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Vote melhor: Não vote num messias.

Tempo de eleições se presta para a manifestação da mais pura das imbecilidades: A espera por um messias.

Antes que abandone a leitura, deixe-me lhe dizer que não estou com isto desacreditando do Messias Jesus ou alguma coisa parecida mas sim enfatizar que é tosco esperar por uma única pessoa que salve a nação. Se formos ver era isso mesmo o que se esperava de Jesus no seu tempo e os seus próprios discípulos não entenderam que se tratava de um outro tipo de Reino e não um sujeito ao padrão terreno. Neste sentido, até ele mesmo teve que ‘desconstruir’ a ideia de um Messias terreno.

Mas voltando no nosso assunto; independente se você polariza para esquerda ou para direita, no fundo, espera por um ‘Salvador da Pátria’. Alguém que vai botar ordem e progresso onde -aparentemente- só há desmando e atraso. Esta ideia de um ‘Salvador da Pátria’, se junta com a outra de ‘Isto só acontece no Brasil’. É mais ou menos um sentimento de inferioridade coletivo associado ao ‘complexo de Gabriela’: nascemos errado, logo sempre seremos errados. Duas falacias separadas apenas por uma vírgula.

Brasil não nasceu errado. E mesmo se tivesse nascido, não está por isso condenado a estar errado o resto da sua existência. O mesmo se aplica aos outros países das ex colônias hispano-portuguesas assim como às holandesas, britânicas, francesas.

Se o problema está na gênesis da nação, logo, apenas quem pudesse mudar esse inicio é que poderia mudar as coisas. Já se o problema está no coletivo inferiorizado, apenas alguém que pudesse mudar a identidade essencial do povo como um todo é que teria as chances necessárias para mudar a atual situação. É por isso que – ao meu ver – esperar por um messias (de esquerda, direita, centro) é tolice. Na realidade está mais para um auto-engano ou cândido desconhecimento que outra coisa.

Pode ser desconhecimento por se ignorar os procederes necessários a uma democracia, suas negociações intrínsecas, seus diálogos necessários. E não me refiro com isto ao aproveitamento sistemático da máquina democrática por assim dizê-lo. Me refiro a que -na mesa da democracia- o diálogo e a negociação são essenciais. Logo, ao esperar por um ‘Salvador da Pátria’ se espera em realidade por alguém que com pulso firme coloque as coisas no eixo. Sim, é verdade que as coisas estão fora de eixo. Sim, é verdade que o Estado tem sido tomado por assalto. E sim, é verdade que isso não acontece apenas na ‘Pátria amada’, acontece também na ‘Terra dos Livres’ assim como na ‘Pátria Livre’ das estepes siberianas. Todavia, nada disso justifica o sacrifico da democracia. Muito pelo contrario, é a atual situação a que clama por uma democracia forte. Talvez com revisões, mas mais forte. Talvez uma democracia mais chegada ao povo comum, ao empresário local, ao dono de casa, à chefe de família, mas democracia no fim das contas.

Pode ser auto-engano. Mas não qualquer coisa, um auto-engano bem orquestrado com intervenção de um forte viés de negação da própria realidade. Um engodo de tal tamanho que nos parece ser real. Por exemplo, é bem provável que lhe falte coragem para fazer as mudanças na sua vida pessoal que lhe levaria a trilhar um caminho diferente (não necessariamente melhor, isso o tempo vai dizer). Faltando essa coragem no âmbito pessoal, é de se entender a necessidade de um ‘Salvador da Pátria’. É uma simples inversão da ideia de que ‘a culpa é dos outros’ ao colocar ‘a responsabilidade em apenas um’. Pensa-se que se há um único homem com responsabilidade e valor suficientes, as coisas vão se encaixar. Se adiciona a isso o lance do ‘caráter’… fulano é integro. Na verdade você não faz ideia do caráter do fulano, apenas precisa acreditar em alguma imagem que a mídia ou o marketing vendem, isso se junta com sua inabilidade no mundo democrático, se soma à letargia e pronto, temos a receita pronta para um ‘Homem de Deus’ (de esquerda, direita ou centro) que vai salvar o mundo.

Veja se isso não se repete nos filmes que assiste, nos times de futebol, no banco da sua escolha, na escola que escolhe para os seus filhos…. sempre há a ideia de que um único lance, um único jogador, um único mocinho, uma única peça vai solucionar o todo quando o o todo é -por natureza- caótico.

Então que rumo tomar? Se não há messias, se o simples fato de associar as soluções dos problemas à escolha correta ou errada de uma única pessoa já está errada, o que fazer? Como atacar o caos com uma única bala? Porque eu não sei se reparou, mas você sim tem uma única bala (marcada) a cada quatro anos e o caos é enorme. Como um simples votante pode pôr isso tudo ao vento e arejar a coisa de vez?

Voto em branco ou nulo é suicídio. É jogar à roleta russa com o pais. É uma irresponsabilidade tamanho casa pois o que conta é o total de votos válidos. Logo, para alguém responsável é uma opção inviável.

Perguntar ao seu xamã, pajé, pastor, padre, agiota, em quem vai votar, é mais tolo ainda, já que o cara não tem uma bolinha de cristal para saber o certo ou errado. Ele está tão confuso, angustiado e cansado como você.

Colocar todos os candidatos numa sacola e sortear é melhor do que a pergunta porque pelo menos não passa vergonha. É menos irresponsável porque pelo menos é a ‘sorte’ a que decide. Mas serve apenas como ponto de partida, para as próximas eleições você vai ter que voltar às raízes.

Me explico: Para mim a solução não passa por um messias ou uma consulta aos seus iguais ou um sorteio. A solução para o caos é adicionar caos à equação e para isso é necessário voltar à raiz da democracia. Não há necessidade de novas leis nem nada. Apenas saber o seguinte: Quando Solon -pai da democracia- inventou esse lance do povo ter o poder, o fez sobre bases representativas e -olha só- um candidato eleio podia ocupar um determinado posto apenas uma única vez na vida. Olha que beleza, quando este homem inventou o lance, conhecia muito bem a natureza humana e sabia que ia dar errado. Por isso, colocou o melhor contrapeso já inventado: você só pode ser guardião do templo da Deusa X por cinco anos uma única vez na vida. Pronto… Seja bom ou ruim, em cinco anos sai e parte para outra.

Obvio que não dá para mudar as leis de um pais para se atentar a isso. Vão surgir um monte de pseudo-defensores da democracia dizendo que se o povo quer o fulano de novo no poder, porque não colocá-lo. Mas a minha proposta é: Nunca vote na mesma pessoa duas vezes para o mesmo cargo. Parece tolo mas pense um momento comigo: as coisas estão como estão porque nós -o povo- as colocamos assim. (Obvio que uma boa teoria da conspiração acalma a consciência) As pessoas (e em especial certas empresas disfarçadas de partidos políticos) se perpetuam na teta da mãe pátria, apenas porque nós -o povo- os mantemos lá. Ai o que acontece se os candidatos não se elegem? a própria pseudo-empresa vai ter que achar outros candidatos pra preencher a vaga. Aos olhos deles, a culpa não é do povo que pensou por conta própria (ao final das contas, eles entendem que o povo não pensa pois se pensassem não teriam sobrevida) e sim do candidato. Isso vai levar a um desarranjo institucional interno e criar as condições para que um candidato mais apto (leia-se: com melhor capacidade de engano) surja e seja posto. Até lá, quem entrou no poder (Senado, Deputados, Presidencia, Camara dos Comuns, Sociedade de Futebol de Chapinha) vai -por uma questão de pura vaidade- tentar mostrar serviço. Para a próxima rodada, ele pode que seja ou não re-eleito -isso não interessa ao método proposto- mas o sistema como um todo melhora porque não há mais certeza sobre a manutenção da situação já que o povo pensa e usa a única bala que tem para matar o parasita e permitir que algum raio de luz ilumine a pilha de esterco na que nos metemos.

