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Autonomia cristã: uma pequena reflexão.

1A grande dificuldade do cristianismo frente à pós-modernidade (penso eu), não é nem o legalismo (religião das regras de fé) e o moralismo absorto, tão praticado e exigido pela maioria das pseudo-comunidades de cunho evangélica.

A complicação está em que os cristãos não questionam/leem/ interpretam mais a nova aliança em Cristo Jesus; vivem mediante os “achismos” dos líderes das comunidades. Os “por quês“, que geram as dúvidas e a busca delas, não movimentam mais a mente pós-moderna e pulsam apenas nas academias.

Um fator incriminador é a pregação atual. Essa se tornou mais um espetáculo de emoções e experiências carnais do que um estudo e ensino sério do essencial. Aí, precisamos “engolir” que o Deus Espírito é quem nos leva a compreensão e, nós apenas somos “manuseados” à verdade. Jesus não ensinou para que seu público apenas ouvisse e fosse conduzido magicamente a Deus. O ensino pressupõe dúvidas, questionamentos, reformulações e, então, fé. Limitamos nossa compreensão da fé apenas ao abstrato e passamos a ser movidos pelos “sacerdotes” que, na compreensão atual, são os “gurus e pajés” da igreja de cristo. Cristo liberta para autonomia e dependência dEle e não para dependência das experiências alheias e autonomia dos outros. Se nossa cosmovisão não mudar através da verdade que liberta, nosso mundo particular continuará o mesmo, apenas acrescido dos mitos e ritos de uma religião sem fundamento que nos escravizará em regras e formas arrogantes.

Portanto, nos falta mais ensino e busca pessoal séria para que em nossa razão o Espírito nos conduza a uma transição do que, de fato, é importante crermos.

OBS. Minha crítica é contra a falta de autonomia e de mudança de um sistema religioso para a religião do Cristo; não se posiciona, particularmente, aos pastores que buscam a descentralização do sacerdote como o “ungido”, milagreiro, único meio de contato entre comunidade e Deus. Sou plenamente a favor de um pastorado que ensina suas ovelhas a “comerem e buscarem abrigo” por si só, sem intermediários feitos divinos. Sou a favor de um pastorado que ensina seus liderados a se submeterem uns aos outros em amor, sem super-heróis espirituais e hierarquia supérflua.

RCampos…

Verdades absolutas, verdade relativa e o Cristo

blogMe topei esses dias com um velho amigo. Comentando com ele sobre como a esposa dele estava linda, ele me respondeu dizendo que isso era “uma verdade absoluta“. Ao lhe dizer que isso era relativo ele me saiu com que a verdade, se verdade, é absoluta.
Ficou difícil argumentar já que a briga ia ser boa porque é obvio (para mim) que a minha mulher é muito mais  bonita que a dele.

Brincadeiras à parte, é sadio reconhecermos que cada um de nós acha que está na verdade. Nesse sentido, argumentar contra isso é tempo perdido pois (fazendo um paralelo com Descartes quando fala do bom senso) cada um de nós está plenamente convicto que está na verdade, ou que a verdade (mesmo a utópica na que se acredite) é mesmo A Verdade e não só uma parcela da mesma ou uma verdade relativa ou pior que se esta piamente enganado. São essas as que chamo de verdades absolutas (assim, em plural) pois cada quem está plenamente convicto da sua e define a participação do outro no seu grupo a partir da aceitação da mesma como sendo exatamente isso, uma verdade absoluta.

Sem cair no argumento esdruxulo e simplista de que toda verdade relativa é uma mentira preciso sim dizer que toda verdade é relativa e que a verdade é absoluta.(Aviso que se para aqui perde a melhor parte)

Você tem irmãos ou irmãs? Pense então no que cada um de vocês pensam sobre sua mãe. É mentira? Não, claro que não, é uma verdade com todo o peso que uma verdade tem mas é relativa, porque advêm – obviamente – de uma observação sintética e parcial. Logo, o que para mim é verdade, pode que para meu irmão não seja. Usualmente expressamos isso com “Eu já não penso tão assim”.  Toda essa frase reflete subjetividade e tensiona o desejo de que o ponto de vista do eu seja levado em conta tanto quanto eu levo em conta o ponto de vista dos outros.

