Arquivo da categoria: Santidade

Inclusão cristã

No movimento de Jesus, a mensagem de liberdade e inclusão era uma das características centrais. Jesus desafiou as normas sociais de sua época, acolhendo e convidando todas as pessoas a segui-lo, independentemente de sua origem étnica, status social, gênero ou histórico de vida. Sua ênfase na amorosa inclusão ecoou nas palavras e ações dos primeiros seguidores de Jesus.

No contexto cristão dos dias de hoje, no entanto, ainda podemos identificar movimentos e teologias que, infelizmente, excluem certas pessoas da comunhão dos seguidores de Jesus. Às vezes essa exclusão é feita com base em doutrinas rígidas, diferenças sociais ou culturais, e orientação sexual ou identidade de gênero.

Isso demanda de nós um exercício bem eclético que nos leva para longe do assim chamado fundamentalismo cristão. Fundamentalismo aqui nada mais é do que tirar sempre as mesmas conclusões sem nada haver de novo ou que nos cutuque na leitura e interpretação da escritura.

Todavia, esse movimento não pode ser confundido com liberalismo mesmo requerendo liberalidade amorosa. É aquilo de se arriscar no acantilado para resgatar a ovelha.

Vivemos numa sociedade mimada que confunde o amor com liberdade irresponsável. Por outro lado, observamos que a igreja se vê acuada diante de tanta pressão social que – convenhamos – é uma pressão espiritual. Como se amar não fosse também almejar mudanças! Que o digam os pais que amam seus filhos. (Há aqueles que os detestam e também os que praticam alienação parental. Esses servem como exemplo de como não proceder)

Desde a Torá nos seus lembretes de amar a Deus por cima de todas as coisas e amar o próximo como a si mesmo que a mesma ideia se vem repetindo uma e outra vez: não deixe que seu próximo vá para a morte. Ou dito de outra forma, Jesus faz menção aos textos do antigo testamento e no contexto de Levitico 19 encontramos o seguinte:

Não odiarás a teu irmão no teu coração; não deixarás de repreender o teu próximo, e não levarás sobre ti pecado por causa dele.  

LEVÍTICO 19:17

Então, e antes que diluamos o poder do evangelho em afetos puramente terrenos e agendas antropocentristas, é urgente salientar que essa aceitação do Novo Testamento não é uma inoperante ou ineficiente, mas sim aquela que sacia a alma e transforma a totalidade do ser humano.

Talvez seja tempo de resgatar a velha ideia da theosis a partir do novo Adão que teólogos antigos como Irineu promoviam. Não para uma salvação apenas espiritual da alma no além, mas para uma vida enriquecedora e significativa agora.

Então Jesus pôs-se em pé e perguntou-lhe: “Mulher, onde estão eles? Ninguém a condenou?”

“Ninguém, Senhor”, disse ela.
Declarou Jesus: “Eu também não a condeno. Agora vá e abandone sua vida de pecado“.

João 8:10-11

Acolhida transformadora

A liberdade com o conteúdo que o seu criador quer

“COMO é possível que ele queira ser policial!?” bradou Ernesto, “Olha só o passado que ele tem”.

Ele se estava referindo ao relato que estava sendo transmitido em que uma policial rodoviária federal contava sobre a vida de alguém chamado Biel. 

Ela tinha conhecido Biel numa abordagem por roubo. Assaltante a mão armada, violento, nada na vida do Biel parecia indicar que havia um bom caráter ou alguma coisa assim que condissesse com a ideia persistente  ” quero ser policial”

Certo dia esta policial chamada Pamela encontra o Biel num carro que – obviamente – tinha sido roubado. – “Não fui eu que roubei” disse Biel  à policial. Ela cumpriu com seu dever e o levou para a delegacia para atua-lo. Não foi pouca a surpresa dela quando reparou que ele era bem conhecido naquela delegacia. O coração dela (ou como ela mesmo disse: “o coração de mãe“) se abalou. Como era possível que alguém de tão curta idade já fosse tão conhecido numa delegacia?

Sob a premissa de “alguma coisa devo fazer por ele” começou a buscar um jeito de ajudar o Biel a se endireitar. Pensou em adoção até ou quem sabe uma interdição. Entrou em contato com vários policiais de diversas guarnições que ela conhecia: civil, militar, federal, rodoviária. Falou com assistentes sociais, promotor, juiz. Ela tinha que fazer alguma coisa.

