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O Poder de uma Igreja fraca (II): Igreja como a âncora do céu

3A metáfora da “âncora” é uma bela forma para pensarmos como a igreja está ligada ao céu de Deus. Basicamente, uma âncora serve para “estacionar”, fixar o navio em um ponto específico no trajeto em que este está fazendo. Vista de modo simbólico, a âncora pode representar inúmeros significados: firmeza, tranquilidade, força, fidelidade e esperança; para alguns representa atraso ou barreira.

Certa feita ouvi uma história que não sei se é verídica. Os cristãos do primeiro e segundo século utilizavam o símbolo da âncora para se comunicarem em meio à perseguição advinda do império romano. Aquilo que se tornou a “cruz da escora” era simbolizada por um semicírculo (vida ou mundo espiritual) e pela cruz (realidade ou vida terrena). O semicírculo era visto como a coroa da cruz, a glória divina sob a glória terrena. Era, para aqueles primeiros cristãos, símbolo de esperança.

Para os navegadores, a âncora fala de refúgio, esperança em meio à tempestade e simboliza um conflito entre o sólido (a terra) e o líquido (a água). Simbolicamente, conflitam para que possa existir, em sua fecundação, a tão sonhada harmonia.

Mas o que isso tem a ver com a igreja, com a gente?

A igreja, nós representamos na terra aquilo que bem foi dito acima: a igreja é a glória de Deus em Cristo na terra; é também a fecundação do espiritual com o terreno, do céu com a terra, da verdadeira vida com a morte, da esperança com a desesperança. Dito de outra maneira, ela é a infraestrutura invisível de Deus manifestada na superestrutura visível da terra, ou seja, em nós. Ainda de outra forma, a igreja é a expressão imiscuída do céu (representada pelo Reino de Deus) com a terra (propagação do evangelho depositada em vasos de barro e dos sinais do Reino).

Utilizando essa metáfora – a igreja como a âncora do céu – podemos refletir sobre a importância e a missão de uma igreja fraca que se faz forte no poder da cruz. Para isso, minha primeira afirmação é que a cruz por si só não manifesta nenhum poder, apenas revela a morte. A cruz de Cristo, vista apenas de um ângulo, revela a morte de um homem que dizia ser Deus encarnado; sozinha, a cruz é o “fim da linha” para o proclamador das boas-novas de libertação e salvação.

Existe muito mais nas palavras biográficas dos evangelistas que simplesmente a morte de um judeu propagador de uma suposta nova teologia judaica. Existe muito mais que apenas o sentimento de dor pelo fim da vida; mais que somente o sentimento de desesperança – essa que arrebatou os corações frágeis e ansiosos pela libertação dos opressores, quando viram o suposto messias sucumbir pelas mãos romanas. Tem que existir mais, pois existiu para aqueles cristãos em perseguição e precisa existir para nós, cristãos pós-modernos.

Aqui entra minha segunda afirmação: através da cruz – o símbolo de morte e maldição, símbolo de desesperança e perca da vida e de propósito de vida – rompe-se a maior prerrogativa de esperança: a ressurreição dentre os mortos; o ressurgir do mundo dos mortos, do esquecimento – “sheol/hades”.

Quando observamos aqueles que estavam ao redor da cruz chorando pela cruel morte de Jesus, o olhar é de espanto e de tristeza pelo fim de três anos de acumulo de uma esperança que não era terrena. Jesus, nessa terra, se mostrou como a manifestação e o cumprimento das alianças, promessas e dos mandamentos figurados dia após dia pela nação judaica. Jesus era a “máxima expressão” de YHWH vivo, entre os mortais e pisando nesse lamaçal de injustiça, de toda sorte de pobreza e maldição. Ele era a esperança dos homens, a luz brilhando em meio às trevas. Mediante as ações de milagres e poder, ele protestava contra o mal; através da proclamação do Reino de Deus, ele disponibilizava a oportunidade de arrependimento a todos quanto o quisessem. Aqueles ao seu redor, na cruz, no pior momento de suas vidas – pois estavam diante da morte física da esperança encarnada – não podiam lembrar-se de suas palavras quando disse: “Eu sou a ressurreição. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá. E quem vive e crê em mim jamais morrerá” (João 11, 25-26).

Os discípulos e algumas mulheres que estavam em frente ao mestre que sofria numa cruz, viam um homem abatido, perdendo as forças minuto após minuto e se rendendo a toda aquela crueldade advinda sobre ele. Acho que ninguém veria aquela dura pena como “meio divino” histórico de redenção. Não há esperança na morte! (Lembrando que uma parte dos judeus criam na ressurreição, mas aquela que aconteceria “no último dia”, no fim da história da humanidade). Portanto, o que torna a cruz “fantástica” (no sentido teológico), é que ela foi/é a porta para Deus resgatar a sua criação e toda a humanidade de seus pecados e da condenação eterna.

Voltando a segunda afirmação – sobre o ressurgir dos mortos – os judeus criam que a morte e o hades eram o fim da vida de louvor a Deus. Criam, a partir do aculturamento e imaginário greco-romano, na punição que havia neste lugar indefinido das almas quando não cumpriam a justiça em vida. Criam em muitas coisas, assim como nós hoje. No entanto, a cruz e a morte de Jesus revelaram aos discípulos e a toda a igreja nascente que a esperança que Jesus trouxe não estava em que Deus os levaria a uma vitória sobre o império de Roma e nem em uma aniquilação dos gentios e miseráveis. A esperança também não estava em tornar Israel num povo único e poderoso sobre a face da terra, um povo único regendo as nações pagãs e impondo sobre elas seu judaísmo. A esperança estava, certamente, na ressurreição de Jesus e sua vitória sobre o mal, sobre o pecado e sobre a morte.

A cruz, vista pelo ângulo divino, sugeria a ressurreição de Cristo como o primogênito da igreja (comunidade do cordeiro). A esperança, a partir dessa faceta, cumpre a expectativa reconciliadora entre Deus e toda sua criação; entre a humanidade e a nova humanidade; entre a nova humanidade criada e a antiga criação. A esperança satisfaz em justiça a justiça de Deus proporcionando a paz entre Deus e os homens de bem. Deus, em Jesus, agracia toda a criação e chama a nova criação (a igreja, pessoas reunidas em torno da santa Trindade; pessoas a quem Deus amou na cruz; pessoas que de inúmeras maneiras refletem o Cristo vivo, etc.;) a sua mesma missão: reconciliação, resgate, recriação a partir da cruz e ressurreição.

A igreja como âncora sugere uma comunidade em harmonia, fecundada e alimentada pelo “corpo e sangue” de Cristo (lembrando-me da “água e terra” na simbologia dos navegadores, acima). Uma comunidade que age e reage aqui na terra como Deus age e reage no céu. Uma comunidade que experimenta historicamente o futuro de esperança dado por Deus através da pessoa histórica de Jesus, o Cristo: uma comunidade de ressurreição aqui e agora!

Assim, nosso poder como igreja de Jesus nessa terra vai além de alimentarmos e sermos alimentados. Vai bem além de cumprirmos a justiça e a uma vida de santidade. Está além de vivermos “igrejados” ou “desigrejados” institucionalmente; vai além de sermos bons cristãos e de vivermos eticamente as moralidades sugeridas. Vai além!