Trabalho como castigo divino

Estava ouvindo o radio hoje cedo e o pessoal tentava tecer um argumento bastante interessante. Se tratava de que, ao impedir o homem de trabalhar por meio de planos assistencialistas, o que se estava de fato fazendo, era impedir o homem -quanto individuo- de cumprir o castigo divino de trabalhar.

Colocando à parte o fato de que sim, concordo em que há um mundo de pessoas que se valem de planos assistencialistas para não se esforçarem e de que do outro lado da corda (aquele que cria estas “oportunidades”) se encontram aqueles que lhes interessa ter essa massa de manobra cativa, pobre, semi-analfabeta, constantemente dependente; colocando à parte isso como dizia, a analise me fez lembrar que há pessoas que pensam piamente que o trabalho (do latim tripalium) seria um castigo divino.

O problema com essa ideia é que não tem sustento no relato bíblico e que era esse justamente o âmago do argumento do radialista. Para tanto usava o já bem conhecido texto de Gênesis 3:19 “Com o suor do teu rosto comerás o teu pão, até que voltes ao solo, pois da terra foste formado; porque tu és pó e ao pó da terra retornarás!

O que me tem surpreendido é o imenso número de cristãos evangélicos acreditando que nesse texto se condena o homem a trabalhar.  E digo que me surpreende porque – supostamente – os evangélicos são “o povo da Biblia”.

A coisa é bem simples: Gênesis 2:15 diz “E tomou o Senhor Deus o homem, e o pôs no jardim do Éden para o lavrar e o guardar.” Ou seja, é simples: Deus fez (trabalhou) o universo formou o homem e o colocou (sim, sei, sem que o próprio homem pedisse) para cuidar da criação antes da queda. As coisas novas em Gênesis 3:19 são: O cansaço, a frustração diária, a morte mas o trabalho, isso é anterior.

Resumindo: O trabalho faz parte do plano original do Senhor e é exatamente por isso que dignifica o homem.

Melhorando o argumento do radialista: Impedir o homem de trabalhar para ganhar seu sustento, tira do homem a dignidade que o próprio Eterno lhe quer dar.

Respostas a inquietações científicas e religiosas

A religião tem sido atacada de diversas maneiras e por inúmeras frentes no implacável
combate que impregna a história humana. Munidos de hermenêuticas próprias construídas a
partir de postulados científicos e empunhando a bandeira da modernidade, muitos céticos se
lançam vorazmente na tentativa de destroçar qualquer indício de crença religiosa. Espadas são
desembainhadas em lutas quixotescas que se embrenham por batalhas inexistentes
alimentadas por suas próprias ilusões bélicas.

O que tais tentativas parecem não se dar conta é que a ciência e a religião jamais foram
inimigas e jamais estiveram em trincheiras opostas. Na verdade, muito do que se diz da
religião tem sua razão de existir. A interpretação que se dá aos processos, porém, parece
carecer de legitimidade.

A religião, assim como a política e a ciência, tem sido um instrumento de opressões, abusos e
malignidades dos mais variados tipos. Vitimas de interesses escusos e manipuladas por
consciências inescrupulosas, tanto a religião como a política ou até mesmo a ciência se
constituem como instrumentos nas mãos de uma sociedade maligna. Como já disse Ulysses
Guimarães: “O poder não corrompe o homem; é o homem que corrompe o poder. O homem é
o grande poluidor, da natureza, do próprio homem, do poder.” Parafraseando poderíamos
afirmar que a ciência (que foi utilizada para o desenvolvimento de armas de destruição em
massa, como a bomba atômica, as armas químicas etc), a política (que em nossos dias parece
ter se tornado sinônimo de corrupção) ou até mesmo a religião (que tem sido um meio de
manipulação das massas), não corrompem o homem, mas sim é o homem quem corrompe a
ciência, a política e a religião.

O ser humano é o principal corruptor e manipulador dos meios que dispõe para dar vazão a
suas cobiças, seus intentos, suas demências e suas volúpias. Se as classes dominantes se
utilizam da religião para seus próprios intentos malignos, não deixam de lado a política e a
ciência.

O período chamado “Idade das Trevas”, foi, sem dúvida um tempo de obscurecimento da
razão e teve como seu principal protagonista a religião. Esta, instrumentalizada pelas classes
dominantes, se utilizou da boa fé do povo para chegar a seus propósitos maculados.
Com a derrocada das “Trevas”, a partir do surgimento do Iluminismo, instala-se uma nova
esperança para a humanidade. Se o obscurantismo de tempos passados tinha cedido espaço
ao raiar de novos horizontes, agora acreditava-se que finalmente a humanidade seria elevada
às esferas da justiça, igualdade e fraternidade. A liberdade científica surgia com toda a
imponência e as promessas de melhorias da vida social e humanitária eram cada vez mais
vociferadas por seus proponentes.

A história nos mostra que no século XX, auge da emancipação da mente humana das rédeas
funestas da religião, o homem, feliz em suas descobertas, foi encontrado ébrio e cambaleante
em suas próprias vaidades e soberania. Como todos sabem, a racionalidade humana, a
iluminação do intelecto e os avanços científicos não puderam impedir as duas grandes guerras
mundiais do século XX. Milhões foram dizimados, manchando as páginas da história como
nenhum outro período anterior o fez. O florescimento da ciência, que muito ajudou a
humanidade em questões de saúde e bem estar social, também proporcionou oportunidade
para a concretização das destruições em massa e das barbáries que até hoje arrepiam até os
menos sensíveis. Além disso, o boom da revolução industrial, que prometia cada vez mais
condições dignas para a vida humana, não impediu o processo de massacre nas fábricas e a
mecanização humana. Charles Chaplin retrata brilhantemente este fenômeno no filme:
“Tempos Modernos”. O homem foi substituído pelas máquinas e o processo de
industrialização relegou às “sarjetas” da vida o operário desvalorizado.

A religião, já fora dos holofotes e da mira dos seus algozes, não pôde ser culpada por
tamanhas opressões e mostrou não se constituir o gatilho que promovia as misérias sociais. Se
os séculos XIX e XX foram o período do coroamento da razão e do destronamento da
divindade, foram também os séculos da destruição em massa e da disseminação da esclerose
social. A religião não era mais a mão que regia os destinos da humanidade, porém a sociedade
continuava amargar suas misérias de forma cruel, violenta e numa progressão exponencial. Se
por um lado a mão do homem moderno apagava as últimas centelhas das fogueiras
inquisitoriais; por outro a mesma mão colhia ali as brasas incandescentes para acender os
fornos crematórios de Auschwitz.

A religião não é inimiga da ciência, pois seu escopo é outro. A Religião objetiva o “sagrado”; a
ciência o profano (comum). O sagrado é o totalmente outro, o transcendente, aquele que foge
à apreensão exaustiva da mente humana. Enquanto a ciência se ocupa do que pode ser
experimentado, observado, estudado e compreendido, a religião permeia o eterno, fala do
inefável, se lança no numinoso, se prostra diante do intocável. A ciência trilha um caminho, a
religião outro. São paralelos, embora às vezes seus olhares se entrecruzem, logo se
abandonam novamente para perscrutar suas próprias sendas.

No âmbito social, a religião consolida os laços familiares, reúne os pares em volta da mesa,
incentiva a solidariedade, a amabilidade, o atendimento aos carentes e necessitados.
Mahatma Gandhi e Madre Teresa de Calcutá são alguns exemplos da religião em ação, lutando
pelas causas sociais, se doando em favor dos menos favorecidos. Abraham Heschel, destacado
líder religioso, posicionou o sentimento religioso ao lado das questões sociais e humanitárias
caminhando lado a lado com Martin Luther King. A eugenia que se apropriou do ferramental
científico e no século XX foi o dínamo para uma ideologia demente de superioridade racial, não
foi suficiente para apagar a chama da luta pela igualdade e liberdade que moveu o coração de
um religioso como Heschel pelas ruas do Alabama.