Havia uma razão muito forte para Biel viver nessa contradição existencial: ele tinha sido estuprado quando pequeno. Quem sofre este tipo de violencia podem reagir de diversas formas: ostracismo, rebeldia, ódio, pavor, e outro sem fim que fogem ao propósito desta análise. Biel tinha ficado cheio de ódio pelo momento de impotência e submissão forçada. Mesmo tendo bons desejos, mesmo sabendo qual era um bom caminho para ele, não encontrara outra forma de expressão do que esse ódio mortal numa forma de devolutiva visceral para a sociedade que não o soube cuidar.

Na busca por proteger o Biel, Pamela junto com o promotor, a assistente social e o juiz chegaram à conclusão de que uma interdição poderia ser o apropriado. Com a papelada pronta para a interdição e em mãos a policial foi à procura do Biel.

Tarde demais. Biel tinha sido morto de forma violentíssima. Tinha apenas onze anos.


A atitude da Pamela é, sem lugar a dúvidas, aquela que mais faz falta na sociedade. A sociedade que nos tocou viver, está rapidamente se degradando para o ódio e a polarização. A incompreensão do outro – em plena época da hiper comunicação assistida por computador – roda solta amparada por um falso anonimato e uma pseudo-impunidade.

A coisa mais simples e legalmente correta a ser feita seria o de deixar o Biel crescer desse jeito entrando e saindo de diversas instituições até que o próprio crime tomasse conta dele ou se tornasse civilmente adulto para responder por algum crime e, então, trancafiar ele pelo maior tempo possível.

Só que Pamela, contrariando a ditadura do ódio, vá ao encontro do desvalido. Consegue perceber atrás dessa couraça de ódio e ressentimento um menininho carente, solitário, machucado com uma ânsia louca pela vida e com bons ideais mas apavorado, em pânico.

A estas alturas, os partidários de “bandido bom é bandido morto” já devem de me estar crucificando pois “uma vez bandido, bandido para sempre”. Vão me dizer que estou vitimizando o agressor mas isso não passa de uma simplificação absurda que apenas serve para alimentar mais a roda do ódio em que vivemos.

Por outro lado, a turma do “a culpa é da sociedade” já deve estar achando que eu penso desse jeito e culpo aos pais, à sociedade, ao governo, ao estado a Deus ao diabo por tudo o que de ruim acontece com a humanidade. Não se vista tão rápido que com certeza não vai querer me acompanhar no restante da viagem.


Algumas práticas que anteriormente eram crimes, hoje já não são mais e outras estão indo caminho a deixarem de ser crimes. A sociedade (por ser em maior números que os defensores da lei e da ordem) acaba se impondo mesmo que a escolha dela não seja a melhor ou a mais adequada a longo prazo. 

Veja o caso de uso de Cannabis. O porte para uso pessoal é uma evasão à regra de que todo tráfico de entorpecentes é crime. Há uma suavização perigosa em que se deixam as famílias lutando sozinhas com tão grande flagelo. E não me estou referindo ao uso medicinal ou ao uso recreativo após 24 anos. Me refiro ao uso desenfreado em crianças de todas as idades.

Um outro caso que deixou de ser crime e vá em vias de deixar de ser chamado de pecado é o adultério. Independente das razões que possam impelir uma pessoa a pular a cerca, antes era um crime passível de morte, de cadeia, de multa e agora não é nem sequer infração. Já já vai surgir alguém falando que é uma “virtude libertadora” ou coisa assim.

Ainda conservamos um pouco de decência nos assassinatos. Mas isso é porque pode afetar a qualquer um e a qualquer hora. Não é porque queremos – como sociedade organizada – seguir algum mandamento divino ou sequer porque desejemos construir coisas boas e virtuosas. Trata-se apenas de medo. É fácil descaracterizar o aborto como crime, ou o adultério como crime, ou o uso de entorpecentes como crime pois a chance de que isso passe sob o teto do legislador é bem baixa e se acontece, não é tão grave como a morte, já que ela vem para ficar permanentemente ao passo que os outros sempre cabe a chance esdrúxulamente hipotética de desfazer o mal perpetrado.


Pamela queria acolher o pequeno criminoso. Os atos que ele praticara não se qualificam como atividades extracurriculares do ensino fundamental ou tarefa de casa da escola bíblica da igreja local. Todavia, enxergar alí outra coisa do que um microcosmos da realidade humana é de uma brutalidade e desconhecimento terríveis. 

