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A importância da quinta-feira da semana santa

Introdução

Vivemos em uma época em que as palavras são esvaziadas de seus conceitos originais de forma proposital para poderem ser usadas em outros contextos e – obviamente- com outros propósitos.

O exemplo mais simples que vem na minha cabeça é a antiga palavra caridade. Esta palavra originalmente transmite a ideia daquele amor que surge no coração de Deus e que se manifesta para minha pessoa mas também para meu próximo em ações concretas. Todavia, hoje a palavra caridade é quase um insulto. Pensar que um homem forte e trabalhador seja passível de caridade é -nesta época- um contrasenso, já que a palavra passou a significar um ato quase desprezível de dar o mínimo para quem não tem o que comer. E para piorar, geralmente este “ato de bondade” é feito com material da pior qualidade, ou tirando fotos para poder postar em redes sociais. Ou seja, a pior de todas as situações.

O mesmo acontece com as palavras misericórdia, humildade, bondade, perdão e por ai vai. Lembro de uma ocasião em que alguém ficou extremamente bravo comigo por sugerir que ele era humilde. A reação violentíssima dele demonstrou que eu estava errado e que ele não sabia do que se tratava a humildade. Por duas ocasiões me vi perante pessoas que tinham cometido um erro grave contra outrem e insistiam em que eles tinham que perdoar a parte ofendida quando na realidade o que deveriam de fazer era confessar o fato e pedir o perdão da parte afetada. A lista é interminável.

Com o adágio de “dá para entender”, simplesmente vamos permitindo que as palavras percam seu conceito, passem a significar geralmente o contrário e a comunicação (que é a base dos relacionamentos e as construções humanas) virem uma pequena torre de babel sem qualquer necessidade.

Falando nisso, “adágio” nada mais é do que um provébio popular do qual se pode tirar algum tipo de ensinamento moral. O que chamamos de ditado popular. Com isso entramos em outro assunto que são as palavras esquecidas por falta de uso no dia-a-dia. Quando se juntam as duas coisas a comunicação vira uma torre de babel atômica em que qualquer parte que se mexa, explode tudo pois não há compreensão do que se quer dizer seja pelas palavras, seja pelo conteúdo das mesmas ou seja pelo uso pouco comum destas.

Uma das palavrinhas que é usada nestes dias é Páscoa e ela tem um conceito todo especial para o povo judeu e – por transferência ou posse – também para os cristãos em sua maioria.

Propósito

Busco hoje, que você adquira o uso correto da palavra páscoa e finque uma posição clara e definida ao respeito do que – como cristãos de liturgia livre – pensamos (ou deveríamos pensar) ao respeito. A trilha pela qual chegaremos a essa definição e aplicação prática passa por entender o significado original da palavra e entendermos a aplicação certa e errada que se faz do termo. Como brinde desse percurso vai poder observar o mundo no qual vive com olhos renovados e entenderá a razão pela qual falamos que “somos uma nova criação”

Uma primeira aproximação do texto a ser usado.

Bem sabido é de que gosto bastante do evangelho de João. E também é conhecida a frase de que “é um evangelho desequilibrado”, brincando com a palavra “desequilibrio” tendo plena clareza de que talvez “desbalanceado” faria mais sentido mas não ficaria tão chamativo.

Todavia, quero com isto fazer referência ao fato de que dos 21 capítulos deste evangelho os primeiros 11 (na realidade até o 12:12) são dedicados à encarnação de Jesus e o seu ministério público e privado. Do 12:12 até o 20:23 João nos apresenta apena a última semana de Jesus até sua crucificação e ressurreição, deixando um pequeno epílogo (20:24-21:25) para cuidar de Tomé, os discipulos e Pedro.

Mais da metade do evangelho é usado para essa semana. Logo, ela deve ser muito importante. Uma outra coisa que eu fico admirado é a aussência de um registro entre o 19:42 e 21:1. O sábado simplesmente falta no relato.

O que tem de tão especial essa semana (que coincide com a celebração da páscoa judaica) para nós cristãos do século XXI?

O ápice da semana santa.

Costumamos colocar o ponto mais alto da semana santa como sendo o domingo. E não há erro nenhum nisso e já veremos a razão. Mas há três dias que costumamos esquecer. Talvez por sermos de liturgia livre, não damos tanta atenção a isso. Ou talvez por não entendermos o que esses dias significam. Ou por nunca termos parado sequer para pensar neles.

Venho de uma cultura evangélica livre em que se preza pelo pensamento autônomo mas também pelo andar como um só povo. Não fosse que há virtude nessas duas coisas, diríamos que se trata de uma grande ironía. Todavia, o pensar independente acha sua maior manifestação na compreensão do fato de que ser cristão é pertencer voluntariosamente ao povo que segue Jesus o Cristo.