O papel da religião não é o de desenhar um mundo ilusório para entorpecer a mente do fiel,
mas sim carregar de esperanças um coração que se amarga constantemente pelo desencanto
do mundo moderno. O iluminismo tentou apagar do coração humano a luz do encanto pela
vida. Como disse Christopher Nash (Myth and Modern Literature) “O que é chamado de
Iluminismo, foi, na realidade o escurecimento, porque pretendia a extinção da natural,
primordial mítica luz interior do homem.” Enquanto a modernidade encarcerava o ser humano
na aridez da luta incansável pelo temporal e lançava mais uma vez a sociedade na
desesperança de um mundo bélico que a razão não foi suficiente para contornar, os suspiros
nostálgicos de um coração outrora iluminado por um porvir glorioso que modificava os
caminhos do presente e os preenchia com alegria e colorido, eram novamente sentidos em
meio ao deserto.

Se por um lado a ciência presenteia o homem com o progresso, o desenvolvimento, os
avanços no campo da saúde; por outro pode ser um instrumento que furta-lhe a vida quando o
impede de dar respostas aos anseios mais interiores de suas buscas existenciais e de sentido.
Somos a sociedade do desencanto, da perda de valores, da violência, da falta de respostas, do
esfacelamento das relações, da plasticidade dos encontros, dos amores fluídos (Zygmunt
Bauman). Se a religião foi considerada o ópio do povo, a ciência produziu seus próprios ópios
para substituir o vazio da existência humana. Cresce assustadoramente o número de
alucinógenos no cotidiano, em uma sociedade cada vez mais “iluminada” pelos cachimbos da
desilusão e pelas fagulhas das tragédias.

A segurança dos conhecimentos científicos é questionada no desenrolar da história da própria
ciência. Apesar de trazer convicções importantes para a construção social, as descobertas de
cada época são, muitas vezes, antagônicas a descobertas de períodos anteriores. Exemplos
deste fenômeno são claros e elucidativos. Até 1990 os cientistas criam que os dinossauros
tinham sido extintos por um vulcão, a partir daí se começou a propagar ideias de que um
asteroide teria sido a causa de tal catástrofe. Até 2014 a ciência acreditava que o homem de
Neandertal era inferior intelectualmente ao Homo Sapiens sendo esta a causa do seu
desaparecimento. Já em 2014 descobertas arqueológicas revelaram que o Homo Sapiens não
era de forma alguma mais inteligente que o homem de Neandertal. A ciência já afirmou que o
Neandertal não tinha habitado juntamente com a espécie humana, mas recentemente
descobriu-se que isto era uma falácia. Até 2003 os cientistas diziam que os seres humanos
tinham 100.000 genes, mas depois se descobriu que temos por volta de 19.000 a 20.000. Até o
século XX muitos médicos achavam que a sangria curava quase qualquer doença; hoje esta
afirmação se faz absurda no meio científico. Amostras como estas revelam que os
conhecimentos científicos que outrora traziam segurança a seus proponentes, em gerações
posteriores se mostraram mitológicos e até infantis. As seguranças de muitas afirmações
científicas hodiernas poderão se mostrar totalmente incoerentes e frágeis na geração
posterior. Muitas teorias científicas, como por exemplo a que propõe as causas do surgimento
do Universo carecem de fatos pela própria incapacidade da repetição de tais fenômenos. Fica
evidente que a fé se mostra um elemento de propriedade não exclusiva da religião.

Assim, a religião, ao se propor a lidar com as questões sociais, não oferece resignação,
alienação ou paralisia à energia social; pelo contrário, ressignifica a existência humana,
lançando âncoras no transcendente, procura transformar o presente com o amor, altruísmo,
cultivo de valores importantes para o convício social e busca pela sobriedade das relações
humanas. Quando estabelece suas bases no eterno, a religião propõe um presente
responsável e valorizado, pois as ações que aqui são feitas se refletirão no infinito.

As respostas a uma sociedade contemporânea infectada pela ansiedade, depressão e stress
não advém de uma única fonte, mas sim de uma pluralidade de experiências do humano, das
quais a religião, com certeza constitui-se como parte significativa.

MANIFESTO DOS BATISTAS BRASILEIROS SOBRE A OPERAÇÃO LAVA JATO

A liderança da Convenção Batista Brasileira (CBB) , se pronunciou recentemente através de um manifesto que será enviado às autoridades brasileiras sobre a Operação Lava Jato e a corrupção que assola nosso país.

O texto que segue é reprodução fiel do original:

Rio de Janeiro, 15 de abril de 2015.

Assunto: MANIFESTO REFERENTE À OPERAÇÃO “LAVA JATO”.

“Como é feliz a nação que tem o Senhor como Deus, o povo que ele escolheu para lhe pertencer!” Salmos 33:12

DA CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA
AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

COM CÓPIAS PARA:
PRESIDÊNCIA DO SENADO FEDERAL
PRESIDÊNCIA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS.
PRESIDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
LÍDERES DAS BANCADAS EVANGÉLICAS DAS DUAS CASAS LEGISLATIVAS.
DIRETOR DA POLÍCIA FEDERAL
ORDEM DOS PASTORES BATISTAS DO BRASIL

A CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA (CBB), representando os mais de três milhões de Batistas brasileiros e congregados, atuando atualmente em todo o território nacional há mais de 130 (cento e trinta) anos, através de seu Conselho Geral, vem muito respeitosamente, por seu presidente, manifestar seu sentimento em relação às inquietantes questões relacionadas ao interesse público, no que tange aos aspectos éticos e morais confrontantes com nossos princípios e valores emanados da palavra que temos por regra de fé e prática, a Bíblia Sagrada.

O presente cenário, além de ferir nosso senso de dignidade e respeito ao cidadão brasileiro, despreza também os princípios consagrados por nosso arcabouço jurídico, como: legalidade, moralidade, eficiência, dentre outros.

Acompanhando às ações e iniciativas de combate efetivo à corrupção, especialmente em relação à operação chamada “LAVA JATO”, envolvendo agentes públicos e privados, bem como a apresentação de proposta de anteprojetos de lei pelo Ministério Público Federal, que visam agilizar, efetivamente, o combate à corrupção, materializada através das medidas que seguem:

“agilizar a tramitação das ações de improbidade administrativa e das ações criminais; instituir o teste de integridade para agentes públicos; criminalizar o enriquecimento ilícito; aumentar as penas para corrupção de altos valores; responsabilizar partidos políticos e criminalizar a prática do caixa 2; revisar o sistema recursal e as hipóteses de cabimento de habeas corpus; alterar o sistema de prescrição; instituir outras ferramentas para recuperação do dinheiro desviado. ” (fonte: www. combateacorrupcao. mpf. mp. br/10-medidas)

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL apresentou as propostas acima elencadas e, diante da coerência e relevância social das mesmas, manifestamos nosso inteiro apoio a estas medidas emanadas dos valorosos guardiões da Lei e do bem-estar coletivo. Reiteramos que, por entender que as referidas propostas de anteprojeto representam os mais legítimos anseios do povo brasileiro, apresentamos nossos cumprimentos aos ilustres membros do MPF.

Respeitando e valorizando o importante trabalho das autoridades que agem com dignidade e respeito à investidura a elas confiadas e deste mui digno MPF, desejosos de continuar trabalhando pelo bem-estar de nossa comunidade e do nosso país, colocamo-nos ao seu inteiro dispor para iniciativas de apoio que se façam necessárias.

Na expectativa que o presente manifesto receba de Vossas Excelências a devida atenção e registro, com conseqüente leitura nos colegiados correspondentes.