Há em cada um de nós três necessidades básicas: Aprovação, Aceitação, Apreço. (Coloquei as três com A para facilitar a memorização). Em condições ideais, uma família (e por extensão a sociedade à que pertence) irá entregar essas três coisas para seus participantes em especial os mais novos.

É importante mencionarmos isso, porque a palavra acolhida para muitas pessoas acaba soando como se fosse sinônimo de uma das três ou das três quando se trata de outro termo que precisa ser explorado.

Se bem as três características estão amarradas, não são equivalentes nem uma substitui a outra. Por exemplo, uma filha que sempre foi aprovada por ter notas altas na escola e que é aceita devido às amizades que tem, mas que nunca recebe um sinal de apreço do pai, cresce com uma ideia bem distorcida de si e – por conseguinte – da relação com os outros, em especial os homens. É uma forma complexa de dizer para a menina: “Você serve apenas para produção. Não para ser amada”

Pamela escolheu o caminho difícil: acolher o pequeno apesar e por causa da sua vida de criminoso. A turma do “bandido bom é bandido morto” não consegue enxergar o individuo com suas mazelas. Me parece que é uma opção por medo e não por razão. Já a turma do “a culpa é da sociedade” também não consegue enxergar o individuo com suas responsabilidades. A vergonha da própria incapacidade de decidir pelo certo torna este grupo num alvo fácil do “divide e vencerás” ou de “nivelar pelo mais baixo”.

Pamela escolheu o caminho complicado da acolhida que não tem a ver com aprovação, não tem a ver com aceitação não tem a ver com apreço mas tem muito a ver com o amor sacrificial esperançoso. É uma forma bem prática de reconhecer algumas coisas: 1) Sim, a sociedade na sua forma mais básica (a familia) falhou em te proteger, Biel. 2) Sim, você tem um propósito bom, Biel. 3) Sim, do jeito que você está fazendo vai continuar a se machucar e machucar os outros, Biel. 4) Sim, a vida pode ser terrivelmente dura mas estou aqui para te ajudar, Biel.

Pamela não estava aceitando os crimes do Biel, estava aceitando o Biel.

Pamela não estava aprovando as decisões do Biel, estava aprovando os sonhos e futuras decisões do Biel.

Pamela não estava apreciando esse Biel que machucava os outros mas sim aquele que fora machucado no seu ser mais íntimo e fraco.


A acolhida cristã deve ter esses componentes em que se permita a um individuo fitar os olhos em Cristo – apesar de suas decisões e desejos errados – e o fortaleça nessa caminhada. 

A acolhida cristã estabelece um padrão elevado e responsável de conduta pessoal sem deixar de observar que “o pecado que tão fortemente nos assedia” faz um estrago tremendo na imagem do ser humano. Há um delicado equilíbrio entre o “fui tentado” e “reconheço que cedi”. Isso é assim desde o Eden e não vai mudar até a finalização do estabelecimento do Reino.

A acolhida cristã não reduz o nível da vara para facilitar a entrada do pecador empedernido. Também não alarga a porta para que o camelo possa passar com toda sua carga. A acolhida cristã transita o estreito caminho que desvia o pecador da larga estrada que ele está levando elevando o nível da sua consciência e levando-o a um patamar até então desconhecido.

A acolhida cristã não se espelha na acolhida mundana em que não se chama mais o pecado de pecado por não ter a sociedade qualquer forma de solução para dito problema. A acolhida cristã passa pelo modelo de Jesus o Messias em que – por amor a esta sua criação – se aproxima dela em forma humana bem definida e de lá resgata os seus para poder levar “cativa o cativeiro” (Ef 4:8)

Finalmente, é necessário lembrar que todo pecado nada mais é do que uma expressão dos desejos mais viscerais do indivíduo. Isso se aplica à prática do adultério, à prática do assassinato, à prática da homossexualidade, à prática do estupro, à prática do roubo, à prática do abandono da congregação mas também se aplica ao que anda no coração do indivíduo sem por isso chegar alguma vez a ser praticado e é ali onde se desmancha toda a ideia de uma acolhida para continuar a prática do pecado sem peso na consciência, pois é lá – no fundo do mais recôndito da nossa identidade – que Jesus, o Cristo quer ser Rei.  Fazer qualquer outra coisa e continuar a chamar de “cristianismo” é um deboche da fé cristã já que na fé cristã o alvo maior é a restauração do plano original e é para lá que nós vamos.