É por essas e outras que lá temos durante a semana santa diferentes tipos de atividades que relembram os diferentes momentos da semana santa. Aqui no Brasil isso é notoriamente mais um terreno utilizado pelo rebanho católico romano e o reformado. Acho que podemos aprender com eles.

A quinta-feira

Não querendo me estender muito, e precisando que os conceitos burbulhem em sua mente e aqueçam seu coração, elencarei então rápidamente a razão de cada dia ser tão especial assim, antes de debruçar-nos sobre o domingo.

O capítulo 13 de João nos coloca na quinta-feira e o detalhe é “tendo amado os seus que estavam no mundo, os amou até o fim“. Uma outra forma de traduzir seria “mostrou-lhes então que os amou perfeitamente“. Isso é apenas uma nota introdutória para uma seqüência de dialogos e discursos de Jesus centrados em preparar seus discipulos para algo que iria acontecer.

É nesse contexto que encontramos Jesus lavando os pés dos seus discipulos em uma ceremônia privada antecedendo a ceia (13:5-17). Vemos Jesus anunciando que será traído (13:18-30) que Pedro o negará (13:31-38) que é necessário guardar a calma e a fé porque um dia ele voltará para buscar os seus (14:1-3) e que seus discípulos conhecem o caminho ao Pai (14:4).

Mesmo tendo ele gasto três anos mostrando o caminho, vivendo a verdade e sendo a vida entre seus discípulos, eles não tinham compreendido esse fato. Quem traz essa dúvida é Tomé mas do jeito que está colocada, vemos que era uma dúvida do grupo. Suspeito que se eu estivesse entre os doze, também não teria entendido.

Seja como for, ele deixa claro que ele mesmo é – ao mesmo tempo – as três coisas: O caminho, A verdade e A vida (14:5-7). Ele é a realização das três necessidades básicas de todo ser humano em qualquer época. Até uma organização criminosa luta por se manter no caminho escolhido, condena a mentira dentro da sua sociedade e quer – a qualquer custo – preservar sua própria vida. Já Jesus é o climax da revelação divina ao ser humano total.

Mas Filipe (aquele que foi atrás de Natanael, e também o que recebeu os gregos que queriam ver Jesus, e também aquele ao que Jesus perguntou onde conseguiriam pão para alimentão a multidão) reforça a ideia de que -mesmo perante o autor da vida- eles não estavam entendendo coisa nenhuma do que acontecia. Não é de estranhar que hoje, para nós cristãos nominais de qualquer rebanho do século XXI, a quinta-feira nos comunique pouco e nada de forma prática.

A resposta de Jesus é simples na aparência. Superficialmente simples apenas. Mas que a podemos resumir aos efeitos práticos no seguinte: Jesus e o Pai formam uma unidade indivisível; dai que crer no Filho é Crer no Pai e não se pode crer no Pai sem crer no Filho. Eles estão em pé de igualdade. Logo a seguir, Jesus acrescenta o Espirito Santo nesta equação e o lance fica ainda mais confuso pois Judas (não o traidor) continua entendendo toda a operação em termos universalistas ao passo que Jesus volta a insistir na obra limitada do Espírito Santo naqueles que amam Jesus não como ato filosófico, ilusório ou abstrato, mas como seu Senhor. A resposta para Judas vem no final do capitulo 14 (14:31) e indica claramente que é necessário que o mundo saiba que o Filho ama o Pai como seu Senhor. Isto é na mesma forma em que ele espera que seus discípulos o amem.

Logo a seguir, encontramos a parábola da videira e os ramos, o aviso de que o mundo odiará seus discípulos (não apenas que vai achar eles chatos, mas sim que desejará a morte dos mesmos) e insiste na relação estreita que há entre os discípulos, o Filho, o Pai e o Espírito Santo (15:18,19,21,26). Jesus torna a falar do Espírito Santo e sua obra (16:5-16) – que por sinal é magnífica e completa 16:8- e conclui avisando que a tristeza que seus discipulos pronto haveriam de sentir, se convertiria em alegria (16:17-37).

Este momento privado de Jesus com seus discípulos se encerra com uma oração por si mesmo, pelos seus discípulos e pelos que haveriam de crer no futuro, ou seja, cada um de nós.

Tudo isso (13:1 ao 17:26) ou seja, mais de 19% da obra de João é dedicada apenas à quinta-feira da páscoa judaica e aos cuidados e preparativos que Jesus tinha que fazer antes da sua crucificação, morte e resurreição.