Posso estar falando utopias, mas utilizar a palavra “esperança” em meio à pós-modernidade já é um erro para muitos. Mas dela me valho para desafiar aqueles que se consideram e vivem como comunidade onde Cristo habita, na força do seu pessoal Espírito regenerador, para a glória de Deus Pai, a viverem como Jesus e enxergarem como Jesus; a amarem como Jesus e suportarem como Jesus suportou; a pisarem no lamaçal como ele pisou e agiu em resgate de muitos; a experimentarem a esperança no amor que cura toda dor, no amor que foi capaz de entregar a vida para que o mundo soubesse que existe um Deus que ama o que criou. Boas-obras, santidade, justiça, ética e moral serão frutos de quem caminha e age no amor, pelo amor, com o amor do Cristo.

Eis a esperança trazida por Cristo na ressurreição, o poder de uma igreja fraca atuante como âncora do céu na terra na esperança da ressurreição.

O Evangelho do Reino

Amados, achei por bem escrever-vos, não com o intuito de combater algum ponto de vista ou mesmo me opor a alguma ideia, porém com a proposta de esclarecer meu ponto de vista e assim tentar contribuir para um diálogo consistente.

O caminho que algumas teologias têm trilhado na impulsão da cosmovisão iluminista resultou, não de forma casual, na construção de uma cristologia um tanto desfocada, ao que me parece, de uma consciência bíblica mais centrada. No afã de defender a pessoa e obra de Jesus diante dos ataques ateístas, sem, contudo, abrir mão do ferramental racionalista, criou-se uma imagem de um Cristo comparável aos grandes líderes mundiais. Com isso procurava-se exaltar a pessoa do Filho de Deus, mostrando-o como um líder exemplar e perfeito, e assim equiparando o cristianismo às “melhores” e “mais nobres religiões” do Planeta.

Jesus assume um lugar ao lado dos grandes mestres que a história já registrou. Sua missão, com isso torna-se, segundo os valores éticos mais importantes para a humanidade, absolutamente relevante. Os problemas sociais, que se espalham e descem amargos pela garganta, principalmente dos menos favorecidos, faz com que se levantem clamores dos mais justificados por justiça social, ética e dignidade pública.

Neste meio em que se proliferam as injustiças, qualquer líder que queira ser bem visto e ter relevância cultural deve, sem sombra de dúvidas, ser projetado como uma voz que ressoa contra as paredes da indiferença e do massacre social. Com um olhar nesta demanda ética e humanitária, num ambiente de escassez de escrúpulos, surge cada vez mais a importância de estabelecimento de ícones da sociedade que respondam às barbáries e mazelas da “polis”.

Qualquer líder que seja respeitado ou tenha impacto relevante no meio em que vive, precisa, segundo a própria norma social, trilhar o caminho da ética e da ação humanitária e, portanto, se interpor ao mecanismo maquiavélico em que a sociedade está mergulhada.

Por isso, líderes como Mahatma Gandhi, Madre Teresa de Calcutá, Martin Luther King entre outros são levantados como ícones e exemplos quase perfeitos daquilo que faz a diferença no mundo dos viventes. Seguir o exemplo deles ou ser colocado no páreo com eles é o que se exige como qualidades mínimas para quem seja candidato ao respeito e admiração mundial.

A partir desta cosmovisão, imbuída desta chama, a proposta de um Jesus humanitário, um líder que vem para transformar o meio social, reverter os processos políticos dementes e estabelecer um reino justo sobre a terra, é absolutamente tentadora. Fazer de Jesus um grande líder que constrói uma sociedade justa é mais do que tentador, pois o coloca na mesma via dos grandes ícones sociais e faz de muitos deles seus seguidores. Isso é quase tão perfeito que os próprios discípulos de Jesus adotaram prontamente esta visão. Clamores como “quando restaurarás o Reino a Israel?”, “no teu reino queremos estar em tua direita e esquerda”, mostram claramente que eles assim entenderam Jesus e esperaram que ele fizesse.

Não era pra menos, pois se hoje falamos em opressão social, qual não seria a mesma na época em que os romanos, desumanamente, exploravam e “sugavam até a última gota de sangue” de seus escravos – dentre eles, o povo de Israel?

Qual não seria a expectativa e a sede dos discípulos por justiça social, pelo estabelecimento de um reino justo, de uma política humanitária, de direitos iguais e de punição aos corruptos e corruptores? Nesta ânsia por harmonia social, qualquer líder que se prestasse teria que advogar as causas sociais. Tempos semelhantes aos nossos, guardadas as devidas proporções!

Nessa chave hermenêutica, os discípulos criaram uma imagem política de Jesus que ele jamais teve. Esperaram ansiosamente pela justiça e por um reino terreno justo que jamais veio. Quando começaram a perceber que Jesus iria morrer, não se conformaram. O final da vida terrena de Jesus mostra as desilusões dos discípulos e o sentimento de fracasso. Mal sabiam eles que ainda sofreriam por tantos anos nas mãos dos romanos, e que suas expectativas de justiça social jamais seriam satisfeitas.

Talvez, o que os discípulos não entendiam é que o problema humano nunca foi social. O problema humano é existencial. O social é apenas uma consequência do existencial.

Talvez seja aí que esteja a grande dificuldade com as teologias que apresentam um Cristo ao lado dos grandes ícones sociais. Propõem um evangelho das causas sociais, que busca igualdade, que cuida do pobre, que alcança o necessitado, que alimenta o faminto. Com isso fazem da proposta de Jesus a mesma que a dos grandes líderes sociais.

Assim não percebem que o ideal de Cristo jamais trilhou estes caminhos. É claro que existem inúmeros textos bíblicos que chamam o ser humano para uma justiça social. Mas esse não é, e nunca foi o foco. A advertência por uma ajuda humanitária é uma espetada no coração do homem pecador para mostrar-lhe seu principal problema – a impossibilidade de amar realmente o ser humano.

Quando Jesus diz ao jovem rico para vender tudo que tinha e dar aos pobres, parece-me mais uma tentativa de mostrar-lhe onde estava seu tesouro. Aliás Jesus nunca propôs uma revolução contra Roma, nunca instigou uma ação política diferente no senado e nunca deu esperanças aos discípulos de que se eles o seguissem, o mundo poderia ser melhor.

A proposta de Jesus não era social. A proposta de Jesus era existencial. O homem está longe de Deus. Isto significa – o homem está no inferno (existencial) e precisa de se aproximar de Deus, voltar a ter vida. Como resultado disso, ele se tornará alguém melhor para sua sociedade em todos os aspectos em que esteja interagindo com ela.

A diferença entre Jesus e os grandes líderes sociais é fundamental e crucial. Os ícones da sociedade propuseram sempre uma mudança social, Jesus propôs uma mudança existencial. Os líderes tentaram consertar a sociedade, Jesus se interpôs como o transformador pessoal. “É necessário nascer de movo” disse ele a um bom cidadão.

O alvo do evangelho não é transformar as propostas políticas, mas sim as pessoas, ainda que isso leve à transformação de políticas a partir de pessoas transformadas. Quando se prega um evangelho social, perde-se a essência do Evangelho. Pode-se ter uma igualdade social sem pessoas transformadas, mas não se pode ter pessoas transformadas que sejam indiferentes ao mundo social. Porém, começar pelo discurso social é começar pela prática moral e não pela transformação pessoal interior.