Junte-se a nós: Acolha para transformar.

Um símbolo que precisa ser preservado.

O símbolo nunca é apenas um símbolo e por isso deve ser preservado.

Nos últimos tempos assistimos a uma tentativa de devassa de um dos maiores símbolos não apenas dos cristãos mas de todos aqueles que – de uma forma ou outra – aceitam o monoteísmo judaico como raiz e origem.

Em outras palavras, agredir um símbolo que unifica as três religiões monoteístas: O Judaísmo o Islamismo e o Cristianismo é – no final das contas – uma agressão não já ao monoteísmo mas sim ao Deus que estas representam.

Gênesis 9:13

8 Então disse Deus a Noé e a seus filhos, que estavam com ele:
9 “Vou estabelecer a minha aliança com vocês e com os seus futuros descendentes,
10 e com todo ser vivo que está com vocês: as aves, os rebanhos domésticos e os animais selvagens, todos os que saíram da arca com vocês, todos os seres vivos da terra.
11 Estabeleço uma aliança com vocês: Nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio; nunca mais haverá dilúvio para destruir a terra”.
12 E Deus prosseguiu: “Este é o sinal da aliança que estou fazendo entre mim e vocês e com todos os seres vivos que estão com vocês, para todas as gerações futuras:
13 o meu arco que coloquei nas nuvens. Será o sinal da minha aliança com a terra.
14 Quando eu trouxer nuvens sobre a terra e nelas aparecer o arco-íris,
15 então me lembrarei da minha aliança com vocês e com os seres vivos de todas as espécies. Nunca mais as águas se tornarão um dilúvio para destruir toda forma de vida.
16 Toda vez que o arco-íris estiver nas nuvens, olharei para ele e me lembrarei da aliança eterna entre Deus e todos os seres vivos de todas as espécies que vivem na terra”.
17 Concluindo, disse Deus a Noé: “Esse é o sinal da aliança que estabeleci entre mim e toda forma de vida que há sobre a terra”.

Gênesis 9:8-17

O exemplo da bandeira nacional

Se pensamos em uma bandeira, que representa um país, uma nação, vemos que ela é uma coisa tão séria que desrespeitar ela, é desrespeitar a nação. Não é à toa que quando os terroristas querem ofender os Estados Unidos da América, o que costumam fazer é queimar uma bandeira ou inverter ela.

Se focamos agora em “Quando” a bandeira de uma nação é criada, repararemos que ela é forjada na sua forma final apenas no fim da luta pela sua independência. Muitas vezes, uma bandeira precisa absorver duas facções que antes brigavam e sangravam o país. Outras vezes, ela trás as cores da nação original mas organizadas de uma forma distinta como no caso mencionado da bandeira dos Estados Unidos e a bandeira Inglesa.

A bandeira brasileira, por exemplo, toma elementos da natureza e dos seus ideais e os estampa juntos evocando a dimensão continental do “impávido colosso”.

Seja como for, uma bandeira visa unificar um conjunto de pessoas sob um mesmo ideal, forma administrativa, língua, território, etc.

Do mesmo jeito que a bandeira é geralmente uma das últimas coisas forjadas na nova nação, é ela também a última a ser arrancada quando já não sobra mais nada de uma nação derrotada na guerra. Por exemplo, quando os russos (que naquela época lutavam junto com os ingleses, os americanos e os franceses contra a Alemanha Nazista) entraram em Berlim em maio de 1945, a coisa que simboliza a queda da Alemanha de Hitler é a subida até o topo do Reishtag (O pseudo parlamento alemão de 1933 a 1945) por alguns soldados russos para arrancarem a bandeira. Com essa eliminação daquela bandeira específica se anunciava a derrota total da Alemanha Nazista sem deixar lugar a dúvidas a diferença das dúvidas que ficaram na Primeira Guerra Mundial e que fez possível a realização da loucura da Segunda Guerra Mundial.

Os símbolos no antigo testamento

No antigo testamento existem vários símbolos que marcam de forma decisiva o povo de Deus em todos seus estágios. Podemos lembrar de alguns altares ou pedras colocados em diversos locais cujo significado era repetido de geração em geração como forma de solidificar a narrativa necessária para a criação do povo.

Eliminar ou remover um desses símbolos é, em muitas formas, agredir o povo já que a identidade dele tem que ser buscada nesses marcos históricos.