A maior parte do material que João utiliza é inédita. Ou seja, não está presente nos outros evangelhos. Isso de por sí só, deveria levar nossos olhos a revirar mais esses textos. A cultura à qual o evangelho de João é encaminhada (a greco-romana) é mais parecida com a nossa do que queremos aceitar. Por isso que este evangelho entre os quatro se encaixa mais nas perguntas que temos e é por isso que o escolho recorrentemente para a cosmovisão que tenho sobre a ação de Jesus o Cristo na sua criação.

Logo a seguir, temos o relato da prisão, a crucificação, a morte, o silêncio de sábado e a resurreição. Tudo isso apertado em dois capítulos e meio (18:1 – 20:22) que representam 11% do livro de João. Se levamos em conta que 18:1-18:27 ainda acontece na noite de quinta para sexta, a nossa atenção deveria ser redobrada para aquele dia sem por isso tirar alguma atenção da sexta, do sábado e do domingo.

Todavia, como geralemente sexta e domingo recebem bastante atenção gostaria de centrar minha atenção na quinta e no sábado (o dia mais relatado e o dia mais esquecido de João) para tentar sugerir que o foco da vida da igreja é a fé, resolução e esperança que Jesus queria estabelecer nos seus discípulos nesse dia já que se fosse após, não seria mais pela fé.

A páscoa

Falar em páscoa judia é um pleonasmo. Todavia, é uma redundância necessária pois achamos que a páscoa é cristã.

Aliás, com tanto ovinho feito de chocolate e coelhos saltitantes o significado original da páscoa tem se perdido que nem o do natal com seu Papai Noel, sua árvore, e seus presentes não dados mais ao menino rei mas sim às crianças que as temos colocado (de forma absurda e errada) como reis do lar, com o qual damos lugar a gerações cada vez mais frágeis e quebradiças. A estratagema de tirar o conteúdo original da palavra e substituir por outro igual e contrário tem dado certo. Ninguém associa Jesus com Natal nem com a Páscoa.

Se faz necessário, então, usar a redundância, o pleonasmo, a repetição de “Páscoa Judaica” para chamar a atenção sobre o fato de que ela tem um significado e não é exatamente o que celebramos como cristãos e em especial como cristãos de liturgia livre.

Para os judeus, a páscoa é a celebração da libertação liderada por Moisés do Egito. A palavra páscoa tem origem na palavra hebraica חג הפסחא (Pêssach) que significa “passar além”. Não só faz referência a passar adiante geográficamente no sentido de sairem do Egito, mas também no passar além da escravidão chegando à liberdade.

É então a festa que marca o inicio do êxodo do povo hebreu. E o Êxodo marca o inicio do ano judeu. Então a sensação que nós sentimos perto do Natal é semelhante à que os Judeus sentem nesta data toda especial para eles.

Encontramos o relato em Êxodo 12.

O Êxodo

A páscoa é uma celebração feita antes da saída, onde não haviam garantias nenhuma ainda de que iriam sair. As ultimas noticias que tinham era que o rei egipcio estava endurecido (11:10).

O cordeiro pascal (que havia sido separado no dêcimo dia do mês) seria morto à tarde do decimoquarto dia ao mesmo tempo em todas as casas (12:6).

Sempre lembro da vez que vi meu vó matar um cordeiro. Eles morrem sem fazer barulho, em completo silêncio. Não é errado imaginar como essa imagem se impregrnaria na retina dos mais novos.

A primeira coisa a ser feita após matar o cordeiro, era um ato de fé também: o sangue seria usado para marcar o batente da porta do local onde seria comido mais tarde. Geralmente queremos injetar no texto a ideia de uma coisa pesarosa, angustiante. Só quem já comeu cordeiro assado com algum molho amargo sabe o gostoso da mistura. Um pão não fermentado acompanharia essa ceia da qual não poderia sobrar nada (12:10) Ela seria comida de forma apressada, prontos para partir (12:11).

Enquanto isso acontecia do lado de dentro da casa, o pior dos terrores dos egipcios estava acontecendo. Lembre-se que a religião deles lhes garantia que era necessário fazer os rituais noturnos apropriados para poder ajudar o sol a vencer seus inimigos noturnos e sair novamente o dia seguinte. O “Terror Noturno” do que fala o salmo 91 ou a “peste que se move sorrateira nas trevas” aparentemente faz referência a esse pavor que noite após noite tomava conta dos egipcios.

Após Yavé destronar as divindades egipcias restava um último ato que mostraria sua superioridade como único Deus mas também sua justa vingança pela morte dos filhos hebreus relatada em Êxodo 1:22; a morte dos primogénitos egipcios. A soma de todos os medos egipcios tivera sua completa vazão nessa noite em que o anjo do Senhor passara sobre o Egito varrendo com mortandade todas as casas do Egito (12:29) poupando apenas as casas em que -pela fé- tinham marcado o batente da porta com sangue do cordeiro.

