cima de todas as coisas e amar o próximo como a si mesmo que a mesma ideia se vem repetindo uma e outra vez: não deixe que seu próximo vá para a morte. Ou dito de outra forma, Jesus faz menção aos textos do antigo testamento e no contexto de Levitico 19 encontramos o seguinte:

Não odiarás a teu irmão no teu coração; não deixarás de repreender o teu próximo, e não levarás sobre ti pecado por causa dele.  

LEVÍTICO 19:17

Então, e antes que diluamos o poder do evangelho em afetos puramente terrenos e agendas antropocentristas, é urgente salientar que essa aceitação do Novo Testamento não é uma inoperante ou ineficiente, mas sim aquela que sacia a alma e transforma a totalidade do ser humano.

Talvez seja tempo de resgatar a velha ideia da theosis a partir do novo Adão que teólogos antigos como Irineu promoviam. Não para uma salvação apenas espiritual da alma no além, mas para uma vida enriquecedora e significativa agora.

Então Jesus pôs-se em pé e perguntou-lhe: “Mulher, onde estão eles? Ninguém a condenou?”

“Ninguém, Senhor”, disse ela.
Declarou Jesus: “Eu também não a condeno. Agora vá e abandone sua vida de pecado“.

João 8:10-11

Que presente dar?

Época natalina se presta para sorrir, desejar uma vida melhor e dar presentes.

É claro que a data não tem como coincidir com o nascimento de Jesus de fato, é o solstício de inverno no hemisfério norte (21/dez) e coincide com a festa pagã do Dies Natalis Solis Invicti  ou o nascimento do sol não conquistado, invicto. Mas isso não interessa agora até porque não vamos mudar a realidade de que no mundo “cristianizado” celebramos natal no 25 de dezembro e ponto.

O fato é que surge a pergunta: Que presente comprar? Que presente dar?

Há aqueles que tem uma tendência de comprar uma coisa cara, como se o valor do presente refletisse – de alguma forma – o valor dado à pessoa numa salada de valores e não-valores capaz de deixar qualquer um louco.

Há os outros que por incapacidade de decidir, não conseguem dar presentes e para piorar criticam e condenam quem assim o faz.

E tem aqueles outros que dão coisas que eles mesmos gostariam de receber numa total prática pseudo amorosa de hedonismo não confessado.

A prova de que não sabemos presentear é o cartão de crédito.

Primeiro, quem amamos não precisa presente (não pare de ler, por favor, não desanime…rs) Ou seja, as pessoas que amamos e que nos amam (pois não há amor em apenas um sentido) não precisam de presente para manter a amizade. Então o cartão de crédito -se usado neste caso- deve ser com mesura de outra forma, meses ao fio lembraremos da inutilidade de ter comprado um presente caro para quem já temos no coração.

Segundo, aquele que não se ama não requer presente. Não é um presente caro ou um elogio que vão conquistar o coração do chefe ou a aprovação do cônjuge.  Isso porque quando damos um presente além das forças, todo mundo sabe que estamos mendigando alguma coisa, de outro jeito há um monte de coisas que requerem da nossa atenção. Então, nada de entrar em dividas para agradar um fulano que não se agrada de você.

Tá, então não damos presentes?

Faça como quiser, seja livre, mas se for dar um presente, dê apenas porque gosta, ama e conhece a pessoa. Nada mais lindo que receber aquele carinho – que pode ou não ser materializado – da pessoa amada. Vale mais tomar café junto com o amigo várias vezes durante o ano do que não ter dinheiro nem para o café por ter dado aquele presente caro completamente à toa.

Presentes apenas mostram o quando conhecemos a pessoa que irá receber-lo e serão completamente inúteis para quem não gosta da gente.

Dê a si próprio. Conce-da-se ao outro. Gaste tempo com quem ama. Perdoe. Viva livre. Ame. Não é esse por acaso o exemplo de Jesus o Rei?

Saturnália e o Cristo

Talvez nunca cheguemos a compreender como é que chegamos a celebrar o nascimento de Jesus na data em que o celebramos.  Me refiro não só à data, mas ao jeito em que celebramos e às pessoas que o celebramos.

Natal está mais para um grande evento pirotécnico de marketing ocidental do que a celebração do nascimento do salvador do mundo mas isso, acho, já é moeda bem conhecida.

Para chegar rápido na sua cabeça: O que você acharia de mudarmos a data do natal para logo depois do carnaval?  Serio. Pense um pouco. Todos nós sabemos (e muitos participam) da devassidão que o carnaval propicia. Estamos plenamente cientes de que é o momento em que os papeis se invertem e o que em dias anteriores seria considerado grotesco, de mau gosto, devasso, impuro, inapropriado, etc passa a ser aceitável e quase que figurino obrigatório (mais nesses tempos de sociedade pós-modernista impregnada de imbecilidade pseudo-consciente). Imagine dois dias depois celebrar o nascimento de Jesus.