A verdade, então, é mais uma utopia do que uma realidade do dia a dia no sentido em que sendo seres limitados não temos como lidar com o absoluto como parte integral da experiência diária (até porque diária é uma limitação de tempo perante o infinito da imanência da verdade). Dito em outras palavras, você não tem acesso à verdade absoluta para tomar qualquer tipo de decisão, quer para comprar um quilo de arroz, escolher o shampoo do cachorro, ou disciplinar um filho que diz que o outro fez isto ou aquilo. Você tem certas verdades parciais (ou relativas) expressadas na forma de preço, propaganda ou interpretação do acontecido respectivamente.  Além disso, você tem a vivência da sua mãe, o tipo de cachorro que você mesmo ou seu parceiro já tiveram e a tendencia sempre presente na hora de julgar um caso entre filhos.  Logo, se a verdade absoluta não lhe é acessível em coisas tão simples, cotidianas e terrenas, o que pode ser dito das coisas eternas?

O Messias (ou o Cristo se preferir o título em grego) propõe uma coisa que fala muito do que ele achava dele mesmo e que define também quem o segue.  Ele disse “Eu sou o caminho, a verdade e a vida“. Este judeu criado por um padrasto carpinteiro e filho de uma judia mal falada (pois deve-se lembrar que tinha aparecido grávida antes do casamento) e que havia vivido sua vida nas empoeiradas ruas e estradas da palestina no limite da expectativa de vida da época e aproximando-se ao fim da sua existência terrena por um ou outro meio, se manda uma dessas: “Eu sou a verdade“.  De duas uma: Ou o moço estava completamente louco pois o calor do deserto e uma verminose cronica tinham fritado o cérebro dele ou realmente era Deus e por tanto, A Verdade.

Uma coisa é dizer que você é cristão já que anos de sedimentação da ideia faz soar quase que um insulto a um ocidental lhe dizer que não é cristão.  Então é um termo que se tornou muito vago para se referir a alguém que sabe alguma coisa sobre a vida de Jesus Cristo e boa…

As coisas começam a esquentar um pouco mais se você se define como evangélico, mas isso é só por contraposição ao fato de ser católico romano.  Mas novamente, é um termo que tem se degenerado ultimamente e – esvaziado do seu correto significado – associa o interlocutor àqueles pregadores televisivos alienados de toda realidade espiritual que encontram nos evangelhos (sim, em plural) uma forma de autoajuda que misturada com uma parcial interpretação do antigo testamento sedimentam o caminho para se transformarem nessa chusma de pseudos neo pajés caricaturas de sacerdotes pré-cristãos.

Todavia, a coisa complica mesmo em qualquer lugar do mundo, quando você se identifica com o carpinteiro que se auto proclamou como a verdade. Isso porque todo mundo sente a exclusão que fica manifesta ao se dizer a e não uma possível verdade. Em outras palavras, não interessa se se é muçulmano, católico romano, católico ortodoxo, evangélico tradicional (e os tradicionalistas também), evangélico renovado, reformado, anabaptista, budista, sintoísta ou ateu. Nem sequer interessa se você conhece a Bíblia de capa a capa ou se sabe o alcorão em árabe por tradição oral e na integra. Nem muito menos se você acredita no nascimento virginal de Jesus, no seu ministério, na sua morte expiatória, na sua ressurreição e na sua ascensão ao céu. Se Jesus (o Cristo) não é a Verdade nada feito.

É impossível então dizermos que temos a verdade como coisa absoluta. Podemos – como muito – dizer que estamos aprendendo a verdade com aquele que declarou ser a verdade. Tenho comigo que esse é um processo que não acaba nunca e com esse nunca me refiro à eternidade também, isso porque estar na presença de Deus não nos torna deuses, logo, sendo a verdade absoluta um atributo divino, não chegaremos nunca ao conhecimento absoluto dela por mais que chegaremos bem perto.

Sintetizando mas não simplificando:

  1. Identifique-se com o ponto mais complicado de Jesus – ele é a verdade.
  2. Reconheça que é – e sempre será – um ser humano.
  3. Admita que sua verdade – por melhor, mais pura, mais honesta, mais desinteressada e mais justa que seja – é foi e sempre vai ser uma verdade relativa doutra forma haveria mais de uma verdade absoluta e não há como haver duas verdades absolutas.