Logo depois, na manhã seguinte, os hebreus sairiam do Egito para nunca mais voltar. Era o início de uma nova época para o povo. A liberdade (com todos seus sensabores) se descortinava perante eles, ficando para atrás não apenas 430 anos de escravidão mas também os últimos meses de angustia ocasionados pela resposta de Deus ao clamor do povo.

A páscoa é então esta celebração anual que os judeus têm desde aquela época até o presente. E é numa festa dessas que encontramos Jesus com seus discípulos nas passagens que nos ocupam hoje.

A celebração cristã

É na páscoa judaica que Jesus é preso, morto e resurreto. Esse é nosso ponto de contato com a páscoa judaica. O cordeiro pascal perfeito (Jesus o Cristo) já foi sacrificado (1 Co. 5:17) não havendo – portanto – possibilidade de celebrarmos outra páscoa. O que nos resta é a celebração da ceia do Senhor que é a ordenança por meio da qual relembramos e anunciamos a morte de Jesus o Senhor e Messias até que ele volte.

Todavia, é também a páscoa judaica e a ceia cristã o ponto de inicio de uma nova criação. Assim como a primeira páscoa é o inicio do ano hebreu, o inicio do êxodo que depois daria lugar à conquista da terra prometida, é a ceia do Senhor (a última da qual ele participou até voltar Mt.26:29) o inicio de uma coisa completamente nova. Em certo sentido é nosso Êxodo mas também nossa Gênesis. Ou seja, o nosso peregrinar nesta terra, mas também o inicio da nova criação.

Geralmente as pessoas que habitam este planeta podem ser agrupadas em dois grandes categorias: aqueles que acham que Deus sim criou o mundo mas o deixou abandonado a sua própria sorte e os que acreditam que chegar ao prazer sem sentir nenhum tipo de dor ou efeito dos afetos é o ideal.

A ceia do Senhor nos relembra aos cristãos que exatamente estamos fora desses dois grupos. Primeiro porque o prazer pessoal nunca pode ser a filosofía de vida já que ele está preso a esta criação. A não ser que seu maior prazer seja Jesus o Cristo, não há lugar para ser o prazer sem dor a bússola de sua vida. Segundo porque é exatamente na ultima páscoa celebrada e na primeira ceia que vemos que Deus não deixou sua criação degringolar.

A criação

Ele não fez robozinhos aos quais se dá corda e se abandona rodando sozinhos. Adão, Noé e Abraão são apenas precursores de um mesmo projeto: uma criação com vida própria cuja maior alegria é servir seu criador com espírito voluntarioso.

Nesse sentido, Jesús – então – não é um plano de emergência ativado de última hora porque nem Adão, nem Noé, nem Abraão conseguiram atingir o alvo de criar uma familia universal consagrada a servir alegremente ao criador. Trata-se na realidade da realização do projeto original em que apenas Deus – o criador – leva absolutamente toda a gloria.

Se Adão, Noé ou Abraão tivessem conseguido o alvo de se tornarem um único povo ou uma única e extensa familia de adoradores, logo, o plano original não teria razão de ser pois Deus seria – basicamente – redundante.

Celebramos então – junto com toda a atividade da quinta-feira e o silêncio do sábado – a consumação do plano divino: o inicio de uma nova ordem cósmica em que o Rei conquista o território e ocupa o lugar que lhe é por direito seu e que seus servos insitiram muitas vezes em dar ao seu inimigo.

Se paramos um pouco para olhar a última palavra de Jesus antes da sua morte registrada por João no 19:30 “tetelestai” – “está consumado” precisamos parar e ficar em silêncio observando essa manifestação do Rei.

Não se trata apenas de uma palavra se bem que ela aparece apenas duas vezes no Novo Testamento (João 19:28 e 19:30) mas uma declaração formal de que a sexta-feira da nova criação chegara ao fim. Na primeira criação o homem é criado na sexta-feira. Na segunda criação o homem perfeito morre na sexta-feira para poder dar lugar à nova criação.

Da mesma forma que na primeira criação Deus descansou das suas obras (Gên 2:2;3) João nos registra um dia inteiro de silêncio sem nenhum registro. Ou dito de outra forma: não há sequer uma linha escrita no evangelho de João ao respeito do sábado. Tetelestai: está consumado; agora vem o descanso.

Na primeira criação sendo o homem criado na sexta feira, o primeiro dia completo dele seria o sábado ou o dia de descanso.

Na segunda criação o homem perfeito descansa o sábado inteiro.

Os dois sábados nos levam apenas à conclusão de que Deus continua no controle. Ao final das contas, é exatamente o que o sábado relembra: independente do seu esforço a criação continua funcionando na boa.