Com nossas orações,

Pr.Vanderlei Batista Marins

O original pode ser localizado no seguinte endereço: http://goo.gl/qn3mGY

Pronunciamento das igrejas evangélicas históricas sobre as eleições gerais do Brasil – 2014

As igrejas evangélicas históricas do Brasil, em virtude da realização das eleições gerais em 5 de outubro (1º turno) e em 26 de outubro (2º turno) e considerando o papel de seus membros no exercício pleno da cidadania, bem como o comprometimento dessas igrejas com o Estado democrático de direito e o seu reconhecimento e apoio às instituições democráticas, expressas nos Poderes constituídos da República, vêm junto a seus membros e à sociedade brasileira em geral fazer o seguinte

PRONUNCIAMENTO

  1. Nenhum sistema ideológico de interpretação da realidade social, inclusive em termos políticos, pode ser aceito como infalível ou final nem é capaz de interpretar os conceitos bíblicos da história e do reino de Deus, no entanto, cremos que Deus, Senhor da história, realiza a Sua vontade de várias maneiras, inclusive por meio da ação política;

  2. As eleições são parte do processo de busca permanente de equidade social, de garantia dos direitos fundamentais à pessoa humana, de vivência ética e comunitária, às quais estimulamos o protagonismo de homens e mulheres cristãos, comprometidos com os valores do Evangelho de Cristo;

  3. A democracia é um valor universal, bem como o governo representativo dela decorrente e a sociedade democrática pressupõe pluralidade de ideias e a livre expressão do pensamento político, alternância do poder, em forma republicana de participação popular;

  4. Os chamados mensalões, julgados e ainda não julgados pelo STF, expuseram, na esfera partidária, a dualidade de forças políticas de matizes ideológicas distintas, que se digladiam eleitoralmente, visando o acesso ao poder, mas revelam a fragilidade dos partidos majoritários na elaboração de suas amplas alianças partidárias que, em muitos casos, não são de natureza político-ideológica, mas se constituem em verdadeiro fisiologismo;

  5. O sistema de financiamento de campanhas admitido no Brasil é perverso, indutor e retroalimentador da corrupção e termina por eleger, majoritariamente, verdadeiros representantes do poder econômico e não dos interesses da maioria da população;

  6. O atual sistema político reflete partidos políticos que não têm identidade e realizam alianças que não fidelizam ideais, mas denunciam conveniências e interesses corporativistas. De igual modo, o modelo presidencialista de coalizão compromete a ética e a democracia cujos pressupostos são a fiscalização e a alternância no poder;

  7. Candidatos/as frutos de estratégias de marketing e alianças comprometedoras não são dignos de voto;

  8. Ninguém deve receber voto simplesmente por expressar a fé evangélica, antes, deve-se recordar que “a fé, se não tiver obras, por si só estará morta” (Tg 2.1). Entretanto candidatos e partidos que defendem em seus programas posições que se oponham a valores cristãos tais como justiça e paz; integridade da vida e da criação; preservação da família; honestidade e respeito ao bem público não podem merecer nosso voto.

  9. O processo político não se esgota com as eleições e os valores da cidadania, marcados por gestões públicas transparentes e probas, têm correspondência na vida de integridade cotidiana de cada cidadão e cidadã brasileira, na participação, nas reivindicações e na projeção de ações que visem o bem comum.

  10. Repudiamos o “voto de cabresto”; o chamado “curral eleitoral”, bem como a troca do voto por favores sejam pessoais ou coletivos, exortando seus integrantes a exercerem o direito do voto de maneira consciente e bem fundamentado cientes da delegação de poder que o sufrágio nas urnas confere aos eleitos.

Conclamamos o povo de Deus que se reúne em nossas igrejas à participação na escolha das futuras lideranças: Presidente da República, governadores, senadores, deputados federais e estaduais e, para isso, também o convocamos à oração e à reflexão, que possam nos orientar para que nossas escolhas se traduzam no bem comum de todos os brasileiros e brasileiras.

Odeio política! Mas sou a favor do “direito de todo ser humano ter direito”.

Rafael de CamposGosto de associar alguns temas com imagens. Política é um desses temas. Nessa reflexão nos foi proposto escrever sobre “política e o cristão”. Mas como muitos brasileiros, me identifico com outras questões. No entanto, farei um esforço para debater algumas ideias sobre “direito humano”.

            Vamos iniciar com a imagem da “torre de Babel”. Um povo construindo uma cidade e uma grande torre para alcançar os céus dos céus. Um povo de uma só língua querendo encontrar nas nuvens as prosperidades de suas maquinações. Um povo com o mesmo propósito, o de intentar contra aquele que rege toda a Terra. Um povo querendo concentração de poder, glória e riqueza em suas mãos. Um povo querendo ser onipotente, ajuntados em uma mesma cidade para realizar qualquer desígnio que seu coração proponha. Essas são algumas das imagens que minha mente desenha ao ler a narrativa de Gênesis 11. 1-9. Mas YHWH achou melhor não ser assim; talvez por saber que onde “corações” e “línguas” se reúnem, com mesmas iniciativas, sempre advogam arrogantemente seus desígnios acima dos desígnios de Deus. Confusão e dispersão foram a iniciativa de YHWH.

            Essa realidade não mudou muito de lá para cá. Somos um povo que ainda se reúne para maquinar “boas” intenções, bons cultos, bons projetos, bom governo, boas leis, etc., sempre com objetivos pessoais ou mútuos. Há quem diga que foi de Babel que se formou os povos espalhados sobre a face do planeta Terra. Cada nação, povo e língua. Gente de todas as cores e raças, jeitos e trejeitos, culturas e leis diversas.

            Surge uma pergunta: será que “Babel” não foi o protótipo do que veio a ser as nações? Não sei a resposta para essa pergunta, no entanto, penso que Deus sempre chama a si mesmo para olhar e averiguar os desígnios do ser humano em cada nação espalhada pelo globo. Imagino-o também confundindo e dispersando a humanidade quanto aos seus próprios interesses.

            Deixando a imagem da torre, me identifico com as palavras de Foucault (Microfísica do poder), quando diz que o problema da arte de governar, desde o séc. XVI é no nível do “governo de nós mesmos”, o “governo da conduta das pessoas” e o “governo dos Estados”. Ou seja, como ser governado? Por quem ser governado? Até que ponto? Todos nós desejamos um “futuro governo” cabível às nossas pretensas sugestões do que são ou não propostas a se apoiar ou, se são ou não dignas de serem implantadas em nosso país. Mas entendo que o problema não é sermos apoiados em nossas sugestões ou, até mesmo, apoiar aquele que compartilha com nossas sugestões de um governo justo; e sim que, isso tem haver com um problema de governo intrínseco.

            A imagem de Babel é apenas um exemplo daquilo que entendo, teologicamente, ser a raiz do problema da humanidade: governar a si mesmo após a Queda. Consequentemente, governar as pessoas, uma nação, o que seja o menor desempenho governamental, nunca teremos como resultado o ideal. Podemos falar a mesma língua, termos as mesmas intenções e convicções, sempre teremos confusão e dispersão. A grande tentativa é buscar o melhor diante de todas as opções que buscam o ideal, o bem comum a todos. Digo isso por entender a pluralidade existente em todos os âmbitos e estâncias de uma nação. Isso toca, na minha compreensão, nos direitos que servem – ou deveriam servir – os seres humanos.

            Os direitos humanos propõem um tipo/estilo de vida vivido num ambiente/espaço esperado por todos em virtude, simplesmente, de sua humanidade. Por que somos seres humanos esperamos ser resguardados em nossa condição tal. Isso diz respeito a inúmeros direitos de ordem universal, civil, econômico, etc. (isso olhando para os direitos considerados gerais). Cabe dizer que os direitos de todo ser humano são “guardados” por leis que são tidas justas e receptíveis a todos (cf. Os cristãos e os desafios contemporâneos – John Stott).