Verdades Absolutas, verdade relativa e o Cristo by Dortta on Mixcloud

REFORMA PROTESTANTE – 497 ANOS

2Lendo alguns biógrafos que relatam o período da Reforma, começamos dizendo que somos “frutos” (espiritual/intelectual) daquilo que denominamos REFORMA PROTESTANTE. Abraçamos suas ideias (não todas) e as entendemos que essas se deram como um marco na história da igreja. Marco tal que desembocou em inúmeras micro reformas até os dias de hoje.

A Reforma Protestante deve seu legado histórico à iniciativa de Martin Lutero e suas noventa e cinco teses estacadas na porta de sua capela no dia 31 de outubro de 1517 – início de um protesto contra as indulgências que prometiam ao povo uma garantia de pecados perdoados antes mesmo que fossem cometidos. Praticamente um comércio salvífico não escriturístico; um meio ilegal para arrecadação de dinheiro usando um discurso de ameaças infernais e cravando sobre o povo um regime de obras, tudo pelas mãos de ferro da igreja imperante.

Mas Lutero ousou ser um mensageiro de Cristo. Sua vida como um todo e seus estudos o levaram profundamente a querer entender o Novo Testamento. É a partir de sua trajetória que hoje temos consciência dos pilares da reforma: Sola Scriptura; Solus Christus; Sola Gratia; Sola Fide; Soli Deo Gloria. Essas numa tentativa de retornar a Bíblia como fonte da revelação divina e prática dos homens.

Não quero aqui biografar acontecimentos passados, quero apenas elencar rapidamente o que esses pilares deveriam ser para nós cristãos pós-modernos, nós que sobrevivemos às mudanças, perspectivas e paradigmas do séc. XX e nos erguemos por meio do engajado evangelicalismo da década de 70. Minha pergunta é: Como devemos, em nosso atual contexto, refletir esses pontos enaltecidos pela Reforma? Respondo desde já que nossa resposta deve ser bíblica. Quero aqui elencar apenas três desses pilares.

Sola Scriptura – Quem já leu sobre o movimento iluminista e pós-iluminista sabe que um grande embate se formou em torno dos dogmas (autoridade) e doutrinas da igreja romana e reformada. Sabe-se que a busca das tradições humanas sobrepujou as Escrituras enquanto palavra de Deus escrita aos homens.

Quase dois séculos antes, Lutero se levantou arguindo contra a igreja católica romana no princípio contrário, ou seja, em outras palavras, Lutero queria uma verificação nas Escrituras daquilo que a Igreja estava realizando e prometendo. Ele exigiu uma volta as Escrituras Sagradas. Enquanto o séc. XX, fonte de todo desaguar dos séculos anteriores, exigiu o descrédito da Bíblia em prol das ciências naturais, o período da Reforma elevou-a ao topo de todo conhecimento e razão para o ser humano.

Portanto, quando falamos de Sola Scriptura, falamos da volta ao texto e seu contexto macro, o que pressupõe a fuga de todas as abstrações do texto real. Nada nela, nenhuma sílaba deve ser alterada para especulações e por tradições dos homens (aqui admito que todos nós vamos ao texto debaixo de tradições e pré-conceitos; o importante é sempre voltarmos ao texto antes de validarmos nossa razão e abstração) . Tudo nela deve ser levado em consideração; todos os etas (e, gr.), ou seja, cada partícula conectiva entre um versículo e outro, cada argumento e contra argumento, cada til de toda Escritura deve ser levado a sério. O apelo ao todo das Escrituras, tudo o que a compõe e seu contexto, devem ter primazia quando houver tradução e interpretação.

Sola Scriptura nos leva, consequentemente, ao Solus Christus.

Solus Christus – O evangelho, enquanto mensagem de boas notícias, vem nos revelar que somente Jesus é o Senhor universal. Essa é a verdadeira intenção desse slogan. A Reforma trouxe sobre esse ponto a denuncia aos mediadores que estavam sendo postos, potencialmente, no nível de Jesus Cristo. Um exemplo: Os santos ou os ossos dos santos eram venerados e, também, um meio de obter indulgências. Para esse contexto mercadejante, Lutero combateu acertadamente utilizando princípios do corpus paulino. Isso não quer dizer (meu ponto de vista) que tenha interpretado corretamente os textos paulinos que utilizou.