A morte não pode impedir Deus de realizar sua obra. Da mesma forma que a morte entrou por meio de Adão, é por meio de Jesus que a vida entra profusamente na antiga criação. A ordem se inverte colocando as coisas de novo no lugar que eram para estar sempre.

É exatamente isso que celebramos: Jesus colocou as coisas de novo no lugar e ele tomou as rédeas. A vida – que hoje se extende a todos – só é possível porque Jesus o Ungido nos libertou da escravidão.

Se é somente para esta vida que temos esperança em Cristo, dentre todos os homens somos os mais dignos de compaixão.
Mas de fato Cristo ressuscitou dentre os mortos, sendo as primícias dentre aqueles que dormiram.
Visto que a morte veio por meio de um só homem, também a ressurreição dos mortos veio por meio de um só homem.
Pois da mesma forma como em Adão todos morrem, em Cristo todos serão vivificados.
Mas cada um por sua vez: Cristo, o primeiro; depois, quando ele vier, os que lhe pertencem.
Então virá o fim, quando ele entregar o Reino a Deus, o Pai, depois de ter destruído todo domínio, autoridade e poder.
Pois é necessário que ele reine até que todos os seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés.
O último inimigo a ser destruído é a morte.

1 Coríntios 15:19-26

Essa nova ordem mundial, que está sendo implementada não pelas instituições cristãs mas pela vida transformada daqueles que tem entregado a vida ao Rei, terá sua realização completa na segunda vinda de Jesus o Cristo.

Propósito de vida

É esta a razão de existência da igreja. Não apenas de cada congregação local, mas da Igreja do Senhor que não conhece limites de credo, raça, sexo ou passado como vemos em Efésios 2.

É apenas em razão da morte e ressurreição de Jesus que você e eu podemos ter a vida do Eterno em nós mas também ter acesso à vida eterna já iniciada. Essa nova ordem não se distancia muito daqueles propósitos originais que Deus tinha na criação. Não poderia ser diferente, já que o que Deus está fazendo hoje por meio da igreja é colocar essa criação em ordem até chegar o momento adequado de eliminar os inimigos que ainda – abusando da liberdade – se levantam contra a ação de Deus.

É por isso que tudo que você faz, cobra um novo brilho e um novo sentido, porque não se trata de grandes construções físicas ou materiais mas apenas de saber tocar com ternura e firmeza a vida do próximo.

Contudo, pode ser que você desanime. Que em algum momento diga: a vida cristã não vale a pena; estou cansado; de nada vale meu esforço; tudo o que aqui fizer aqui vai ficar; o que vale é a alma apenas e por ai vai.

Lembre então do seguinte versículo:

Portanto, meus amados irmãos, mantenham-se firmes, e que nada os abale. Sejam sempre dedicados à obra do Senhor, pois vocês sabem que, no Senhor, o trabalho de vocês não será inútil.

1 Coríntios 15:58

Você celebra a páscoa?

Há muitos cristãos que acreditam piamente que o que se encerra hoje é a celebração da páscoa.

É verdade que a comemoração dos judeus é verdadeiramente a páscoa. Está certo em celebrarmos a data deles? Sim, se você conseguisse celebrar o Ramadã morando ou estando sob influencia muçulmana, a resposta é sim. Ou seja, não é uma festa de origem cristã, ela em si mesma não lhe diz à cristandade. Portanto, não é uma festa nossa assim como não o é o Natal que é uma apropriação da festa pagã do “Sol Invictus” do tempo dos romanos. (Mais sobre isso aqui)

Porém, ficando claro que é uma festa que não é da nossa origem, uma segunda análise nos leva exatamente na direção contrária. O que se celebrava na páscoa? A liberação que havia de vir ainda. Ou seja, naqueles dias da primeira páscoa se escolhia e preparava o cordeiro durante os dias anteriores. Por quatro dias, ele era preservado e todos na casa sabiam o que estava se preparando. Imagino que a sensação deveria ser similar à que sentimos perto do Natal no mundo cristão ou do Ramadã no mundo muçulmano. Ou seja, grande e aberta expectativa.

No final do quarto dia, ele era abatido (Ex12:6). Lembro meu vó abatendo um carneiro. Eles morrem em silêncio. Em todas as casas haveria um certo silêncio naquela mesma hora. Talvez um certo murmurio suave e um tanto solene enquanto se explica aos mais novos o que está acontecendo e como isso é uma preparação do que haveria de vir.

Parte desse sangue serviria para marcar o batente da porta. Num claro sinal público de comprometimento pela fé no que haveria de acontecer. (Ex12:7)

Depois começaria a outra parte da celebração. O churrasco (Ex12:8), o jantar. Quem nunca comeu ou comeu e não gostou não tem noção de como é gostoso um churrasco de carne de carneiro (meio adocicada) acompanhada com ervas amargas. É uma delicia ao palato. Quem nunca esteve numa churrascaria gaucha de verdade (não as imitações paulistas) não sabe o como é gostoso comer não apenas a carne, mas também todas as outras partes do animal. Uma verdadeira festa de sabores.