Podemos ser seres transformados e vivermos plenamente e totalmente num mundo absolutamente injusto e numa sociedade totalmente deturpada com uma política corrupta, e ainda assim o reino estará em nós. A mensagem de Jesus não falhou, ainda que nunca na história tenhamos presenciado uma igualdade e justiça social, pois o Evangelho de Jesus não teve essa meta. Se ele tivesse essa meta, hoje diríamos que falhou, pois nunca isso aconteceu.

Então quando tiramos o foco do Evangelho, que é libertação existencial das vidas, e o colocamos numa justiça social, invertemos o processo e deixamos o importante pelo secundário.

Jesus nunca foi um líder como o esperado pelo mundo social, pois sua busca era outra. Por isso talvez ele não foi amado como Madre Teresa de Calcutá, Mahatma Gandhi ou Matin Luther King. Embora alguns tenham morrido por seus ideais, Jesus não morreu por seus ideais. Jesus morreu para substituir o pecador na cruz, e assim dar-lhe vida (que não significa necessariamente justiça social, aliás muitos dos que tiveram a vida de Jesus jamais experimentaram a justiça social sobre si mesmos).

Que Evangelho acredito?

  1. Um Evangelho que muda o ser humano existencial e radicalmente. Como? Tirando-o das trevas e colocando-o na luz. Tirando-o do pecado e colocando-o no perdão. Mudando sua cosmovisão. Isso levará o ser humano a seu justo socialmente, entre outras coisas, mas o contrário não é verdadeiro.

  2. Um Evangelho que me mostre minha miséria existencial e meu afastamento de Deus e me dê esperanças de estar com Ele, apesar de quem sou.

  3. Um Evangelho que me capacite a viver abundantemente, mesmo que o meio social não seja aquilo que deveria ser.

  4. Um Evangelho que me insere no Reino, que me torna um servo de Cristo rumo à cruz. Isso não significa que vou mudar a sociedade, ou que vou conseguir expulsar os romanos da minha política, ou que vou conseguir acabar com as favelas do mundo, pois o mesmo jaz no maligno. Embora eu deva viver a diferença com o meu próximo, o Evangelho do reino veio para transformar o meu ser.

  5. Um Evangelho que condena a miséria social e a injustiça, mas numa proposta de mostrar o pecado humano e a falência do sistema, não de criar seguidores que possam reverter o processo social, embora isso possa chegar a ser atingido.

  6. Um Evangelho que multiplica o pão, mas que não faz disso sua meta. “Vocês vêm a mim por causa do pão” e dizendo isso não multiplicou mais. Pareceria um contrassenso, já que ele poderia acabar com a fome do mundo e assim se tornar um grande ícone humanitário.

  7. Um Evangelho que fale ao pobre e ao rico, que atinja o pobre oprimido e o rico que não oprime.

  8. Um Evangelho a ser pregado não a partir das misérias sociais, mas sim a partir da miséria humana existencial.

Assim Jesus não era de esquerda nem de direita, não propôs sistemas políticos ou econômicos. Essas lutas de direita e esquerda são meras convenções políticas. Jesus falou do homem perdido, mostrou o quanto este estava perdido e morreu por ele para que fosse encontrado. A partir daí, na consciência da falência humana e no resgate da humanidade, abre-se as portas para a ação social, porém nunca como um alvo supremo a ser perseguido, mas uma consequência a ser vivenciada, pois o problema humano é muito acima do nível social.

Faz-se assim necessário alguns esclarecimentos pontuais.

  1. No que se constitui a libertação apregoada no Evangelho?

A libertação não se constitui em alívio do ponto de vista da opressão social. Os discípulos foram libertos por Jesus e continuaram a vida toda debaixo da opressão social. O Evangelho é muito mais do que isso. Se assim o fosse, nações em que a opressão social é minimizada (até mesmo debaixo de uma confissão ateísta) não precisariam do Evangelho.

A libertação proposta por Jesus não enfoca questões sociais, econômicas ou de qualquer outra natureza que não seja o resgate de um ser das trevas. A libertação social é um ideal de muitos líderes e instituições, que tiveram mais ou menos êxito no processo social, sem nem sequer se utilizar do Evangelho.

Jesus liberta o homem de seu pecado existencial que é o único que o separa de Deus. O homem não será condenado por suas injustiças sociais, pois se assim o fosse, aqueles que praticam a justiça sem o emblema da cruz, seriam absolvidos sem a presença de Jesus. O homem será condenado por seu Pecado, que o separa de Deus.

Enfocar a libertação do ponto de vista social é reduzir o evangelho a uma ideologia humanitária e nivelar Jesus aos ícones de projeção social.

  1. Quem é Jesus?

Parece muito claro que Jesus é incomparável. Ele supera infinitamente qualquer líder social ou agente humanitário de importância inquestionável.

Não precisamos de Jesus para realizar um trabalho social significativo – já temos Mahatma Gandhi, entre outros.

Não precisamos de Jesus para estabelecer uma sociedade mais justa e igualitária – grandes nações do primeiro mundo, como a Suécia ou Dinamarca estão anos-luz na constituição de suas sociedades, muitas vezes até sob a bandeira do ateísmo.

Não precisamos de Jesus para estender a mão ao faminto, à viúva e ao pobre – agências humanitárias e grandes líderes sociais já se mostraram eficazes nisso sem sequer estar debaixo da cruz.

Não precisamos de Jesus para mostrar a justiça e a ética que faz a diferença no meio social – muitos já agiram assim sem sequer serem cristãos. Corpos são queimados em favor dos pobres sem sequer o resquício do verdadeiro amor.

Não precisamos de Jesus para praticar o desprendimento material – Sidarta Gautama que o diga.

Jesus não é definitivamente um “repartidor de heranças”, ou um “provedor de pão” – essa era a expectativa dos judeus, mas ele não se mostrou seduzido por estas propostas. “O pão não foi Moisés que vos deu, o pão sou eu”, revelou Jesus. Quem busca no Evangelho o pão que mata a fome, não pode entender o que é comer a carne do Filho de Deus.

Não precisamos de Jesus para exemplos de qualquer natureza ética ou altruísta – grandes ícones da história se mostraram impecáveis neste aspecto sem nunca abraçarem a cruz.

Mas, definitivamente tem algo fundamental e essencial que só Jesus pode fazer, que é uma característica exclusiva dele. Só Jesus pode perdoar a humanidade em relação ao seu pecado existencial e assim ligá-la novamente a Deus. Isso nenhum líder ou ícone mundial poderia fazer, pois “todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus”.

Essa é a verdadeira mensagem do Evangelho. O homem estava separado de Deus em seu pecado e Jesus veio ligá-lo novamente ao Pai. Resgatou-o de sua condição de pecado e o regenerou, fazendo-o uma nova criação.

  1. Qual é a tarefa da Igreja?

A tarefa da Igreja não é prioritariamente social. Não somos uma instituição filantrópica de ajuda humanitária. Existem grandes organizações que assim se constituem e fazem um excelente trabalho social sem nunca se constituírem como igreja. Não precisamos da igreja para fazer a ação social. Ela já existia muito antes da igreja.