Bom, sei que talvez haja aqueles que estão pensando que exatamente isso seria uma imagem boa do que Jesus fez. Ou seja, estando o mundo no seu auge de corrupção, Jesus chega e propicia um caminho novo. É por este tipo de coisas que me refiro no inicio de que pode ser que nunca cheguemos a conhecer as razões de celebrarmos o natal nessa data.  Ou seja, quem sabe um monge pensou exatamente assim: “Ora, sendo que o festival de Saturnália continua muitos anos depois de ter sido tirado do calendário oficial e visto que esse povo precisa um sinal claro de que Jesus veio para livrá-los do jugo do pecado, nada melhor do que colocar luz no final do túnel: celebremos o natal logo após a ressaca de Saturnália”

Saturnália era uma importante festa romana que se celebrava entre os dias 17 e 23 de dezembro à luz de velas e tochas em que a ordem social sofria um intenso afrouxamento e em alguns casos uma reversão.  A data era essa por conta do final do inverno no hemisfério norte em que as noites iam se tornando mais longas até o solstício de inverno data na qual o Sol voltaria a reinar tornando os dias mais longos.

A festança começava com um sacrifício ao deus Saturno (encarregado dos assuntos Agrícolas) no lugar mais sagrado de Roma e se estendia pela cidade inteira com banquetes públicos nos quais o povo se misturava muitas vezes invertendo os papeis: Escravos que se comportavam como senhores, homens como mulheres e por ai ia.  Nesses banquetes e esse encontro prolongado de pessoas, havia intercambio de presentes e – obviamente – desejos de boa ventura nas colheitas, ao final de contas era o Sol que se estava levantando vitorioso do seu letargo e Saturno garantiria -mais uma vez- uma boa colheita.

Com o advento da institucionalização do Cristianismo o pessoal tenta cristianizar a festa e é por essa razão que celebramos o nascimento de Jesus – o Cristo – numa data em que com certeza ele não nasceu.  Fora o lance da devassidão social (que transferimos para algumas semanas depois)  mantivemos o banquete, a troca de presentes, os desejos de boa ventura, a universalidade da festa e o culto a uma divindade.

Muito mais adiante, surgiria a ideia de uma árvore (um pinus verde, para ser mais específico que vem a cristianizar a festa ao deus Frey no norte da europa), mais adiante ainda, ornamentos vermelhos (carmim para os puristas) e amarelos (ouro, na realidade).  Não podemos esquecer da estrela, das luzes, dos presentes, enfim… o que já sabemos. Dai até a árvore de natal na Baia da Guanabara com seu investimento de dinheiro público e as alterações no fluxo do transito e sua forte influencia no comercio local foram mais ou menos 380 anos.

Proponho eu mudar a data de natal? Nem matando. Isso ai não é natal nem nada que se pareça remotamente com ele. Proponho o mesmo caminho complicado de sempre: Pense e posicione-se.

Cristianizar uma festa pagã é ruim porque impede ao gentio de ver o conteúdo original da mensagem, do evento, da coisa toda. Se você fosse um alienígena (ou um cristão do primeiro ou segundo século que adormeceu e só agora saiu de sua catatonia) e chegasse de improviso entre os dias 19 e 25 de dezembro, saberia que os cristão estamos celebrando a maior loucura da nossa fé? aliás, saberia que era uma festa cristã?  Obvio que não. Parece mais uma orgia comercial, uma alforria dos cartões de crédito, um endividamento permanente pelos próximos 10 meses (sim, você nem acredita, tem pessoas que compram presentes no cartão de crédito para acabar de pagar quando a outra festa está sendo montada) do que uma celebração ao Deus feito homem.

Seja honesto com seus filhos. Se tanto lhe interessa celebrar o natal na forma em que o mundo propõe então ao menos salve seus filhos como Noé fez na arca.

Seja franco com eles. Conte que vivemos num mundo voltado para o Deus dinheiro e que de tempos em tempos precisamos endividar-nos para satisfazê-lo.

Diga a eles que da mesma forma que os gregos com o deus Crono, os Romanos com o deus Saturno, e os nórdicos com o deus Frey fazemos uma orgia gastronômica, intercambiamos presentes e desejamos um melhor período no ano.

Explique que não temos coragem para nos separar da chusma e ao menos celebrar o nascimento de Jesus – o Cristo – de forma diferenciada fazendo como o salmão que nada contra a corrente e morre na tentativa (a maior parte do tempo bem sucedida) de se reproduzir.