Comento estes detalhes culinários apenas para trazer à tona um fato que geralmente não associamos com as celebrações religiosas judaicas: São uma baita festa. Os povos semíticos são povos expressivos e as celebrações tem música, dança e, claro, por ser uma festa judia iniciada em solo egípcio, tinha cerveja e da boa não das feitas com arroz e/ou cereais não maltados, eles usavam a melhor cevada disponível na região. Ao final das contas a saúde de adultos e infantes dependia disso. (Veja mais aqui)

Assim como a entrega dos dízimos, a festa das colheitas e tantas outras, a celebração da páscoa era exatamente isso, uma grande e ousada festa. Temos o costume infernal de solenizar tudo. Talvez pela herança dos conquistadores, talvez por achar que existe alguma diferença entre o sagrado e o criado, ou talvez por não nos sentirmos relaxados de fato na presença do Criador, quem sabe?

O cheiro do churrasco na brasa no ar, a noite caindo e as sensações se juntando. Havia expectativa, ansiedade, alegria e tristeza. Tudo junto. Mais ou menos como a morte do único parente rico e muito bem querido e respeitado em uma família pobre. Os sentimentos se misturam, não tem jeito.

Havia expectativa por ser a primeira vez que iria a acontecer o que estava por acontecer. Tristeza porque iam deixar tudo o que tinham conhecido como realidade nos últimos quatrocentos e trinta anos. Alegria, porque ao fim seriam libertos e ansiedade porque o que estava por acontecer, se escapava da mão deles.

A festa era de cunho divino no sentido que tinha sido uma idealização de YHWH transmitida a Moisés. A própria celebração era realizada com componentes culturais próprios. A abrangência do sacrifício era para todos os escolhidos e apenas para eles (Ex12:3,45). A participação era -como todas as celebrações do antigo testamento- pela fé já que a pessoa poderia se abster de crer e deixar de pintar o batente da porta, por exemplo. A realização prática era na família e, se ela for pequena, junto com a família do vizinho numa demonstração particular de fé comunitária.

Então a noite foi ficando escura. Algumas músicas foram parando. Algumas risadas diminuindo. Após a meia noite (Ex12:29) os primeiros gritos foram se ouvindo. As primeiras frases de arrependimento ditas em pranto foram sendo ouvidas. Em todas as casas onde a marca de sangue no batente da porta não tinha sido feita, o anjo do Senhor entrou e matou o filho mais velho não apenas das pessoas, mas dos animais. Em todas as casas no Egito havia um filho morto (Ex.12:30)

Nessa mesma madrugada, o Egito manda os judeus – sua grande e barata mão de obra – ao deserto. A liberação que uns poucos esperavam, pela qual muitos clamavam, mas que de fato a maioria não desejava que se concretiza-se estava sendo finalmente realizada. (Ex.12:31-33)

Deus era fiel ao seu próprio plano. Deus não tinha esquecido da sua promessa. Deus não tinha abandonado seu povo como muitos achavam. Deus, continuava sendo O Soberano. A fé não era mais necessária pois estava claro até para o mais obstinado descrente que Deus era quem mandava no pedaço. Não se tratava mais de crer que um dia a salvação chegaria, era obvio e manifesto que o lance estava acontecendo ali e nesse momento.

cruz-vazia

Uns 1400 anos depois um outro cordeiro morreria. Um judeu de origem humilde. Um carpinteiro de profissão. Ele falava que a salvação da qual muitos falavam, poucos acreditavam e menos pessoas ainda esperavam de fato que se concretiza-se, dependia dele. Especificamente da morte dele.

A morte de Jesus o Cristo se dá justamente na celebração da páscoa. Ele morre e aqueles que ouvem hoje sua mensagem e depositam a fé nele (pois pode-se ouvir, entender, concordar mas não se render) são salvos. A ressurreição dele (que celebramos todo domingo) apenas nos lembra de que ele prometeu voltar da morte e também prometeu um dia vir buscar os seus. Logo, se se mostrou poderoso para cumprir a primeira promessa (muito mais difícil de cumprir do que a segunda por se tratar dele mesmo) é capaz de cumprir a segunda.

Então, meu querido, que páscoa você celebra? A dos ovinhos de chocolate e das frases feitas? A de evitar comer certos tipos de comida? A do recolhimento vazio? A do tempo do Êxodo? O apostolo Paulo tem uma frase muito linda sobre este momento.