Tanto é assim que povos fora da Bíblia sucumbiram, mas seus símbolos continuam a nos falar das suas crenças, seus ideias e suas práticas. Pode ser que não concordemos com esse conjunto de coisas, mas entendemos – mesmo após essa civilização não estar mais entre a gente – que há ali um vórtice de conceitos que se amalgamaram há muitos milênios é que fazemos bem em manter. Seja como fonte de conhecimento universal, como alertas de rumos sociais mal tomados ou apenas por respeito a uma civilização que já se foi.

Um exemplo deste tipo de desacato histórico aconteceu em 2015 quando representantes do Estado Islâmico destruíram várias estátuas do tempo assírio e acadiano que estavam no museu de Mosul por considera-las idólatras. O prejuízo à arqueologia e à história universal foi irreparável e o que sobreviveu foi uma amostra da tolice à que o extremismo religioso nos pode levar.

Mas há um símbolo no antigo testamento que não é feito por mãos humanas. Ele não nos pertence, nos foi concedido como um recordatório, um memorial. Ele está cheio de um significado que lhe é único e por isso é necessário, de tempos em tempos, revisitar ele. Trata-se do arco-iris.

É bastante óbvio que sabemos que o arco-íris é um efeito ótico e meteorológico em que a luz do sol é separada nas cores que compõem seu espectro quando esta brilha sobre as gotícula de água suspensas no ar. Porém, se aplicado ao arco-íris o mesmo conjunto de conceitos do que se aplica a uma bandeira que – descrita apenas desde uma perspectiva física – não passaria de um pano pintado com algumas figuras.

A necessidade viceral de redefinir o símbolo

Existe no ser humano comum a necessidade profunda de quebrar com o padrão estabelecido. Isso não é de todo ruim. Se assim não fosse, nunca tivéssemos ido à lua, ou teríamos tido vacinas, ou vencido a pólio, ou nos apropriado dos antibióticos nem extendido seu potencial. Se não tivéssemos quebrado com o status-quo nunca teríamos inventado a imprensa ou atravessado o oceano ou construído estradas nem castelos, nem casas, nem teríamos agricultura nem sairíamos das cavernas.

Quando vemos a luta sem quartel que está ocorrendo em que um símbolo está sendo esvaziado de seu conteúdo original, precisamos nos atentar de que “Um símbolo nunca é apenas um símbolo” e de que toda vez que um símbolo é atacado o que se ataca não é seu significado mas aqueles que lhe dão significado.

Toda vez que um símbolo é esvaziado, o único propósito é o de preenche-lo com um novo significado. Desta forma, se ele representa uma outra coisa do que seu sentido original, ele comunica uma outra coisa, mas como as duas coisas comunicadas andam juntas por um tempo o que se obtém é na realidade confusão que é – no final das contas – o que se procura.

O arco-íris, além de ser um símbolo outorgado e não um construído, representa uma nova aliança em um recomeço da criação de Deus. Não apenas isto, mas nele há uma garantia implícita de que o mundo nunca mais será destruído por água. E nesse sentido, quando falamos de mundo, não falamos apenas da Terra como planeta, mas de toda forma de vida. Por isso o texto bíblico diz “Nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio”

É por isso que o símbolo é universal atingindo a criação inteira e outorgado pelo seu criador. É um símbolo do dador de vida para toda forma de vida.

Quais são as razões para a existência de um memorial tão imponente?

O arco-íris é preenchido com seu conceito divino, apenas depois do dilúvio. Ou seja, o efeito visual já existia já que ele aparece em cachoeiras, géiseres, etc. Mas o seu significado como registrado na escritura só lhe foi dado após o dilúvio.

Esse dilúvio veio por qual razão? Bem, exatamente por situações muito parecidas às que estamos vivendo: a maldade e a depravação do ser humano tinham chegado a tal nível que o Criador “se arrependeu” de ter criado o homem.

Poucas vezes aparece está expressão “Deus se arrependeu” no registro bíblico. Indica apenas que o caminho que a criação de Deus tinha tomado, havia passado de todos os seus limites e o Criador precisa intervir de forma decisiva no rumo.

Toda vez que Deus re-cria sua criação o faz com graça e misericórdia, mas também se mostrando todo-poderoso. Vemos isso em Adão e Eva em que depois de expulsos do jardim eles foram cuidados por Deus. Vemos isso em Noé e o dilúvio. Também o vemos na escolha de Abrão. No cuidado de José para preservar o seu povo escolhido.