Mas, Solus Christus tem a nos dizer que o Jesus de Nazaré se tornou o Messias de Deus e proporcionou a Ele toda glória que a raça humana não lhe deu por direito. Isso quer dizer que esse slogan fala mais sobre uma verdade a respeito do Messias de Deus do que uma verdade sobre você e eu e nossa salvação. Fala, num contexto político, sobre um Rei que é universalmente superior a qualquer rei ou césares posto no trono e, indo além, Ele, Jesus Cristo, detém toda autoridade e poder em relação às autoridades humanas. Para finalizar essa reivindicação, devemos lembrar que ela foi utilizada no primeiro século como o evangelho que era superior ao do imperador romano da época. Isso tem haver com Jesus Kyrios, o Senhor do mundo, maior que todo reino ou império e que está acima de todos.

Outro aspecto do Solus Christus é o ponto em que Deus condenou, na carne de Jesus, todo pecado da humanidade que ofusca sua glória na criação, iniciando por meio de Sua ressurreição uma nova criação pautada no Christus Victor (Cristo vitorioso) – mais utilizado por Paulo do que o Cristo da expiação. Assim, nossa esperança vem da vitória de Jesus Cristo sobre o pecado e a morte.

Solus Christus nos leva, prioritariamente, ao Soli Deo Gloria.

Soli Deo Gloria – A verdade dessa afirmação é que somente ao Deus YHWH seja toda glória pelos séculos dos séculos, amém. Nada mais pode produzir glória ao Deus de toda criação do que uma humanidade refletindo Sua imagem e semelhança. Por meio de Jesus Cristo (Solus Christus), a humanidade agora pode ser redimida e será no fim das contas. Podemos, com toda certeza, afirmar que Deus é glorificado quando, por meio de Cristo, seu povo lhe rende glória dentre as nações.

A graça e o poder da mensagem do evangelho (Sola Gratia), aliada a fé (Sola Fide) mediante o Espírito Santo (alguns teólogos modernos trabalham o Sola Gratia em conjunto com Solo Spiritu, realidade na literatura paulina), produz uma nova humanidade, àquela desejada desde o gêneses; uma nova humanidade colocada sob um novo pacto/aliança, onde o pecado e o cosmos estão debaixo, uma vez por todas, da autoridade de Deus e seu Cristo. Uma vez que as alianças judaicas culminaram no novo pacto, na pessoa de Jesus, Deus é glorificado por Sua justiça que completa o plano de salvação lidando com o mal no mundo e elevando a humanidade caída a uma criação exaltada.

Desse modo, nessa breve exposição que fizemos acima, retomamos o Sola Scriptura para confessarmos que somente ela pode nos avivar, após a conversão por meio da pregação do evangelho, numa caminhada onde abraçamos as histórias e experiências de fé daquele tempo, povo, e convergimos ao nosso tempo – como fez Lutero – num processo de adaptação e direcionamento das verdades reveladas.

Reavemos o Solus Christus – contido em toda a Escritura – para trazer à memória aquilo que nos traz esperança. Que a história de Jesus de Nazaré, aquele que foi crucificado e ressuscitado dentre os mortos pelo mesmo Deus de Israel que o vindicou como Messias; o Senhor de todas as coisas o qual todo joelho se dobrará e toda língua confessará (judeus e gentios) que Ele é Senhor, que essa história seja para nós conversão (experiência de fé) e vocação (encarnação das obras/sofrimento de Cristo).

Isso porque, produzirá glória a Deus Pai – Soli Deo Gloria – como o grito de desespero de toda a criação que aguarda ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus; assim, seremos nesta geração os personagens dessa maravilhosa trama onde Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo já venceram e trouxeram esse vitória para o centro da nossa história.

Princípio da conversão que deve perdurar por toda vida (Áudio)

Domingo à noite, Everson nos deliciou (por usar seu linguajar) com mais uma pérola Joanina. (Evangelho de João, 1:1-18)

O centro da ideia é o seguinte: Sendo Deus realmente grande, a simples presença (real) dele evaporaria instantaneamente a nossa lista de pedidos com a qual tão insistentemente simplificamos o Criador a um mero fazedor de desejos humanos.

Fiquei pensando em como sou mesquinho e curto de vista. Analisei como o Pai Nosso começa justo como João 1:1, colocando Deus nos céus, inatingível e o reino chegando à terra em Cristo e através da Igreja. E finalmente como a maior parte do tempo, oramos com nós mesmos.

Bom, mas isso é farinha de outro saco.

Ouça por você mesmo.