            Analisando e seguindo pela linha teológica tradicional e conservadora, refletir direitos humanos é remontar à criação do homem; é se apoiar, historicamente, àquilo que certo “deísta” (Thomas Paine) escreveu: “[…] chegaremos ao tempo em que o homem veio da mão do seu Criador. O que ele era na época? Homem. Homem era o seu elevado e único título e um maior não lhe pode ser dado” (Os cristãos e os desafios contemporâneos). Como criaturas, parte de uma mesma família humana, temos os direitos à humanidade desde o princípio. Não os buscamos, não adquirimos esses direitos; eles estão em nós e nos expressam.

            Voltemos ao governo de nós mesmo proposto pela Queda. A “Queda” de toda humanidade torna o que éramos naquilo que não somos e, consequentemente, passamos a ser “isso” por essência. Vivenciamos a desumanização e suas agregações por milênios. Os direitos que nos pertenciam intrinsicamente, hoje precisamos buscá-los, entendê-los, racionaliza-los, lutarmos e apropria-los ao bem comum.

Não raras exceções, encontramos gente que deseja, pelo bem maior, descobrir um caminho que defenda e abrigue as pessoas, pautados por leis que reagem contra abusos, discriminação, racismo, desumanização etc., priorizando as inter-relações humanas e, de certa forma, demonstrando os limites disso tudo. Entendo que todo crime contra a humanidade transparece as nossas próprias atitudes e limitações egoisticamente desenfreadas. Somos indisciplinados, orgulhosos, avarentos, sedentos por sangue, controladores, invejosos, autodestrutivos, (…), pioneiros do mal contra nós mesmos e, com tudo isso, enaltecemos nossa escabrosa humanidade depravada e rebelde.

            O problema é que sempre impomos ao outro, no mesmo padrão, as deturpações de nossa mente, de nossa “raça humana”. Assim, generalizamos e repassamos, desde sempre, a barbárie como um circulo vicioso sem fim. Parece uma antropologia “supra real” o que escrevi acima, mas isso pode ser visto nas atrocidades descabidas do “ser humano”: genocídios, torturas, perseguições, casamentos de contrato, guerras e assassínios em massa, exploração de crianças, mulheres, idosos e deficientes; roubalheiras sem fim, fome, julgamentos injustos, falta de liberdades e de expressão (religiosa), falta de educação e cuidados básicos de saúde, desmatamentos; isso expondo alguns dos problemas de desumanidade.

            Com isso, não quero dizer que não há esperança para nós. Devemos sempre nos lembrar desse “pano de fundo” que nos assombra e que, por vez, nos acostumamos como sendo normal. Como cristão preciso assumir que existe um jeito certo de lidar com a humanidade e seus direitos. Como cristão preciso, também, olhar para a bondade de um Criador que não nos deixa, a nós mesmos, acabarmos de vez com nossa humanidade. Um Criador que não nos deixa mergulhados no mal. Por isso, sempre haverá gente boa tentando fazer coisas boas. Sempre haverá pessoas movidas pela bondade (graça comum) em prol da humanidade.

            Minha proposta sobre os direitos humanos é sim um olhar e retorno para os preceitos bíblicos. Não como imposição da religião cristã, mas como uma luz, entre muitas sugeridas, em meio aos conflitos e lutas por justiça e por direito. Já há tempos optamos e concordamos com a laicidade; fomos precursores no apoio a um Estado separado da Religião e, é assim que devemos manter. Se assim está fincado, não devemos exigir que “o governo deva impor o cristianismo”; nem também que o “governo exclua a religião cristã” (Cf. Política segundo a Bíblia – Wayne Grudem).

A Bíblia como livro da fé em tono do Cristo é um livro universalmente conhecido, mas não imposto como regra universal. Mas podemos elencar que dela três palavrinhas resumem a cosmovisão acerca do ser humano: “dignidade, igualdade e responsabilidade” (Os cristãos e os desafios contemporâneos). Embasados nelas, devemos garantir uma resposta que se fixe ao compromisso exigido por essas palavras. Lembrando, também, que não podemos fazer dos direitos humanos direitos ilimitados, mas comprometidos com os direitos de todos. Um exemplo é exigir dignidade além da dignidade do outro; ou exigir uma igualdade que infrinja os termos de igualdade do outro. Podemos resumir que “em toda ação que consideramos correto praticar devemos também considerar que essas não infrinjam os próprios direitos humanos que procuramos defender”.

Meu “olhar”, portanto, volta-se a um tratamento responsivo e não inventariado sobre a humanidade que nos é comum. Como tais, todos “compartilhamos da glória e da tragédia de sermos humanos” e, assim, não temos o direito de desumanizar qualquer um que seja imagem de Deus enquanto criaturas.

Há um desconforto entre os cristãos com programas de direitos humanos, especificamente os direitos dos homossexuais. Concordo que esse não é o tema mais importante da pauta de um governante, principalmente quando economia, educação e saúde devem ser prioridades superiores, pois atingem a todos. Minha leve opinião sobre o assunto, enquanto direitos, é que os mesmos princípios que envolvem a “dignidade, igualdade e responsabilidade” não devem ser negligenciados a estes.

A sociedade cristã eleva tanto seu posicionamento contrário às uniões de pessoas do mesmo sexo que, agindo desse modo, favorecem as comunidades LGBT a uma transformação da prática homossexual em uma idolatria desenfreada frente à heterossexualidade (Cf. Homossexualidade – Perspectivas Cristãs – Cobb; obs.: não concordo com basicamente 90% do posicionamento do teólogo do processo).

Tanto Stott quanto Cobb compreendem que o relacionamento sexual entre homossexuais nunca será pleno como o vaginal, principalmente por não poderem gerar seus próprios filhos. Sobre o assunto, concordamos que a procriação seria o ideal no relacionamento sexual, no entanto, nem todos os casais procriam seguindo o ideal. Sexualmente, ninguém consegue alcançar o ideal, o que corrobora com a nossa condição humana “normal”. A completude gerada na união de dois corpos sempre será finita e desproporcional àquilo que foi planejado e é chamado de “natural”.

Outra questão é que o sexo (não apenas para a procriação) é também meio de companheirismo e intimidade. Essa assertiva é psicologicamente comprovada para todas as manifestações sexuais. Essa intimidade, de forma negativa, sempre foi corrompida mediante a promiscuidade, a luxúria e inúmeras perversidades. O que quero dizer é que, assim como há homossexuais depravados também há heterossexuais na mesma condição. Ambos fazem de sua sexualidade o seu “ventre”. Todos são atingidos essencialmente pelo distanciamento do ideal.

A grande problemática é que fizemos das pessoas nossos inimigos. C. S. Lewis diz que “antigamente matavam-se os homens maus, hoje eliminam-se os elementos antissociais” (A abolição do homem). Lutamos contra a vida por causa da sexualidade e afins. Lutamos contra a homossexualidade como algo demoníaco ou uma doença genética (psicologia antiga), sendo que se os problemas fossem esses, R. R. Soares/Benny Hinn e outros curandeiros cristãos dariam conta em nome de Deus. Prefiro entender como uma condição fora do ideal para procriação, o que não isenta o companheirismo e afetividade adquirida por eles. John Stott diz que “precisamos ser sensíveis ao fato de que estamos lidando com as emoções das pessoas, sua identidade sexual e seus sonhos de encontrar amor e aceitação”.

Surge a questão: Politicamente devo impor minha fé e realidade cristã em detrimento dos direitos que nos iguale? Acho que não! Esse não é o nosso papel enquanto igreja; seriamos ditadores se impuséssemos uma realidade e experiência cristã como regra de fé a todos. O mesmo acontece do ponto de vista contrário. O lobby gay deve ser uma realidade a ser encarada e engolida por todos? Não! Aqui diferencio o lobby gay dos outros gays que refutam os direitos exigidos por esse partido intransigente. Sou pela causa da igualdade e dignidade enquanto movidos pela responsabilidade daquilo que exigem.