A igreja não se reúne para resolver os problemas sociais prioritariamente. Quando olhamos para a igreja primitiva, percebemos que os diáconos só foram instituídos depois que o problema se apresentou. A igreja não se reuniu para resolver seus problemas sociais, embora a ajuda entre os irmãos se tornou uma realidade. Mas não foi essa a mola propulsora que os levou a estar juntos. Eles estavam juntos porque se tornaram adoradores. Não somos chamados principalmente para atender projetos sociais, mas sim para sermos adoradores.

Então a igreja tem como tarefa principal adorar a Deus, conhecê-lo e anunciar a libertação do homem do seu Pecado por Jesus. As tarefas sociais, as denúncias ao desequilíbrio econômico, as buscas pela preservação ambiental, o respeito à criação divina, a defesa dos animais, as grandes descobertas científicas que ajudam a preservar o planeta e os homens, são também realizações dos salvos, mas podem muito bem existir sem eles, como a própria história comprova.

A carta aos Gálatas, no capítulo 5, mostra que a libertação tem muito mais a ver com a consciência da falência existencial da humanidade do que qualquer outra coisa. Neste aspecto as “obras da carne” condenadas têm muito mais a ver com as questões internas de uma realidade existencial corrompida.

Sendo assim, fica aqui minha denúncia contra o rebaixamento do Evangelho a uma proposta de ação social, reduzindo assim Jesus a um ícone de exemplo humanitário e no páreo com os grandes exemplos de revolução social do planeta. Ele é muito mais do que isso e seu evangelho vai muito além dessas causas.

Que Deus seja conosco.

Everson Spolaor

Sobre “JESUS – NATAL – RESSURREIÇÃO”: Algumas poucas palavras…

2Essas são algumas poucas palavras que me lembro dos estudos do seminário e, também, livros revisitados sobre o assunto. Sei que o momento é de ardor pelo nascimento de Jesus, mas sempre me apego, nessas datas festivas, ao significado de Sua vinda a este mundo, ao nosso espaço humano.

O Natal reflete, mesmo diante de todo contexto cabível ao Império romano ao impor essa data, uma realidade histórica de vida e esperança. O Natal – o nascimento de Jesus sem os adornos capitalistas de consumo – reposiciona a história humana a uma realidade apocalíptica que sempre foi viva na memória e no corpo narrativo dos profetas; portanto sempre viva nas expectativas de um povo oprimido e necessitado de libertação/justiça e de um libertador.

Fala, principalmente, da vinda desse libertador e da libertação que um pobre menino judeu, em Belém, trouxe através de seu tabernacular neste mundo. Fala do cumprimento das profecias e da nova vida que Ele viveu através de sua própria. Fala da renovação da realidade através do Reino que ele encarnou e, futuramente, da renovação de toda a realidade na vindicação e consumação de todas as coisas.

A partir de seu nascimento, sua vida exemplar e profética, morte e ressurreição, podemos falar da esperança que sua estadia aqui produziu nos corações que creram e creem desde lá.

Quem me conhece sabe que sou um crítico das “fraseologias” ou dos “jargões pops” da “evangelicada”. Dizeres como: “Jesus é a nossa páscoa”; “Jesus ressuscitou”; ou ainda “O tumulo está vazio”… Não sou contrário a nenhuma delas, no entanto não as acho, racionalmente, tão contundentes e vivas como são expressas. Nem acho que existam argumentos científicos que provem tal fato (creio ser um fato da história), o que concordo piamente com a historiadora judia Karen Armstrong ao dizer que “ao tentar transforma-se em ciência, a teologia só conseguiu produzir uma caricatura do discurso racional, porque essas verdades não se prestam à demonstração cientifica”.

Um cético ou um ateu neófito invalidaria tais “jargões” com argumentos muito mais racionais e expressivos/preciso que um “crente” platônico e sentimental que leva em sua boca apenas o “Ele ressuscitou”.

A própria psicologia social invalidaria a ressurreição sugerindo a teoria da “dissonância cognitiva”. Outros iriam sugerir que a ressurreição é apenas uma metáfora (não que não seja) de uma experiência religiosa que os cristãos primitivos outrora tiveram por causa da experiência da graça e do perdão, o que permite sugerir inúmeras negações sobre a morte e ressurreição de Jesus.

Ao recorrermos às narrativas evangélicas canônicas, todas as quatro narram sobre a morte e ressurreição de Jesus, o Messias. Independente da lente de cada autor/narrador, a narrativa se encontra presente na tradição cristã primitiva, sugerido por alguns teólogos e exegetas serem essas pré-paulinas (o que evoca o poder de sua memória e de sua oralidade). Mas a evidência que se torna explicita nos evangelhos, principalmente para os personagens da trama é que “Jesus ressuscitou”; e se ressuscitou “ele é o Messias”.

Foi uma fraseologia que se tornou jargão nos moldes que indiquei acima? Foi um jargão presente no contexto judaico? Não, nem um nem outro. Primeiro, porque os discípulos de Jesus nunca entenderam ou suspeitaram de sua ressurreição. Segundo, o contexto judaico não aceitava a premissa de que alguém havia morrido e ressuscitado. Prefiro “acreditar” (racional partindo da fé e não de fatos comprovados), que a ressurreição de Jesus alimentou em seus discípulos a antiga expectativa apocalíptica do Messias, elevando-os ao verdadeiro sentido de sua morte e ressurreição, ou seja, uma nova criação, a vitória de Deus sobre a morte (mal) que foi anulada na cruz e seu retorno à vida.

A essência do Natal tem a ver, num contexto macro, com essa libertação/justiça tão esperada e com a esperança ocasionada pela ressurreição desse menino/homem/Deus, ou seja, um dia o veremos face a face e, assim como Ele é, nós seremos.

 

Autonomia cristã: uma pequena reflexão.

1A grande dificuldade do cristianismo frente à pós-modernidade (penso eu), não é nem o legalismo (religião das regras de fé) e o moralismo absorto, tão praticado e exigido pela maioria das pseudo-comunidades de cunho evangélica.

A complicação está em que os cristãos não questionam/leem/ interpretam mais a nova aliança em Cristo Jesus; vivem mediante os “achismos” dos líderes das comunidades. Os “por quês“, que geram as dúvidas e a busca delas, não movimentam mais a mente pós-moderna e pulsam apenas nas academias.

Um fator incriminador é a pregação atual. Essa se tornou mais um espetáculo de emoções e experiências carnais do que um estudo e ensino sério do essencial. Aí, precisamos “engolir” que o Deus Espírito é quem nos leva a compreensão e, nós apenas somos “manuseados” à verdade. Jesus não ensinou para que seu público apenas ouvisse e fosse conduzido magicamente a Deus. O ensino pressupõe dúvidas, questionamentos, reformulações e, então, fé. Limitamos nossa compreensão da fé apenas ao abstrato e passamos a ser movidos pelos “sacerdotes” que, na compreensão atual, são os “gurus e pajés” da igreja de cristo. Cristo liberta para autonomia e dependência dEle e não para dependência das experiências alheias e autonomia dos outros. Se nossa cosmovisão não mudar através da verdade que liberta, nosso mundo particular continuará o mesmo, apenas acrescido dos mitos e ritos de uma religião sem fundamento que nos escravizará em regras e formas arrogantes.

Portanto, nos falta mais ensino e busca pessoal séria para que em nossa razão o Espírito nos conduza a uma transição do que, de fato, é importante crermos.

