Talvez nunca cheguemos a compreender como é que chegamos a celebrar o nascimento de Jesus na data em que o celebramos. Me refiro não só à data, mas ao jeito em que celebramos e às pessoas que o celebramos.
Natal está mais para um grande evento pirotécnico de marketing ocidental do que a celebração do nascimento do salvador do mundo mas isso, acho, já é moeda bem conhecida.
Para chegar rápido na sua cabeça: O que você acharia de mudarmos a data do natal para logo depois do carnaval? Serio. Pense um pouco. Todos nós sabemos (e muitos participam) da devassidão que o carnaval propicia. Estamos plenamente cientes de que é o momento em que os papeis se invertem e o que em dias anteriores seria considerado grotesco, de mau gosto, devasso, impuro, inapropriado, etc passa a ser aceitável e quase que figurino obrigatório (mais nesses tempos de sociedade pós-modernista impregnada de imbecilidade pseudo-consciente). Imagine dois dias depois celebrar o nascimento de Jesus.
Bom, sei que talvez haja aqueles que estão pensando que exatamente isso seria uma imagem boa do que Jesus fez. Ou seja, estando o mundo no seu auge de corrupção, Jesus chega e propicia um caminho novo. É por este tipo de coisas que me refiro no inicio de que pode ser que nunca cheguemos a conhecer as razões de celebrarmos o natal nessa data. Ou seja, quem sabe um monge pensou exatamente assim: “Ora, sendo que o festival de Saturnália continua muitos anos depois de ter sido tirado do calendário oficial e visto que esse povo precisa um sinal claro de que Jesus veio para livrá-los do jugo do pecado, nada melhor do que colocar luz no final do túnel: celebremos o natal logo após a ressaca de Saturnália”
Saturnália era uma importante festa romana que se celebrava entre os dias 17 e 23 de dezembro à luz de velas e tochas em que a ordem social sofria um intenso afrouxamento e em alguns casos uma reversão. A data era essa por conta do final do inverno no hemisfério norte em que as noites iam se tornando mais longas até o solstício de inverno data na qual o Sol voltaria a reinar tornando os dias mais longos.
A festança começava com um sacrifício ao deus Saturno (encarregado dos assuntos Agrícolas) no lugar mais sagrado de Roma e se estendia pela cidade inteira com banquetes públicos nos quais o povo se misturava muitas vezes invertendo os papeis: Escravos que se comportavam como senhores, homens como mulheres e por ai ia. Nesses banquetes e esse encontro prolongado de pessoas, havia intercambio de presentes e – obviamente – desejos de boa ventura nas colheitas, ao final de contas era o Sol que se estava levantando vitorioso do seu letargo e Saturno garantiria -mais uma vez- uma boa colheita.
Com o advento da institucionalização do Cristianismo o pessoal tenta cristianizar a festa e é por essa razão que celebramos o nascimento de Jesus – o Cristo – numa data em que com certeza ele não nasceu. Fora o lance da devassidão social (que transferimos para algumas semanas depois) mantivemos o banquete, a troca de presentes, os desejos de boa ventura, a universalidade da festa e o culto a uma divindade.
Muito mais adiante, surgiria a ideia de uma árvore (um pinus verde, para ser mais específico que vem a cristianizar a festa ao deus Frey no norte da europa), mais adiante ainda, ornamentos vermelhos (carmim para os puristas) e amarelos (ouro, na realidade). Não podemos esquecer da estrela, das luzes, dos presentes, enfim… o que já sabemos. Dai até a árvore de natal na Baia da Guanabara com seu investimento de dinheiro público e as alterações no fluxo do transito e sua forte influencia no comercio local foram mais ou menos 380 anos.
Proponho eu mudar a data de natal? Nem matando. Isso ai não é natal nem nada que se pareça remotamente com ele. Proponho o mesmo caminho complicado de sempre: Pense e posicione-se.
Cristianizar uma festa pagã é ruim porque impede ao gentio de ver o conteúdo original da mensagem, do evento, da coisa toda. Se você fosse um alienígena (ou um cristão do primeiro ou segundo século que adormeceu e só agora saiu de sua catatonia) e chegasse de improviso entre os dias 19 e 25 de dezembro, saberia que os cristão estamos celebrando a maior loucura da nossa fé? aliás, saberia que era uma festa cristã? Obvio que não. Parece mais uma orgia comercial, uma alforria dos cartões de crédito, um endividamento permanente pelos próximos 10 meses (sim, você nem acredita, tem pessoas que compram presentes no cartão de crédito para acabar de pagar quando a outra festa está sendo montada) do que uma celebração ao Deus feito homem.
Seja honesto com seus filhos. Se tanto lhe interessa celebrar o natal na forma em que o mundo propõe então ao menos salve seus filhos como Noé fez na arca.
Seja franco com eles. Conte que vivemos num mundo voltado para o Deus dinheiro e que de tempos em tempos precisamos endividar-nos para satisfazê-lo.
Diga a eles que da mesma forma que os gregos com o deus Crono, os Romanos com o deus Saturno, e os nórdicos com o deus Frey fazemos uma orgia gastronômica, intercambiamos presentes e desejamos um melhor período no ano.
Explique que não temos coragem para nos separar da chusma e ao menos celebrar o nascimento de Jesus – o Cristo – de forma diferenciada fazendo como o salmão que nada contra a corrente e morre na tentativa (a maior parte do tempo bem sucedida) de se reproduzir.