Arquivo da categoria: Poesias e outros devaneios

Já pensou!?

Já pensou que no relato do gênesis Deus faz a mulher em separado?
Já pensou que o herdeiro da promessa feito a Abraão tinha que sair de Sara e não de Hagar por mais que fosse legalmente correto?
Já pensou que – mesmo havendo Abraão tido um filho da escrava – Deus não a esqueceu e lhe deu uma promessa similar à que dera a Abraão?
Já pensou que para os judeus Abraão, Isaque e Jacó estão em pé de igualdade com Sara, Rebeca e Raquel?
Já pensou que as lágrimas de Ana regaram o mesmo local onde seu filho haveria de receber seu chamado?
Já pensou que Maria suportou a humilhação pública por causa do Salvador?
Já pensou que a ultima preocupação de Jesus na cruz foi com a sua mãe?
Já pensou que na ressurreição para quem Jesus apareceu primeiro foi para as mulheres?
Já pensou que numa sociedade em que o testemunho da mulher não valia grande coisa Deus deu a elas o privilégio de serem suas primeiras testemunhas?
Já pensou que a melhor ilustração da relação entre Jesus e a Igreja é o casamento e que o casamento nada mais é do que a junção da imagem plena de Deus (“à imagem de Deus o criou;
homem e mulher os criou.”)
Já pensou….?

Uma mala quase vazia

Há no folclore uruguaio uma chimarrita (pronuncia-se “tchimarrita” com ‘r’ gaucho e não o ‘h’ paulista) cujo título é “Pal que se va”. Isto é “Para aquele que vá embora”.

Dentre as coisas boas do folclore de qualquer país sempre pode ser resgatado o que o povo em geral sente em comum e os conselhos ali contidos, via de regra, falam ao coração diretamente sem muitos rodeios sendo – por isso – de fácil compreensão e aceitação.

Coloco aqui, então, uma tentativa de tradução desta chimarrita de Alfredo Zitarrosa tratando não de manter a métrica mas sim o sentido original numa tentativa de transmitir um detalhe que me parece básico:

EspañolPortuguês
No te olvides del pago
si te vas pa’ la ciudad
cuanti más lejos te vayas
más te tenés que acordar.

Cierto que hay muchas cosas
que se pueden olvidar
pero algunas son olvidos
y otras son cosas nomás.

No eches en la maleta
lo que no vayas a usar
son más largos los caminos
pa’l que va carga’o de más.

Ahura que sos mocito
y ya pitás como el que más
no cambiés nunca de trillo
aunque no tengas pa’ fumar.

Y si sentís tristeza
cuando mires para atrás
no te olvides que el camino
es pa’l que viene y pa’l que va.

No te olvides del pago
si te vas pa’ la ciudad
cuanti más lejos te vayas
más te tenés que acordar.
Cuanti más lejos te vayas
más te tenés que acordar.
Não esqueça a vila
se você for pra cidade
Quanto mais longe você for
Mais precisa se lembrar.

É verdade que há muitas coisas
que podem ser esquecidas
mas algumas são esquecimentos
e outros são apenas coisas.

Não coloque na mala
o que cê não vai usar
as estradas são mais longas
para quem vai carregado d’mais.

Agora, você é mocinho
e já pita que nem um maioral
Nunca mude sua trilha
nem mesmo tendo pra fumar.

E se sentir tristeza
quando olha para trás
não esqueça que o caminho
É para o quem vem e para quem vá.

Não esqueça da vila
se você for pra cidade
Quanto mais longe você for
mais você precisa se lembrar.
Quanto mais longe você for
mais precisa se lembrar.

Me interessa isso de “Não coloque na mala o que não vai usar, as estradas são mais longas para quem vai carregado demais” .

Vivemos num século de ansiedade. Na realidade, nem poderíamos dizer que “vivemos” mas sim que passamos por ele já que nosso constante pensamento são nas coisas que estão por vir, tanto as do futuro próximo quanto do longíquo.

O Brasil é recordista em ansiedade a nível mundial com 9,3% da população sofrendo deste mal chamado “transtorno de ansiedade”. Mas para além dessa cifra, que já de por sí é alarmante, em termos gerais não mais vivemos o presente. Repare, por exemplo, como no sul temos perdido o hábito do chimarrão, no sudeste o de visitar os amigos para um cafezinho e a rede e o cordel no norte e nordeste.

Não mais vivemos e sim passamos a tal ponto que se não o fizermos assim, nos gera culpa e malestar por não estar “na correria”. Nos habituamos, então, a colocarmos coisas na mala da alma como se fossem uma prevenção para sei lá que catástrofe e com esse peso todo tentamos correr como se fossemos atletas na casa dos 17 anos.