O orgulho de vocês não é bom. Vocês não sabem que um pouco de fermento faz toda a massa ficar fermentada?
Livrem-se do fermento velho, para que sejam massa nova e sem fermento, como realmente são. Pois Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi sacrificado.
Por isso, celebremos a festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da perversidade, mas com os pães sem fermento da sinceridade e da verdade.
1 Coríntios 5:6-8

Então não se trata de celebrarmos a festa judaica ou a europeia. Se trata de celebrarmos a morte e ressurreição do amado. Mas não uma celebração como evento isolado da vida. Está mais para uma celebração por causa da nova vida que nele temos.

Khristós Voskrés! Cristo ressuscitou!

709d666d-1f48-4519-ab7f-dfce23803448Uma das experiências que mais saudades me deixou foi a de pastorear interinamente uma igreja de origem eslava. Durante dois anos e meio eu fui transportado para uma forma de fé mais singela, rica e profunda. Singela porque por conta da guerra que tinham deixado para trás esta comunidade tinha tido que se despir de certas coisas não essenciais à fé cristã. Rica porque por conta da necessidade imposta pela migração o que poderia ter sobejado de um certo orgulho nacional tinha sido esmagado vendo-se forçados a abrir-se para a realidade da experiência existencial humana em formas que de outra forma talvez levasse muito mais tempo. E profunda, porque nessas escolhas que tiveram que fazer, conseguiram manter sua identidade não apenas eslava mas como eslavos cristãos re-arraigados em terras brasileiras.Talvez apenas um outro migrante para entender porque isso é profundo.

De todas as práticas que eles tinham a da saudação durante o domingo de ressurreição é a que mais lembro. Nesse dia eles se comprimentam dizendo “Cristo ressucitou!” ao que o interlocutor responde “Em verdade ressuscitou!”. Essa mesma forma poderia ser usada no primeiro culto matutino, ou no almoço do domingo de ressurreição. Lamentavelmente durante minha estância lá eu não soube apreciar a riqueza cultural disso e cometí o mesmo erro dos missionários que se internam nas tribos indígenas e tentam lhe mudar a cultura.

Como na sua cultura local a ressurreição de Jesus o Cristo é lembrada? Qual o impacto disso na sua vida pessoal? Como os da sua casa sabem que esse é o evento mais importante desde a criação do mundo?

Nos tempos que correm está cada vez mais de moda abandonar a congregação, abandonar a forma evangélica recebida, abandonar ritos e por ai vai. Argumentos são utilizados para justificar isso. O mais comum é o de dizer que somos livres para não nos congregar. Ou seja, como se congregar-se fosse um peso, uma carga, uma obrigação. É instigante no meu calo cerebral a pergunta de porque essa mesma liberdade não pode ser usada para o obvio: congregar-se para identificar-se. A única resposta que me aparece é de que se trata nada mais do que um subproduto da anarquia individualista que tem tomado conta da sociedade e – por consequência – dos mais pós-modernos “líderes” que nada mais são do que núvens sem água levadas para lá e para cá sem conteúdo; árvores desarraigadas impedidas de dar frutos dignos do reino.

“Khristós Voskrés!” (Cristo ressucitou) resume um legado eslavo para uma igreja que se adaptou no tempo mas não perdeu a essencia da mensagem. O primeiro dia da semana (que vale a pena lembrar não é a segunda-feira como o mundo rendido ao dinheiro nos quer fazer pensar) é de um especial significado para a igreja. Não que os outros dias não tenham, mas nivelar por baixo não faz mais do que mesmerizar a coisa simplificando – no melhor estilo Hitleriano – em lugar de aprofundar. Tanto se contarmos os dias da semana da criação literalmente ou – como muitos de nós – alegoricamente, vemos que o evento criativo de Deus se inicia num domingo (se este domingo demorou 24h ou se foram longos milénios, tanto faz). A ressurreição de Jesus o Cristo se dá também num domingo. Há um novo começo, uma nova realidade se abrindo para a humanidade.

Talvez não sejamos plenamente cientes de quão profunda é esta verdade nem quão necessário e urgente é o resgate da sua essência cristã. Eu acho que Romanos 5:18 resume bem ao dizer “…por um único ato de justiça…”. Essa tríade de morte-estadia no túmulo-ressurreição é “um único ato de justiça”. Geralmente temos a tendência de comparar este “único ato” com o ato de Adão citado no mesmo versículo. Mas o lance é bem maior pois ele vem argumentando que apenas Deus é justo e que o homem é injusto em sua essência desde o inicio da epistola.

Sente raiva de essa ideia? Acha que ser cristão é tolo? Pensa que deveriamos suavizar isso? A resurreição de Cristo está para você em um nível menos importante do que o Natal, a virada do ano ou seu aniversário? Pensa no mais profundo do seu ser que o homem pode chegar a ser justo se se esforça e ninguem atrapalha? Talvez – e só talvez – ainda não tenha entendido o básico da fé cristã.