Se continuamos a história do povo escolhido, vemos essa mesma atitude de re-criação em não abandonar o povo quando eles quiseram ter um rei “como as outras nações” e também em levantar profetas e líderes durante o tempo do exílio que conduziriam seu povo de novo ao trilho do propósito original.

Apesar de todas as desgraças que o ser humano aprontou nesse interregno, Deus manteve fiel sua palavra de não destruir o mundo novamente. Muito pelo contrário, ele se apegou ao seu propósito pois até o silêncio profético entre Malaquias e João o Batista fala fortemente do propósito divino que nem um preludio fala de um evento maior que está por vir.

Mas por que, então, tão veemente ataque?

Voltando às razões da significação outorgada ao arco-íris no livro de Gênesis, vemos que é o final da intervenção de Deus nos rumos da sua criação.

O que molesta o ser humano é a existência de um Deus real, Criador, Eterno, Todo-poderoso que intervêm na história quando julga que o ser humano e suas escolhas estão levando sua criação (que nunca deixa de ser sua) por caminhos que conduzem à destruição.

Molesta tanto, que o ser humano comum se vê na necessidade de mudar os marcos antigos porque falam – de forma gritante – de um Deus amoroso que mantêm sua fidelidade aos seus propósitos.

Este Deus é molesto pois lhe fala de dentro, de um lugar onde não pode ser arrancado. Lhe fala a partir do cerne da sua consciência que lhe acusa enquanto estiver com alguma vida. Logo, tentando apagar o símbolo de graça, amor, e intervenção, pretende-se apagar (talvez de forma inconsciente) uma voz que lhe chama para o seu Criador.

A Igreja, em suas mais diversas manifestações, faz bem em mostrar o rumo certo. Faz bem em manter bem claro o ideal. Acerta ao defender os símbolos originais e seus conteúdos.

Então como combinar o amor cristão com a mensagem de amor? Que amor é esse que não para na aceitação ou na tolerância? Não são estes valores altruístas cristãos?

Não vamos entrar aqui nessas questões por ser o tempo limitado. Mas baste apenas dizer que tolerância e aceitação ficam aquém da proposta bíblica assim como o altruísmo. São três valores injetados na proposta cristã para fazê-la palatável a quem não quer se submeter ao Senhorio do Rei, Jesus.

A proposta de Jesus é o amor. Mas já o era desde o Antigo Testamento.

Uma das passagens mais conhecidas é a de Mateus 22:34-40 em que Jesus é interrogado capciosamente pelos Fariseus sobre qual é o maior dos mandamentos. A resposta de Jesus é dividida em duas partes bem conhecidas: “Amaras ao Senhor teu Deus de todo teu coração, de toda tua alma e de todo teu entendimento” e “Amaras ao teu próximo como a ti mesmo” encerrando com “disto depende a Lei e os Profetas”.

Esse “amor” do qual Jesus fala não tem a ver com passar a mão por cima do pecado mas também não tem a ver com apedrejar o pecador. Jesus mesmo é o exemplo de que o caminho do amor é bem mais profundo e comprometido com a pessoa. O texto que ele usa para responder aos Fariseus é o de Levítico 19:18. O texto imediatamente anterior encerra o que – ao meu ver – é uma das melhores definições do que é o amor comunitário e de que tipo de amor o mundo está precisando hoje. Esse texto diz assim:

17 Não odiarás a teu irmão no teu coração; não deixarás de repreender o teu próximo, e por causa dele não sofrerás pecado. 18 Não te vingarás nem guardarás irá contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor

Levítico 19:17-18

Morando em uma casa remendada.

Ninguém quer morar em uma casa cheia de remendos. O processo é simples, uma goteira aqui, uma rachadura acolá, um muro com defeito, enfim em algum momento o remendo, o conserto se faz necessário.

Mas ninguém quer que o remendo seja visto. Geralmente gastamos muito com a estética final da casa. O remendo é então sempre feito de forma tal que possamos -em algum momento- cobrir ele de tal forma que pareça que a casa nunca teve rachaduras.

Na vida pessoal também é assim. Não queremos que ninguém perceba nossos remendos. Basicamente queremos aparentar perfeição e não erros estruturais, rachaduras no caráter, ou simples imperfeições goteiras na vida espiritual.

Almejar ser como Deus pode ser coisa boa, aparentar a perfeição dele nem tanto.