Em certo sentido, esta vida é um peregrinar. Tudo bem que aquele hino que diz “Eu tenho de Jesus saudades” soa meio maluco por conta que é de se supor que – estando Jesus presente na vida do cristão – não deveria sentir saudades dele. Todavia, me interessa pelo que expressa em termos gerais sobre estar longe da pátria. “Da linda pátria estou mui longe quando o hei de ver?”

Viemos de Deus e para ele retornamos. Ou você nasceu porque você quis? Ou você (exatamente você com suas falências, temores, alegrias, insatisfações, orgulhos e vergonhas) é fruto da decisão dos seus pais? Com certeza seus pais queriam “um bebê” mas não exatamente você. Goste ou não, você é fruto do plano de Deus em algum sentido.

Nesse peregrinar de Deus e para Deus, passamos a vida enchendo nossa mala da alma com ansiedades, tristezas, culpas e outros pesos desnecessários. Lembre que o caminho de ida é também o caminho de volta. Para que trilhar ele com peso extra? Qual a vantagem? Qual a vitória disso?

Filipenses 4:6
Não andeis ansiosos por motivo algum; pelo contrário, sejam todas as vossas solicitações declaradas na presença de Deus por meio de oração e súplicas com ações de graça.

1 Samuel 1:10-18
e, com a alma profundamente sofrida, chorou muito e orou ao SENHOR.…

Salmos 56:3,4
Todavia, quando o medo me atacar, confiarei em ti!…

Mateus 6:26,33
Contemplai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem armazenam em celeiros; contudo, vosso Pai celestial as sustenta. Não tendes vós muito mais valor do que as aves? …

Lucas 12:30-32
Porquanto o mundo pagão é que peleja por essas coisas; entretanto, o vosso Pai sabe perfeitamente que as necessitais. …

1 Pedro 5
6 Sendo assim, humilhai-vos sob a poderosa mão de Deus, para que Ele vos exalte no tempo certo, 7lançando sobre Ele toda a vossa ansiedade, porque Ele tem cuidado de vós! 8Sede sensatos e vigilantes. O Diabo, vosso inimigo, anda ao redor como leão, rugindo e procurando a quem devorar. …

Anseios…

2Recomeçar, reencontrar, fazer perdurar…para não esquecer.
Encontros, reencontros e desencontros; começar e recomeçar; não esquecer o que passou e o que não ficou pra trás; fazer novo/a todas as coisas e preencher espaços, buracos vazios, corações e mentes; lembrar sentindo dor e alegria, as nostalgias da via; firmar eternas alianças e presentes relacionamentos; evocar o Eterno ao circulo dos réus pensantes e vagantes num “interior” de muitas riquezas e pobrezas; evoca-lo sempre que respirar e entende-lo presente mais que ausente, dentro mais que fora; Unidos na diversidade e munidos de humildade e presteza, sendo sinceros todo tempo e aprendendo a humanização e a ser humano, identificados com o pó da vida terrena e com o pó celeste do céu…

 Rafael Campos

Lembranças de um tempo que fugiu…

3Sempre quando quero voltar a um lugar que me marcou e me deixou saudades e, que no coração, mente/razão “eu amei” (mesmo o lugar sendo o mesmo e não tendo sofrido tantas alterações de espaço e ambiente), o tempo em que eu lá vivi, partilhei e compartilhei não se encontram mais. Um misto de todos os sentimentos ali vividos vem à tona, mas o tempo passou e se ocupou de apenas guardar na memória o quanto foi feliz aqueles momentos.

Sabiamente o poeta Rubem Alves, em um de seus documentários, nos aconselha a não voltar a tais lugares. As imagens bastam para as recordações e, lembranças doem menos que a presença viva de cada tempo usufruído. Para mim estes espaços, que me fazem sofrer ao recordar, se tornaram “sagrados”. Falam de um “tempus fugit”, um tempo que voou e, irreversivelmente, não volta nunca mais. Encontrar “tempus” que não sejam “fugit” é o mesmo que dizer que devemos engaiolar a beleza da vida para nossa eterna contemplação; é o mesmo que congelar imagens, momentos e ali gastar a vida até evaporar-se; é o mesmo que dizer ao pôr-do-sol que se ponha a cada hora e perpetue sobre nossa cabeça a transcendência de seu ato; é o mesmo que satisfazer os prazeres da nossa vida num instante apenas.

Sou transportado constantemente a esses tempos da memória, das imagens, da saudade, dos amores, dos sabores e das amizades. Doe tanto não poder pegá-lo na mão e manuseá-lo como era e como foi. Mais triste é saber que esses lugares, sacralizados pelo tempo, não nos pertencem mais. Que o tempo se ocupou de, simplesmente, passar. Que o tempo, como é sua função, correu para frente e nem avisou que assim sempre será.

*Inspirado em Rubem Alves…