OBS. Minha crítica é contra a falta de autonomia e de mudança de um sistema religioso para a religião do Cristo; não se posiciona, particularmente, aos pastores que buscam a descentralização do sacerdote como o “ungido”, milagreiro, único meio de contato entre comunidade e Deus. Sou plenamente a favor de um pastorado que ensina suas ovelhas a “comerem e buscarem abrigo” por si só, sem intermediários feitos divinos. Sou a favor de um pastorado que ensina seus liderados a se submeterem uns aos outros em amor, sem super-heróis espirituais e hierarquia supérflua.

RCampos…

Verdades absolutas, verdade relativa e o Cristo

blogMe topei esses dias com um velho amigo. Comentando com ele sobre como a esposa dele estava linda, ele me respondeu dizendo que isso era “uma verdade absoluta“. Ao lhe dizer que isso era relativo ele me saiu com que a verdade, se verdade, é absoluta.
Ficou difícil argumentar já que a briga ia ser boa porque é obvio (para mim) que a minha mulher é muito mais  bonita que a dele.

Brincadeiras à parte, é sadio reconhecermos que cada um de nós acha que está na verdade. Nesse sentido, argumentar contra isso é tempo perdido pois (fazendo um paralelo com Descartes quando fala do bom senso) cada um de nós está plenamente convicto que está na verdade, ou que a verdade (mesmo a utópica na que se acredite) é mesmo A Verdade e não só uma parcela da mesma ou uma verdade relativa ou pior que se esta piamente enganado. São essas as que chamo de verdades absolutas (assim, em plural) pois cada quem está plenamente convicto da sua e define a participação do outro no seu grupo a partir da aceitação da mesma como sendo exatamente isso, uma verdade absoluta.

Sem cair no argumento esdruxulo e simplista de que toda verdade relativa é uma mentira preciso sim dizer que toda verdade é relativa e que a verdade é absoluta.(Aviso que se para aqui perde a melhor parte)

Você tem irmãos ou irmãs? Pense então no que cada um de vocês pensam sobre sua mãe. É mentira? Não, claro que não, é uma verdade com todo o peso que uma verdade tem mas é relativa, porque advêm – obviamente – de uma observação sintética e parcial. Logo, o que para mim é verdade, pode que para meu irmão não seja. Usualmente expressamos isso com “Eu já não penso tão assim”.  Toda essa frase reflete subjetividade e tensiona o desejo de que o ponto de vista do eu seja levado em conta tanto quanto eu levo em conta o ponto de vista dos outros.

A verdade, então, é mais uma utopia do que uma realidade do dia a dia no sentido em que sendo seres limitados não temos como lidar com o absoluto como parte integral da experiência diária (até porque diária é uma limitação de tempo perante o infinito da imanência da verdade). Dito em outras palavras, você não tem acesso à verdade absoluta para tomar qualquer tipo de decisão, quer para comprar um quilo de arroz, escolher o shampoo do cachorro, ou disciplinar um filho que diz que o outro fez isto ou aquilo. Você tem certas verdades parciais (ou relativas) expressadas na forma de preço, propaganda ou interpretação do acontecido respectivamente.  Além disso, você tem a vivência da sua mãe, o tipo de cachorro que você mesmo ou seu parceiro já tiveram e a tendencia sempre presente na hora de julgar um caso entre filhos.  Logo, se a verdade absoluta não lhe é acessível em coisas tão simples, cotidianas e terrenas, o que pode ser dito das coisas eternas?

O Messias (ou o Cristo se preferir o título em grego) propõe uma coisa que fala muito do que ele achava dele mesmo e que define também quem o segue.  Ele disse “Eu sou o caminho, a verdade e a vida“. Este judeu criado por um padrasto carpinteiro e filho de uma judia mal falada (pois deve-se lembrar que tinha aparecido grávida antes do casamento) e que havia vivido sua vida nas empoeiradas ruas e estradas da palestina no limite da expectativa de vida da época e aproximando-se ao fim da sua existência terrena por um ou outro meio, se manda uma dessas: “Eu sou a verdade“.  De duas uma: Ou o moço estava completamente louco pois o calor do deserto e uma verminose cronica tinham fritado o cérebro dele ou realmente era Deus e por tanto, A Verdade.

Uma coisa é dizer que você é cristão já que anos de sedimentação da ideia faz soar quase que um insulto a um ocidental lhe dizer que não é cristão.  Então é um termo que se tornou muito vago para se referir a alguém que sabe alguma coisa sobre a vida de Jesus Cristo e boa…

As coisas começam a esquentar um pouco mais se você se define como evangélico, mas isso é só por contraposição ao fato de ser católico romano.  Mas novamente, é um termo que tem se degenerado ultimamente e – esvaziado do seu correto significado – associa o interlocutor àqueles pregadores televisivos alienados de toda realidade espiritual que encontram nos evangelhos (sim, em plural) uma forma de autoajuda que misturada com uma parcial interpretação do antigo testamento sedimentam o caminho para se transformarem nessa chusma de pseudos neo pajés caricaturas de sacerdotes pré-cristãos.

Todavia, a coisa complica mesmo em qualquer lugar do mundo, quando você se identifica com o carpinteiro que se auto proclamou como a verdade. Isso porque todo mundo sente a exclusão que fica manifesta ao se dizer a e não uma possível verdade. Em outras palavras, não interessa se se é muçulmano, católico romano, católico ortodoxo, evangélico tradicional (e os tradicionalistas também), evangélico renovado, reformado, anabaptista, budista, sintoísta ou ateu. Nem sequer interessa se você conhece a Bíblia de capa a capa ou se sabe o alcorão em árabe por tradição oral e na integra. Nem muito menos se você acredita no nascimento virginal de Jesus, no seu ministério, na sua morte expiatória, na sua ressurreição e na sua ascensão ao céu. Se Jesus (o Cristo) não é a Verdade nada feito.

É impossível então dizermos que temos a verdade como coisa absoluta. Podemos – como muito – dizer que estamos aprendendo a verdade com aquele que declarou ser a verdade. Tenho comigo que esse é um processo que não acaba nunca e com esse nunca me refiro à eternidade também, isso porque estar na presença de Deus não nos torna deuses, logo, sendo a verdade absoluta um atributo divino, não chegaremos nunca ao conhecimento absoluto dela por mais que chegaremos bem perto.

Sintetizando mas não simplificando:

  1. Identifique-se com o ponto mais complicado de Jesus – ele é a verdade.
  2. Reconheça que é – e sempre será – um ser humano.
  3. Admita que sua verdade – por melhor, mais pura, mais honesta, mais desinteressada e mais justa que seja – é foi e sempre vai ser uma verdade relativa doutra forma haveria mais de uma verdade absoluta e não há como haver duas verdades absolutas.

Verdades Absolutas, verdade relativa e o Cristo by Dortta on Mixcloud

Novo credo cristão

(Aviso aos navegantes, isto aqui é uma ironia)

De tempos em tempos a igreja tem se deparado com a necessidade de sintetizar sua fé. Isto, é colocar de lado as diferenças e escolher o caminho comum; definir o que é ortodoxo e o que não é; descartar aquilo que desvincula para manifestar aquilo que une.

Assim temos o Credo Apostólico usado oficialmente pela primeira vez no ano 390 em Milão. Temos também o Credo Niceno definido no conclio da cidade de Niceia em 325. E finalmente podemos mencionar o Credo Atanasiano que se firma com Carlos Magno (742-814)para fins de instrução mas que não sabemos ao certo a origem.