Posso condenar a prática homossexual e mesmo assim conviver bem no meio de uma nação pluralista em seu modo de pensar e de agir legalmente. Isso desde que meus pensamentos e ações sejam respeitados enquanto direitos iguais.

            Portanto, finalizo afirmando que a prática homo afetiva é pecado, mas que mesmo desaprovando, não tenho a liberdade de desumanizar quem o é ou, aqueles que nela se envolvem; que não sou a favor das minorias e suas exigências por leis que destoam das leis igualitárias. Entendido como igreja, penso que nossa realidade e fé podem ser oferecidas a todos, levando em consideração que nem todos, por escolha, optarão a seguir e viver a fé cristã. Assim, todos nós seres humanos convivemos numa realidade social democrática. Resumo e concordo com um sociólogo que diz: “Democracia é pluralidade de interesses e de discursos aprendendo a conviver. Dentre esses muitos discursos, os das igrejas protestantes deve ser mais um, o discurso da ciência, outro, da arte outro, e assim sucessivamente, mas sem que nenhum deles acalente pretensões de construir uma torre para tomar os céus de assalto” (Novas perspectivas sobre o protestantismo brasileiro).

Cristão e política: Entre a alienação e a manipulação

Cresci em uma comunidade de batistas livre-pensadores (se é que isso pode existir) em que as premissas de liberdade, igualdade e fraternidade -se bem não eram mencionadas com essas palavras nem nessa ordem- estavam no âmago da existência social.

Desde cedo soube que se bem Engel, Marx e Lenin (que não são um grupo de rock grunge para os desavisados) eram compatíveis com a teologia da restauração do ser humano, não o eram o marxismo-leninismo como doutrina e muito menos o stalinismo como sonho de consumo das classes oprimidas. Ao mesmo tempo, também ficava claro que um estado voltado para a extrema direita em que alguns poucos escolhidos a dedo eram os que podiam ter alguma chance de sucesso e que dava rédea solta e descabida a uma forma doentia de capitalismo cruel que auto justificava sua existência, não era a esperança prática de um mercado que ao final das contas é formado por gente.

Isso tudo, estava reforçado pela presença pensante de minha dupla dinâmica de pais que tinham nascido na pós guerra e crescido durante a guerra fria. Tinham visto ser a própria democracia do pais esmagada pela presença ditatorial de uma direita moralista que teve sua chegada auspiciada por uma esquerda sublevada pelos desejos revolucionários desnecessários (ao meu ver) em um pais de longa tradição democrática e plenamente livre. Aliás, vale salientar que meu pais é o único latino-americano formado sobre bases laicas logo na sua primeira constituição o que faz ressaltar ainda mais a pretendida revolução.

Atravessei minha infância, então, com um medo danado de uma explosão atômica acabar com as praias mais lindas que existem sobre a face da terra, de sermos varridos pelos soviéticos (sim, naquele tempo da pre-historia, existia um pais que se chamava União de Repúblicas Socialistas Soviéticas) e com uma raiva visceral pela ingerência americana em solos orientais (O nome do meu pais é Republica Oriental del Uruguay, por isso o ‘orientais’). Ou seja, não sobrava ninguém. Eram os charruas contra o resto.

Ai chega a democracia que – ó coincidência – parece que chega simultaneamente e de forma sequencialmente ordeira ao resto do continente. Quando vemos a história, parece que entramos e saímos desses momentos mais ou menos juntos. Tipo assim, desde os tempos de Colombo que estas Américas andam mais ou menos de mãos dadas ou pelo menos, aquela parte que vá de Tierra del Fuego hasta el Rio Bravo del Norte.

Trago à memoria, Winston Churchill – primeiro ministro britânico durante a segunda guerra mundial – que dizia que a democracia não é a forma ideal de governo, mas é a melhor que conhecemos. E lembro também dos grandes momentos da democracia brasileira (sem consultar o Google, que conste) como Juscelino Kubitschek de Oliveira, Ulisses Guimarães, Tancredo Neves, Fernando Henrique Cardoso, Dilma Rousseff e por ai vai. Quem me lê e está atento à lista, já presume certa tendência. Todavia minha tendência é pela boa ventura do Brasil e não por uma certa vertente política. Mas deixa te mostrar como chego lá.

Conheço o Brasil desde 1981, mas cheguei para morar em 1995. Acompanhei muito meu pai pelas suas viagens pelo Brasil então conheço muitos becos e recantos e desde cedo me acostumei com o lance de entender uma cultura que não era a minha. Então quando cheguei, já cheguei amando, curtindo, deleitando-me nessa vasta cultura brasileira.

Todavia, o grande choque veio da constatação da apatia politica (em que a grande massa parece estar imersa) e o voo rasante de alguns abutres eleitoreiros. Para piorar a cena, alguns – assim chamados – pastores e lideres espirituais transferiam à grei suas próprias preferencias políticas pessoais e quando não, impunham esta opção por diversas vias de extorsão psico-morais-espirituais como se de algum projeto divino se trata-se. Não saem da minha memória placas e cartazes, outdoors e outros meios massivos dizendo que a igreja x vota em fulano.

Do outro lado da cena evangélica, estavam os pastores que se entendiam humildemente como tais por causa de uma vocação divina. Eles entendiam que o povo tinha que ficar livre para votar em quem melhor entendia sem a influência do púlpito. Só que em lugar de gastar alguns minutos explicando o porquê desta atitude, pairava no ar a ideia de que ali, dentro daquelas quatro paredes, o mundo não era politico; ali não havia problemas como quem seria melhor candidato para presidente, deputado, prefeito, vereador; ali era a redoma intocável de um povo apolítico que só fora do expediente espiritual se permitia talvez esboçar algumas interrogantes práticas (como “em quem votarei para xxxx?”) que acabavam sendo respondidas quase sempre por sorteio do menos feio, o menos pior, ou o mais espalhafatoso.

Então há ao meu ver dois extremos bem nítidos na vivencia politica evangélica brasileira: A alienação e a manipulação. As duas posturas mamam de uma crendice popular muito bem alicerçada e muito bem nutrida por descuido pastoral seletivo voluntário. Esta crendice é a de que a voz do pastor local é quase que a voz e Deus. Se ele fala que devo votar em Ciclano, então é em Ciclano que vou votar e se ele – seja por seu exemplo pessoal ou por sua falta de interesse, por arrogância ou por pura ignorância, medo, ou o que for – comete alienação constante das coisas politicas, então eu vou me alienar.

Considero a manipulação uma ferramenta diabólica forjada nas bigornas do próprio inferno. Mas entendo que a alienação é tão ruim ou pior que a manipulação porque deixa ao “Deus dará” uma coisa que deveria ser pensada, orada, conversada. Por conta disso e em última instância, o pais é levado pelos manipulados que em lugares de fieis livres pensantes se transforam em massa de manobra de uma corja desgraçada de corruptos, corruptores e corruptíveis que enxergam no palanque nada mais do que oportunidades de se enriquecer de forma rápida e muitas vezes ilícitas às custas (e nas costas) do próprio povo que deveria servir.

Então o que fazer? Quais são as garantias? Como sei que vou acertar? Qual é o candidato que Deus quer? Qual o candidato evangélico que devo apoiar? Como escolho bem um candidato?

Bem, para inicio de conversa, você não tem garantias nenhuma de que vai acertar até porque o que é acertar? O pais muda muito no período em que eles estão no poder e muitas vezes é exatamente isso que o pais precisa: mudanças. Segundo, Deus ama a liberdade e é exatamente isso que ele quer para o ser humano então não há um candidato A, B ou C que o Criador prefira na sua magnifica vontade. Terceiro quem lhe disse que deve votar em um candidato evangélico?