Eu estou entre aqueles que acha que a fé cristã está desvirtuada ali mesmo onde deveria ser exaltada. A igreja tem se extraviado nestes ultimos anos com uma celeridade espantosa. A seriedade teológica tem dado lugar à insegurança da crença e à falta de identidade local e isso não porque estejamos indo para uma unificação benéfica da fé cristã, mas porque estamos abandonando a mesma fé que dizemos professar. A geração que está vindo ai, sente na alma que não vale mais nada ter algum tipo de identidade seja esta cultural, filosófica, racial, etc. Isso também se aplica para a fé cristã. Não que seja uma exclusividade da nossa era. Isso já aconteceu durante o oscurantismo e acontece hoje de forma inversa mas igualmente devastadora.

Quem é você? Se é cristão, é cristão mesmo? Ou seja, acredita de fato que Jesus ressurgiu? Se não, não seria o momento de re-avaliar sua vida?

 

http://www.monergismo.com/textos/credos/credoniceno.htm

Cristo, nosso cordeiro pascoal foi crucificado

Pensar na pascoa é, para muitas pessoas, sinónimo de festa, ovos de chocolates, reencontro com a familia. Eu acho que isso tudo tem seu valor e que deve ser feito, mas despe a páscoa do seu verdadeiro significado original. Uma segunda coisa é indagar se é possível para um cristão celebrar a páscoa.

A pascoa como tal nada mais é do que uma festa judia (e judaizante) na que se celebra o Pessach, ou seja, a passagem do anjo da morte na terra do egito pouco antes da liberação do povo judeu. No sentido de liberação, nada mais apropriado do que concordar com o apóstolo Paulo de que “Cristo nosso cordeiro pascoal já foi sacrificado” (1Co.5:7) já que -de fato- Jesus o Cristo é nosso grande libertador. Nada se compara a ele e e nele que o Pessach tem seu significado realizado por completo.

Porém, a sociedade tem gradativamente desvirtuado esta verdade simples. Para falar a verdade a sociedade não está nem ai para o significado da pascoa ou do natal. O problema é que a igreja institucionalizada (grande ou pequena) gosta de se prostituir atras da ideia de que tem que “atrair” as pessoas. Se Jesus fosse um produto, uma coisa a ser vendida, eu até concordaria. Nada mais apropriado e justo do que engabelar seu cliente falando coisas que ele quer ouvir, lhe dando aquilo que ele quer obter, para o seu produto ser mais vendido e com isso engrandecer os lucros de quem vende.

Das dias grandes datas cristãs – o natal e a pascoa- é com certeza a páscoa e não o natal a que celebramos em data mais certa. Porém, tanto uma como outra se presta parta conchavos politico-econômicos. O que atrai para o Cristo tem que ser o próprio Cristo. E – se possível – crucificado. Ao menos era isso o que ele pretendia ao relembrar da serpente erguida por Moises no deserto. Logo, se era isso que ele queria, para que eu me meter com isso?

No se trata de coelhos, se trata de um cordeiro. Não se trata de chocolate e sim de sangue. E não se trata de muita vida e sim de morte. Paulo escrevendo aos corintios faz a mesma menção na ceia (que lembremos: Jesus celebrou a sua última ceia justamente durante a pascoa) ao dizer: “Todas as vezes que beberdes deste calice… a morte do Senhor anunciais até que ele venha”. E ele mesmo quando no inicio da carta diz qual era sua mensagem fala: “anunciar a Cristo, e este crucificado”

Sim, claro que sei que a vitória na cruz é essencial à fé cristã; mas isso é no domingo.  Sexta e sábado celebramos – sim, celebramos – a morte de Jesus. Ao final das contas é por conta desta morte que você e eu não temos que pagar pelos nossos próprios pecados.

Então, para que sujar uma mensagem tão especial com ideias vindas do paganismo? Para que prostituir a mensagem? Para que desvirtuar o que é grandioso? Eu lhe direi: Para não sermos engolidos pela concorrência. Tudo tem se transformado numa luta imbecil por números. Não há mais vida. Apenas os números importam. Pastores jovens são massacrados e trucidados apenas por esta simples e diabólica ideia: Sua igreja precisa ser grande.

Paremos de brincar com fogo. Abandonemos de forma prática essa afronta. Passemos para a minoria, façamos eco da nossa eleição em Cristo. E paremos de ensinar aos nossos filhos e netos que está bem se prostituir nas ideias contanto “mais alguém seja alcançado”. Ninguém alcança ninguém, apenas o Espirito Santo convence de pecado, justiça e juízo. Sem isso, nada feito.