Todos eles têm o mesmo propósito: Estabelecer o que é crença cristã e definir o que não é. Veja como por exemplo, podemos concordar facilmente com o Credo Apostólico a continuação:

Creio em Deus Pai, todo-poderoso, Criador do céu e da terra. E em Jesus Cristo. Seu único Filho nosso Senhor. O qual foi concebido pelo Espírito Santo, nasceu da virgem Maria, padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado; desceu ao inferno, no terceiro dia ressuscitou dos mortos, subiu ao céu e está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso, donde há de vir julgar os vivos e mortos. Creio no Espírito Santo, na Santa Igreja Católica – a comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna. Amém.

Claro, os desavisados de plantão podem arrepiar a espinha ao chegar na parte em que diz “na Santa Igreja Católica”, mas o termo católico nada mais significa que universal, ou seja, que atinge a todos os seres humanos e nada tem a ver com a instituição conhecida pelo mesmo nome.

Mas voltando ao assunto, um credo nada mais é do que um reflexo das crenças dos que creem. Uma formulação do abstrato em termos simples e pragmáticos que facilitem aos que o leem a compreensão da essencialidade da fê proposta.

Eu me proponho hoje fazer o processo contrário, ou seja, a partir da observação externa produzir um texto que ampare a cristandade como um todo em sua prática e não na sua utopia. O texto ficaria mais ou menos assim:

Creio nos estereótipos fortemente alicerçados na pregação do meu guru pessoal. E na minha teologia particular. Única filha legitima dos meus estereótipos. A qual foi concebida da miscigenação caseira de ouvir uma cacofonia ensurdecedora de pregadores televisivos que falam sobre uma prosperidade terrena que anseio desesperadamente; Ela padece sob outras teologias de cunho bíblico, é esmagada, mas nem a deixo morrer nem a sepulto; Vou ao inferno com ela se necessário for, subo ao meu próprio céu terreno do toma-lá-dá-cá e deixo que ela me conduza pela mão direita, ao final de contas me falaram que sou cabeça e não cauda e vou julgar todo mundo. Creio na esquizofrenia espiritual que me acompanha, na minha única e própria visão da igreja – a comunhão do “nós” em lugar de “com eles”, na culpa constante pelos pecados (se é que existe pecado), nos meus esforços pessoais para agradar o Criador e na poupança recheada antes de partir para a eternidade. Amém

ORAÇÃO: AMIZADE COM JESUS CRISTO

Penso que os questionamentos nos movem. Eles nos levam para além do que somos e de onde estamos. Isso porque questionar é ir além do refletir. É ter a coragem de adentrar terrenos desconhecidos e de encarar novos desafios. E diante destes que nos cercam, uma que nos confronta é a questão do renovar.

O renovar-se exige de nós a ousadia de buscar o novo no velho, fazendo-nos assim, sair das nossas zonas de conforto. Verdade é que poucos trilham este questionador e ousado caminho. James Houston foi um dos que corajosamente adentrou esse terreno na busca do novo em relação ao velho caminho da oração.

Escocês, profundo conhecedor e pioneiro no campo da espiritualidade cristã, fundador e professor do renomado “Regente College” onde tem lecionado a cadeira de Teologia Espiritual substituídos por Eugene Peterson; James Houston é considerado um homem sabedor de diversas áreas do conhecimento humano e amigo de C S Lewis.

Sua busca e questionamentos concentram-se no campo da oração como amizade com Deus. Contudo, antes de avançarmos com seu pensamento sobre este assunto, refletiremos na seguinte questão introdutória: O que entendemos por orar?

Tecnicamente, orar é dialogar com Deus todo o tempo. É o que Paulo aconselha aos irmãos em Éfeso, “orarem em todo o tempo” (6:18). Uma curiosidade sobre a oração é que ela é profundamente direcionada por aquilo que cremos e como nos comportamentos. Ou seja, o caráter de nossas orações será marcantemente determinado pelo caráter de Deus, enquanto o conhecemos e o experimentamos.

Orar é articular nossos desejos, vontades e angústias, mas também é fazer nossos pedidos e súplicas a Deus. Noutras palavras, entendemos que orar é falar, falar, falar, falar e falar… com Deus.  Entanto, em (Mt.6:5-8), Jesus faz um comentário surpreendente. O de que, quando oramos devemos fechar a porta do quarto e ir para o mais profundo do silêncio, ou seja, ir para o recluso, para a introspecção.

Assim, para Jesus, oração não é alguma coisa que Deus ouve, mas o que Deus vê. Nesta perspectiva de Jesus, a oração tem muito pouco haver com nossas palavras, mas tudo haver com nosso coração. Portanto, podemos dizer que, a luz de Cristo, a oração é uma experiência de Deus que transcende as palavras, pois estas são limitadas demais para expressar esta experiência do divino. E buscar a Deus no silêncio é construir a verdadeira intimidade com ele. Intimidade esta que é expressa e desenvolvida no relacionamento com Deus.

“Minhas orações, Deus meu, fluem do que não sou. Eu penso que tuas respostas me transformam no que sou”. George MacDonald

O questionamento de James Houston acerca da oração o conduziu ao entendimento de que precisamos de uma teologia que nos desperta para um relacionamento pessoal e verdadeiro com Deus. Noutras palavras, uma teologia que nos aponte o caminho da oração que seja mais pessoal e afetiva, e não apenas acadêmica.

Em seu livro “A oração: O caminho de amizade com Deus”, Houston procura ensinar a orar e cultivar uma amizade com Deus. Ele nos leva a descobrir que orar é mais do que conseguir de Deus aquilo que desejamos, é exercer um relacionamento de amizade com Ele.

O capítulo oito deste livro traz como título “Oração: A amizade com Jesus Cristo” onde o autor fala acerca deste caminho relacional de amizade entre o homem e Deus.

Dia após dia; dia após dia; Ó querido Senhor, três coisas eu oro: Ver-te mais claramente; Amar-te mais amorosamente; Seguir-te mais de perto; Dia após dia”.

Ele inicia o capítulo dizendo que na realidade do Espírito Santo possuímos tanto a transcendência de Deus, onde ele é o outro distinto de nós em sua divindade; quanto sua imanência, onde seu Espírito é intimamente pessoal, “mais próximo do que a respiração”. Como ambos, ele é o Espírito de Jesus que permanece conosco para todo sempre.

Diz também que à medida que o Espírito trabalha em nossas orações podemos aguardar significativas mudanças, ou seja, a forma pela qual oramos será radicalmente transformada, pois experimentaremos uma maior liberdade de comunicação com Deus, a media em que nos tornamos mais e mais seguros de que ele nos aceita como somos.

Um aspecto destacado pelo autor neste capítulo é a oração e a nossa pessoalidade. Ele argumenta que a oração como amizade é afetada por nossa educação exatamente da mesma maneira que ocorre com todos os nossos relacionamentos. Assim como nossa personalidade é desordenada, também nossas paixões o serão. Para tanto, o autor explica que a morte de nossa velha natureza nos conduz à novidade e grandeza de vida com consequências inimagináveis.  Ressaltando que nosso trabalho não é suprimir ou esconder nossos verdadeiros sentimentos, como temos feito desde a infância, mas expô-los a Deus de modo que ele possa nos curar e fazer de nós pessoas íntegras.