Então, como proceder ao final de contas? Lá vai uma coisa que detesto fazer, uma receita de bolo para ser bem sucedido. Depois escreverei alguma coisa contra receitas de bolo, mas lá vamos nós no embalo das próximas eleições com uma receitinha básica:

  1. Erradica a ideia da redoma cristã evangélica.
  2. Deixa para atrás a perversão do almejo de um estado teocrático. Visa alvos maiores e abrangentes.
  3. Sonha com uma democracia forte e transparente em que os candidatos sejam trocados livremente pela vontade do povo em espaços curtos mas não curtíssimos.
  4. Apoia (durante o período de governo) os projetos que valorizem a construção de uma sociedade mais estável e com melhores oportunidades para seus cidadãos.
  5. Asiste um jornal de verdade (há alguns nas televisão aberta que valem a pena) e presta atenção não só nos escândalos da farra política mas também nos grandes projetos do pais. Uma vez ou outra, ouve a Voz do Brasil. Em especial o Jornal do Senado e o Jornal do Judiciário (dois minutos cada)
  6. Discute não só os candidatos mas os projetos que estão sendo apresentados.
  7. Escolhe com antecedência teus candidatos (principalmente Presidente e Senadores) e acompanha eles durante a campanha mas não fique só com um. Observe os outros candidatos e não tenha medo de mudar se for preciso.
  8. Fica atento aos debates e tenta conhecer mais de perto a forma de pensar não só do teu candidato mas dos outros. Lembra que é bem provável que um debate será o mais perto que consigas chegar do teu candidato e seu pensamento. Foge do que mente. Se és homem, chama uma mulher para detectar o mentiroso.
  9. Cai fora do curral e muda de igreja se teu pastor quer te obrigar a votar em este ou aquele candidato.
  10.  Vota com responsabilidade e vigor. É serio, o destino da nação está em tuas mãos e ao meu ver, só um voto responsável te dá direito de dizer “esses políticos – que eu coloquei lá – só estão fazendo isto e aquilo outro” ou dito de outra forma: não votou, não opine.

Seja que descambemos para a alienação ou para o voto de curral, em qualquer dos dois casos estaremos, com certeza, deixando de lado o que de mais precioso temos: a liberdade de pensamento. O bom voto, é o voto consciente e estudado.

O “eu” Cristão e a política

Há um ditado que diz: “Política, Religião e Futebol não se discutem”. Sobre política e religião, não acredito que seja verdade tal afirmação! Primeiro, porque todos os assuntos podem e devem ser matéria de debate, reflexão e troca de percepções, a não ser, é claro, sobre os que são do nível da preferência pessoal. Segundo, porque falando ou não do tema “política” estamos todos absolutamente inseridos num contexto onde a mesma determina a maneira em que as relações sociais, comerciais, religiosas se darão, e isso afeta inclusive os que não se posicionam politicamente.

A política trata dos direitos e os deveres dos cidadãos da sociedade, além de abarcar a maneira como se administra o bem público em favor da sociedade. É da política o desafio de transformar impostos e demais riquezas do país em qualidade de vida (saúde, educação, transporte, segurança, saneamento, entretenimento etc).

Uma pergunta se torna pertinente neste momento: qual deve ser a relação de um seguidor de Jesus com a política?

Essa resposta precisa passar por alguns tópicos:

1) Estado laico. Uma vez que “não” estamos falando de administrar a política da nova terra (que será a ideal), mas sim da velha terra (que está sob influência do pecado), precisamos entender que o estado precisa ser neutro em relação à religiosidade e assim deve governar para todos e não para um grupo específico. Exemplo 1: Se tenho direito de pôr uma Bíblia nas escolas, as demais religiões também podem reivindicar o direito de ter seus “livros sagrados” no mesmo espaço da Bíblia. Exemplo 2: Se as comunidades cristãs possuem liberdade para celebrarem sua fé, as demais religiões também devem ter seus espaços reservados e protegidos pelo estado (ou pela Constituição).

2) Todas as leis do país devem ser amplamente discutidas. Sobre legalização disso ou daquilo, proibições e regras, é preciso que se paute sempre em favor do que seja amoroso e do que promova a qualidade de vida! Não há como fugir dos temas complexos (pena de morte, aborto, legalização das drogas, etc), não há respostas prontas, não há um modelo infalível, é preciso construir uma sociedade justa, equilibrada e isso não virá senão através de muita discussão levando em conta a cultura e a situação emergencial do povo que se pretende governar. Vale lembrar que num mundo onde há maldade humana, por vezes somos levados a tomar decisões pelo menos pior e não pelo ideal.

3) É preciso uma compreensão apocalíptica não distorcida. Há muitos que por saberem que os últimos dias serão terríveis, se acomodam, sentam na cadeira e ficam num estado de “espera da morte e ressurreição”. Não votam, não acreditam em melhorias, não lutam por nada, não se mobilizam na direção de nada nem de ninguém, se tornam “crentes zero à esquerda” (politicamente falando). Mas, Jesus disse que felizes são os que tem fome e sede de justiça, que deveríamos amar, Tiago disse que deveríamos cuidar dos órfãos e das viúvas, a igreja de Jerusalém buscava promover amplamente a justiça social distribuindo suas posses a quem necessitasse. Portanto, embora saibamos que os sinais do fim já estejam aparecendo, nós somos dos que não descansarão até verem o oprimido ser restaurado e transformado em sua situação, não descansarão até verem o amor e a justiça reinando! Acredito que, dadas as devidas proporções, devemos admitir que o fim, os escândalos, os sinais apocalípticos estão muito próximos, porém, nosso compromisso é com a promoção de toda forma de bem possível.

4) Cristão político sim, mas político cristão jamais! O cristão político é aquele que em sendo seguidor de Jesus procurará fazer o que for melhor para todos, mantendo a ética, o amor, combinando aquilo que se vive (amor ao próximo) com o desenvolvimento e a criação de políticas públicas que viabilizem a qualidade de vida. Já o político cristão é a instituição da religiosidade na política, é a defesa de um grupo buscando privilégios especiais em detrimento dos demais grupos sociais, é a luta em favor de seus guetos religiosos. O cristão político governa pra todos tendo o amor como a base de suas decisões, o político cristão governa para os grupos que lhes são de interesse particular, promovendo uns em detrimento de outros.

Assim sendo, encerro dizendo que um cristão maduro sempre será consciente nas urnas, não se acomodará com o mal estabelecido, mas ampliará sempre que possível a voz da discussão daquilo que seja a boa reforma na maneira de governar para/pelo/com o povo e não tratará com menos mérito a política visto que o que interfere na vida das pessoas também interfere em sua vida. Devemos orar pelos governantes conforme Paulo, devemos pagar impostos conforme Jesus e devemos espalhar as boas obras para que o mundo as veja e glorifique ao Pai que está no céu.

A Trindade na política

Religião e política parecem trilhar caminhos comuns muitas vezes. A paixão que despertam, a ganância que as tenta, o poder que as convida e as barbáries que podem produzir, são reveladas no processo histórico de forma escancarada. Porém, apesar de muitos caminhos em comum, há um único elemento imprescindível para o estabelecimento, construção e sustentação de ambas – o sagrado.

Sem o sagrado não se tem religião nem política. Este, que assume variadas configurações nas mais diversas expressões religiosas da humanidade, se mostra mais uniforme e definível na política.

Não é de estranhar que, em época de eleições, o sagrado exerce enorme força nos muitos discursos inflamados em busca de adeptos. Seguindo o pensamento de Rudolfo Otto de que o sagrado é mysterium, tremendum et facinans (misterioso, tremendo e fascinante), pode-se observar que as forças de atração e repulsão estão em constante tensão em relação ao sagrado no plano político.

Assim como no Cristianismo, o sagrado político se configura de forma triúna. São três os que compõem a sacralidade. Embora distintos, são inseparáveis. As campanhas políticas exaltam, louvam, ou condenam o sagrado de forma veemente. Mas no fim, todas acabam cedendo à adoração que lhe cabe e prometem adorná-lo, cuidar dele, prestar-lhe culto, atenção e melhorias pelo tempo em que tiverem o privilégio de tocá-lo.