Outro aspecto destacado aqui é a oração e nossa submissão. Houston entende que a submissão a Deus e aos outros é a chave da oração, pois orar é reproduzir o caráter de Jesus em nós mesmos permitindo que nossa vida seja moldada por ele. Por isso, quando oramos em submissão à vontade de Deus, nossas orações não são mais nossas próprias, expressas de nosso ponto de vista, mas expressas do ponto de vista de Jesus em nós.

A oração e nossa fé também é outro aspecto levantado pelo autor. Através da fé nos apossamos de realidades que não podemos ainda ver ou vivenciar por nós mesmos. Houston tem descoberto que esta é uma jornada pela náusea, sobre um abismo temível. Isso porque Jesus nos guia através dos túneis escuros de nossos medos da infância, de nossas culpas secretas e de outras coisas que temos tentado esquecer e reprimir. Ele diz:

Com medo do mar, eu fui obrigado a mergulhar nele nos braços de meu Pai. Com receio da fé como um modo de vida, fui privado da estabilidade profissional. Pelo medo de fracassar, tive que ser quebrantado por meio de uma desonra pública. Cada um de nós tem de passar pelo caminho da náusea”.

Segundo ele, o evangelho de João fala que a palavra “crer” expressa um relacionamento contínuo e dinâmico de amizade com Jesus. Nada fazemos sem Ele, e esse caminho de fé significa estar impregnado com a consciência de sua presença o tempo todo.

Outro aspecto destacado pelo autor é a oração e nossa liberdade. Orar em nome de Jesus significa sermos liberto de nós mesmos. Houston diz que o medo é um sinal de nossa possessividade, ou seja, quanto mais auto possessivos ficamos, mais medo sentimos. Por isso, a meditação constante na Bíblia nos liberta de muitos medos e fraquezas; do medo da opinião dos outros; da fraqueza pessoal e das autoindulgências.

Um último aspecto a ser mencionado aqui é a oração e nossa direção. Houston diz que o propósito primário da oração não é, portanto, atender nossas próprias necessidades, tampouco satisfazer nossos desejos, mas glorificar a Deus através do modo que oramos e vivemos. Jesus nos conclama a um propósito específico: que sejamos frutíferos. Todas as nossas orações são subservientes a este objetivo claro. Assim, Jesus nos denomina seus amigos por uma razão: para compartilharmos a outras pessoas a alegria de nosso relacionamento com ele.

O poeta William Blake nos conta que “somos colocados na terra em um pequeno espaço para aprendermos a suportar os raios de amor”. Felizmente, estes também são raios de amor que brilham em nós, ajudando-nos a explorar os abismos da nossa própria insignificância, a remover as máscaras de nosso autoengano, o solo estéril de nossa solidão. Isso somente pode nos acontecer quando estivermos determinados, em humildade, a fazer de nossa vida uma vida de oração.

Concluo dizendo que, por ser quem é, e por sua ousadia em buscar inovar a teologia de um assunto tão discutido como a oração, é que James Houston merece ser ouvido através desta maravilhosa obra literária.

por: Ângela Aleixo

Princípio da conversão que deve perdurar por toda vida (Áudio)

Domingo à noite, Everson nos deliciou (por usar seu linguajar) com mais uma pérola Joanina. (Evangelho de João, 1:1-18)

O centro da ideia é o seguinte: Sendo Deus realmente grande, a simples presença (real) dele evaporaria instantaneamente a nossa lista de pedidos com a qual tão insistentemente simplificamos o Criador a um mero fazedor de desejos humanos.

Fiquei pensando em como sou mesquinho e curto de vista. Analisei como o Pai Nosso começa justo como João 1:1, colocando Deus nos céus, inatingível e o reino chegando à terra em Cristo e através da Igreja. E finalmente como a maior parte do tempo, oramos com nós mesmos.

Bom, mas isso é farinha de outro saco.

Ouça por você mesmo.


A paternidade e a pátria

Parece que não faz muito tempo que escolhi ser pai, mas se me ponho a fazer as contas lá se vão 29 anos. Quem quiser uma versão mais leve destas mesmas ideias, dê uma olhada neste outro artigo. A decisão de ser pai é anterior ao chamado ao pastorado e é concomitante com a escolha profissional; deu-se em circunstâncias de plena admiração pelo meu velho.  Lembro que naqueles dias pediram para levar uma foto da personagem que mais admirávamos e, então, levei uma foto 3×4 de meu progenitor. A nossa relação (marcada por um profundo e perpetuo silêncio desde que eu tinha lá meus 8 ou 9 anos), sempre foi no sentido em que eu entendia meu velho, mas sentia como que o contrário não era sempre igual. Faz uns dias liguei para ele por conta do dia do amigo.  Isso porque no âmago da minha definição de gente está a figura do meu pai-amigo, segurando a mão quando eu era um pivete. As minhas primeiras lembranças são com ele. Todas e cada uma das cicatrizes que levo foram feitas estando com ele e de nenhuma delas me arrependo.  As coisas que sei e as que imagino da escritura tem como referencial meu velho que -ao final das contas- soube nos passar bem a teoria da coisa. Todavia, ver as ambiguidades que nele havia, me levaram a tomar a decisão de ser pai. Ou seja, de ser um outro tipo de pai na realidade.  Acessível, compreensivo, presente, interessado, ouvinte, firme, acolhedor.  Me lembro exatamente onde e como estava naquela noite, assim como  o frio invernal uruguaio  batendo no meu rosto. Me lembro da primeira namorada. Ele me apoiou, me bancou, me deixou livre, mas não me aconselhou, não me levou para conversar. Uma única vez me falou sobre o relacionamento marido mulher e falou assim: “quando um homem assume um compromisso com uma mulher, tem que levar esse compromisso até o fim“.  Isso causou um vácuo em mim porque queria dizer -naquela época- que eu não mais podia errar, não podia sequer tentar conhecer uma mulher.  Então decidi beber desse poço de imensa sabedoria ao meu ver, e desse ponto em diante não mais namoraria até que fosse para casar. Casei. Tentei ser e fazer a mulher feliz; tivemos uma filha maravilhosa e um que partiu antes de ver este mundo. Mas esta relação não chegou ao bom termo almejado no inicio. Eu estava, de todo coração, tentando ser um bom filho. Mas nessa relação de paternidade/amizade havia faltado o mais relevante: o diálogo. Hoje eu entendo meu pai. Eu sei que ele não estava falando para mim ou de mim.  Estava falando dele mesmo e de sua frustração particular. Seu poço silencioso e solitário se tornara insuspeitavelmente estreito e, do alto (ou do fundo) da sua meia-idade, observava como se esvaiam os últimos anseios de felicidade elaborados durante a juventude. O mais difícil e perfurante no processo de queda, separação, solidão, divorcio, não foram as noites sem dormir nem a falta de apetite. Não foi também o sentimento de culpa nem os olhares fulminantes dos que tinham formado um ideal além da minha capacidade e, agora, não tinham outra opção a não ser mudar de lado na rua quando me viam andando. O que mais doía era não poder estar com minha filha no final do dia. Abraça-la, faze-la dormir, aconchega-la nas noites de chuva, assistirmos um bom filme juntos, ou andar de mãos dadas. Isso até hoje me faz falta, pois, de ser o homem que transmitia segurança, passei a ser o traidor dos sonhos infantis de uma menina inocente. Continuei então a trabalhar com o que tinha sobejado: acessibilidade, compreensão, diálogo, presença sempre que possível e graça, muita graça. Me expus ao ridículo e à critica pública por passar tempo demais na casa da ex porque era ali que minha filha estava; mas era o preço a ser pago para -de alguma forma- suprir o que eu mesmo tinha tirado. A ninguém, mais do que a mim mesmo, chamo como responsável pelo que aconteceu. E com isto também não assumo culpas que não me pertencem, mas como homem-adulto-cristão, eu mesmo respondo pela minha conduta. Vieram mais dois filhos com a atual esposa. Um já pronto e outro por fazer. Enquanto ando nesta vida, tento com os três, ser o pai que me propus há 29 anos.  Não do cume de uma suposta perfeição imarcescível e inatingível, mas de um simples homem que se reconhece pecador, falho e principalmente carente da graça divina. Aos que já são avós, esqueçam o que para atrás fica. Seja o melhor vó/vô possível. No fim das contas, somos a única espécie que tem chances de ver os filhos dos netos crescerem. Aos que são pais, esqueçam o que para atrás fica. Enquanto seus filhos estão em idade de estar perto de você, esteja você perto deles. Converse, dialogue, ouça, olhe, conheça, espere, mime, anime, exija, alente, motive, se exponha. Aos que ainda não são pais, esqueçam o que para atrás fica. Observe seu velho, veja como ele vive, fique com a melhor parte do bolo. Você pode escolher só reproduzir aquilo que seu pai faz de bem. Seu pai não está por perto? Não se preocupe. A imagem de “pai” está bem guardada no seu inconsciente, o arquétipo do que é um pai e de como deve comportar-se estão lá.  Seja então aquilo que você mesmo não teve para seus filhos que ainda estão por vir. E finalmente, não perca de vista que -como diz o tango- “vinte anos é nada“; ou seja, o tempo passa muito rápido.  Relaxe, curta o fato de ocupar a função mais gritantemente necessária na época que vivemos: Ser pai. Não se acanhe. Não morgue. Não adie. Não envileça. Não tema. Não retroceda. Não suma. Não desanime. Não se envergonhe. Viva, curta, desfrute, ame, compartilhe. E seja pai onde lhe tocar ser pai e do melhor jeito porque ali onde você é pai, fique tranquilo que ali e só ali, será sua pátria.

Uber pater sum, ibi pátria (Aurora, Friedrich Nietzche)

Se existirem alienígenas, eles tem medo da gente?

Meu filho costuma pensar demais em algumas coisas. Nesse pensar tão livre que só as crianças tem me veio com essa o outro dia: Se existirem alienígenas, eles tem medo da gente?

Para ele o fato de existir ou não vida de um jeito similar à que conhecemos aqui fora do nosso planeta, é um problema secundário de face à possibilidade de serem eles os que tenham medo de nós e não ao contrario.

Bom, de inicio isso arruína certos produtores de Hollywood que tem gasto imensas fortunas (e ganho muito mais ainda) em filmes que evocam o terror no populacho (e em algumas mentes auto-intituladas eruditas), mas abre o leque de opções para os psicólogos siderais de plantão. Que tipo de monstro somos nós os seres humanos que temos a faculdade de arruinar o sono desses alienígenas ainda por conhecer?  Alienígenas por conhecer: somos seu maior pesadelo.

E o pior que se formos ver o jeito em que tratamos a natureza que nos é comum, os nossos vizinhos, o bem público, os nossos filhos; se tirassem uma instantânea dos nossos pensamentos mais solitários e livres; se de alguma forma uma tomografia espiritual da nossa alma pudesse ser feita, causaríamos espanto não só nos supostos alienígenas, mas em nós mesmos.

Um dos versículos que mais resisti na vida adulta é o de Jeremias 17:9

Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso; quem o conhecerá?

Ou como diz a versão católica: Nada mais ardiloso e irremediavelmente mau que o coração. Quem o poderá compreender?

Digo resisti assim a boca de jarro por ser a melhor e mais simples forma de descrever os malabares de interpretação que tinha que fazer para lidar com um texto tão simples e direto.  A Navalha de Occam me cortava por tudo quanto é lado, mas eu resistia pois havia em mim uma necessidade diabólica de coerência que me impedia aceitar o obvio: Nosso coração (a base das nossas decisões no antigo testamento) está fatalmente enfermo pelo pecado.

É claro que há algo de Agostinhano na minha atual perspectiva mas não está certo?  Não vemos na nossa caminhada que nos pegamos pensando em termos enganosos em incontáveis momentos?  Somos então filhos do inferno?

Minha conclusão é que não.  Mesmo sendo filhos escolhidos de Deus (assim como os Judeus alvo do texto de Jeremias) amamos o pecado.  O cobrimos, acobertamos, e nos auto-enganamos.  Quando expostos, negamos, reclamamos, nos lamentamos e renegamos de tudo. Então qual a diferença? O que distingue o impio do cristão?

Bom, a diferença está em que o ímpio sente paz quando consegue safar-se do castigo (mesmo que seja o terreno, até porque não lhe interessa se há ou não outro).  Já o filho, só sente paz na confissão. Algumas pessoas se confundem dizendo que o perdão só é dado com base no arrependimento.  Se bem é certo que o arrependimento é uma mudança de mente, uma mudança de rumo, uma alteração consciente do sentido que a vida está levando; é certo que o texto bíblico associa o perdão dos pecados (e Do Pecado) à confissão. (1Jn1:9 ou se preferir, NVI)

Por favor, me entenda bem, o arrependimento é necessário, mas a base dessa mudança de conduta é a confissão. Isto é, a concordância com a opinião que o Criador tem ao respeito de nós mesmos e nossas ações.

E eis aqui que temos mais uma coisa: a distinção entre o que fazemos e somos. Modificar o que fazemos não leva a mudanças internas. Uma pessoa pode parar de se prostituir porque é mau para a saúde, ruim para os filhos e péssimo para os negócios mas não porque macula a imagem do Cristo na vida do indivíduo e por consequência na sociedade ou porque é um empecilho no relacionamento com o Deus criador que é santo e não pode compactuar com o pecado.

Já a mudança interna promove uma confissão direta do nosso pacto particular com o pecado como forma de vida, essência e objeto de culto. Por sua vez, é essa confissão a que promove mais mudanças internas que podem abrir o caminho para uma reformulação de caráter em que o Cristo possa aparecer no viver do cristão (mesmo que no inicio seja ocasionalmente) o que por sua vez promove maiores mudanças.

Simplificando: enquanto vivemos sem pensarmos em nós mesmos e na nossa essência, não assustamos ninguém. Assim que pensamos acontece de duas uma: ou nos acomodamos melhor com a própria perdição ou empreendemos uma longa jornada de descoberta do Cristo largamente lastreada no processo de confissão e arrependimento que nos pode levar a uma reformulação do caráter.

Repare na universalidade deste principio.  Não está limitado a idade, sexo, bagagem religiosa, localização geográfica ou grau de instrução. Não interessa se você é o diretor bem sucedido de uma excelente empresa que cumpre seu papel com responsabilidade social e civil, ou se é um presidiário cumprindo uma longa pena. Todos nós partilhamos da mesma essência caída em Adão e a graça de Cristo é abundante para te levar do estagio em que você está ao seguinte que ele queira te levar.