A trindade sacrossanta da política sofre o sacrilégio de ver seus nomes tomados em vão inúmeras vezes, sem o mínimo de escrúpulos ou temor. Ela assume três nomes benditos: Educação, Segurança e Saúde. Nenhum pretendente ao ofício pode ousar dar vazão a suas preleções sem invocar a trindade. Ela é a pedra fundamental sobre a qual se constroem os templos suntuosos da máquina administrativa do poder, e se estabelece como alvo do louvor e centro da prédica de todo aquele que aspira subir os degraus do sucesso.

Uma história faz-se necessária para a compreensão dos fatos. Conta-se que um dia houve uma catástrofe. O inimaginável ocorreu e causou um desastre sem precedentes. Ninguém sabe o porquê de tamanha eficácia das forças malévolas no processo de oposição à trindade, mas constatou-se que, em algum momento lúgubre da história antiga, houve uma desavença e desequilíbrio entre os três elementos que compõem a santíssima trindade.

A Educação, enlouquecida, partiu repentinamente e agressivamente em direção à Saúde. Esta, indefesa e já moribunda, gritava desesperadamente por socorro enquanto era golpeada brutalmente até a morte. Amedrontada por tal atrocidade, a Educação fugiu em direção às fronteiras do país. A Segurança, por sua vez, sentindo remorso por não ter podido acudir sua fiel amiga Saúde no momento em que mais precisava, partiu furiosamente em busca da Educação. No caminho, atirou aleatoriamente diversas vezes para descarregar sua ira. O resultado de tais disparos deixou um rastro de sangue por seu caminho. Finalmente a Educação foi interceptada e, na fúria, acabou sendo assassinada pela Segurança. Esta, tentou ocultar o cadáver, mas foi seguida pela população revoltada por tantas mortes inocentes e acabou sendo linchada em praça pública.

“Três cadáveres num mesmo dia. Que tragédia!”, noticiavam os jornais em letras garrafais. Constituíram uma comissão para decidir o que fazer com os defuntos e, após muita discussão, resolveram construir três belos túmulos no maior cemitério do país. Os sepulcros foram milimetricamente calculados e posicionados lado a lado formando um monumento impressionante.

Desde aquele dia, coisas estranhas andaram acontecendo. De tempos em tempos, um espírito (alguns dizem ser maligno, outros, benigno) sopra sobre os túmulos levantando os corpos apodrecidos. Estes saem de seus jazigos e despertam emoções das mais diversas na população. As autoridades, acionadas pelo povo, parecem não tomar atitudes, mas, pelo menos, demonstram concordar com uma coisa: este espírito colabora com o momento.

No cemitério, coisas sinistras também são observadas. Um dos túmulos, certa vez, amanheceu pichado. Não se podia entender os escritos. Chamaram os linguistas mais capazes, mas ninguém pode decifrar a frase. Chegaram à conclusão de que algum estudante mal formado teria arriscado algum pensamento. Outros suspeitam de algum professor frustrado, talvez um proponente de alguma revolução ortográfica. O certo é que não havia muitas pistas, mas uma seta indicava para uma escola, que de tão velha, tinha perdido as primeiras duas letras da palavra escola no seu letreiro. Para conter gastos, ou por qualquer outro motivo escuso, preferiram deixar como estava.

Outro túmulo também passou por uma experiência estranha. Sangue parecia brotar do chão. Levaram para análise. Nunca divulgaram os resultados. Há murmúrios de todos os tipos, mas na realidade todos parecem temer dizer definitivamente algo. Alguém desavisado foi até o local para coletar mais amostras, mas, quando estava agachado, escutou zumbir algo rente à sua cabeça. Deitou no solo e se arrastou rapidamente para longe do local. Tentaram entrevistá-lo, mas se recusou a dar entrevistas. Dizem que contou a um amigo que enquanto rasgava suas roupas se arrastando pelo chão, viu um cartãozinho de uma empresa que prometia proteção particular. O autor da façanha nunca mais foi visto e chegaram a comentar sua morte. O fato é que o caso foi arquivado.

O mais estranho de todos foi o que aconteceu com o terceiro túmulo. Muitos se recusam a falar, outros fazem o sinal da cruz ao mencionar. Dizem que volta e meia, no calar da noite, uma fumacinha sai de dentro do túmulo por um orifício na lateral. Os boatos começaram a se espalhar e uma tv alternativa instalou uma câmera escondida no cemitério. As imagens foram exibidas antes de serem confiscadas. Turvas e arrepiantes, era possível ver, de vez em quando, a fumacinha saindo. As autoridades se mobilizaram, montaram um esquema de segurança e depois apagaram o caso. Hoje ninguém fala muito neste episódio, mas o coveiro, que é uma pessoa meio mística, disse que um dia, andando próximo a este túmulo, encontrou metade de um charuto. Pintaram o túmulo de branco para espantar qualquer coisa ruim e há quem nem passe perto do desgraçado.

Os túmulos continuam lá, ora aparentemente abandonados, ora adornados com flores belíssimas.

Deus ajude o Brasil.

É o povo a esposa postiça do politico?

Lá na minha terra quando uma mulher muito bonita e vista na companhia de um homem feio, se costuma dizer: o que será que ele falou para ela?
Também por lá é sabido que se um homem não falar exatamente o que a mulher quer ouvir e do jeito que ela quer, o carinha está encrencado.
Pode ser que o discurso nada tenha a ver com a realidade mas se for do jeito que a patroa quer, a sopa está garantida. Convenhamos então que todo relacionamento íntimo depende da lábia e a boa prosa do elemento masculino da relação.

De tempos em tempos estes “garanhões domésticos” por chamá-los de alguma forma, ocupam os palanques de todo o território nacional, ora para solicitar votos para o governo local, ora para o governo estadual e federal.  Acredito eu, que muito deles até que possam ser bem intencionados  e confesso que tenho uma queda especial pelos membros do senado que me transmitem um certo ar de fidalguia e estabilidade.  Ao final das contas, eles são capazes de sobreviver aos outros mandatos e por terem um papel mais pensante na coisa,  seus feitos alcançam às vezes muitas gerações.

Mas, utopias à parte me parece que tanto os bons quanto os maus políticos fazem uso de um mesmo método de aproximação: o do acasalamento licencioso com a coisa pública.  Ou seja, no palanque ou o moço fala o que a moça quer ouvir ou nada de votos na eleição.  Nada importa à moça se o moço vai cumprir ou se tem tido conduta ilibada, o lance é que nessa hora ela quer ser galanteada e se a prosa for boa, as gentilezas (e o cofre) da moça estão garantidos.

Nada me importa neste momento sobre as intenções do moço nem sobre as motivações dele.  Me interessa sim a conduta da moça.  Como se deixa enganar! Como se deixa levar! Como por umas boas e poucas palavras de efeito escolhidas a dedo por algum conselheiro partidário ou pessoal ela deixa de prestar atenção do que realmente lhe deveria ser mais caro: os seus próprios filhos.

Já reparou que nas línguas neo-latinas as palavras República, Democracia e Liberdade são femininas?  Bom, eu acredito que não é por acaso.  Essas três respondem ao  mesmo padrão de resposta do que a moça casada com o rapaz feio: “Que será que o rapaz lhe disse?”

Nestas e nas próximas eleições da sua vida pratique a metamorfose da sua mente. Seja tomado de uma metanoia abrangente: reflita sobre a vida do seu candidato. Utilize todos os meios ao seu alcance para conhecer não só a proposta de palanque mas se há um compromisso com a verdade ao longo da vida do candidato.  Informe-se. Pergunte. Analise. Não espere que um anjo (ou um pastor metido a besta) lhe indique que tem que votar em este ou tal candidato.  Gaste seu tempo e suas energias pois com certeza estes “garanhões domésticos” vão usufruir da nossa riqueza por um bom tempo quando são mau-caráter e os raramente bons dificilmente poderão fazer alguma coisa.