Acontece que na nossa vida, os reparos estruturais (os essenciais) apenas podem ser feitos pelo próprio criador. É claro que em se tratando do criador, o reparo dele vai ser o melhor de todos os que possam ser feitos.

Mas cá entre nós, se o reparo é uma ação de Deus, não seria interessante que seja visto? Não é por acaso fruto da sua graça? Não é ali justamente que reside sua gloria em mostrar que é possível restaurar o caído? Não é exatamente isso que o mundo precisa ver? A ação de Deus restaurando o que o Pecado tem estragado?

Então, talvez seja melhor morar em uma casa remendada pelo Senhor que uma construída pela gente apenas para inglês ver.

Confissão, arrependimento, culpa e remorso

Dizem – acho que brincando – que uma religião é uma crença que te ajuda a tirar a culpa que uma outra religião colocou.

Brincadeiras à parte, é comum no meio cristão confundirmos culpa com remorso, remorso com arrependimento, arrependimento com confissão e confissão com coisa do capeta. Em algumas situações isso é perfeitamente compreensível, já que mais de mil anos de obrigatoriedade confessional nos colocou do outro lado do tatame. Mas vamos separar os grãozinhos e tentar melhor entender essa questão.

Remorso é uma inquietação, um estado de abatimento. Pode indicar culpa mas também apenas medo de ser pego. Sentir remorso não é sinal de saúde espiritual mas falta de remorso pode ser um mau sinal.

A culpa indica responsabilidade por um ato feito ou por uma omissão que causou dano a outrem. Ela pode ser real ou não. Pode ser sentida ou não. Pode ser objetiva ou não. Seja como for, culpa mal tratada é um desastre já que ela acaba condicionando pensamentos e condutas que se ela não existisse seriam diferentes.

Nem o remorso nem a culpa podem ser o motivo de uma pessoa seguir Jesus. Elas são, com certeza, o motivo para muitas pessoas terem uma religiosidade, se maltratarem, judiarem os outros e – com certeza – não serem felizes. Todavia, em Jesus as duas coisas encontram uma saída se bem que são apenas antessalas de uma coisa bem melhor. A culpa real, por exemplo, vai achar seu desague no arrependimento pois de outra forma apenas alimenta um remorso e estagna a vida da pessoa. Isso nos leva a pensar nas outras duas palavrinhas.

Pense em arrependimento. O que é? Temos a tendência de pensar que se trata de um sentimento. Inclusive achamos que sem um sentimento o arrependimento é impossível. É verdade que toda nossa vida de decisões passa pelo emocional e que quando ele adoece precisa ser cuidado como uma perna, a garganta, o coração…. mas a caminhada ao arrependimento não necessariamente principia pelo emocional, pode ser também por uma profunda convicção trazida por um novo conhecimento ou por ficar sabendo das consequências dos nosso atos. Ai sim não é estranho cair em prantos. Apenas friso que a ausência ou não do emotivo não é razão para medir o arrependimento. Então o que é?

Arrependimento é mudança de conduta. Não é apenas o sentir-se mal com alguma coisa feita ou deixada de fazer. Não se trata de sentir culpa sobre um assunto. Se trata de mudar uma conduta por ter tido uma inapropriada. É por exemplo aquele homem que deixa de trair, a mulher que deixa de cobiçar, o adolescente que deixa de mentir, a sogra que deixa de se meter, o comerciante que deixa de praticar o abuso nos preços, é o governante que passa a ser decente, a mãe que passa a respeitar a pessoa do filho, enfim, acho que já pegaram a ideia.

Mas nos falta um bloco que – ao meu ver – é o essencial. Sem este bloco a casa da mudança espiritual de cabeça não consegue se estabelecer. Sem este bloco o perdão não é liberado. Eu sei o que parece, mas me acompanhe um pouco mais.

Quando deixamos como raça entrar o pecado no mundo, ele se tornou senhor deste mundo. O lugar onde ele mais reina, é no coração do homem cegando-o para toda realidade espiritual. Tudo nesta criação caída conspira contra a vida espiritual que Deus nos quer dar. É por isso que a vitória da cruz de Jesus é tão cosmologicamente impactante pois subverte a ordem estabelecida pelo pecado.

Nesse sentido há um bastião a ser derrubado: o orgulho humano. Nada contra o homem ser seguro de si. Mas não seguro apenas em si mesmo ou por seus próprios meios. É claro que o ser humano é capaz de chegar muito longe alicerçado em si mesmo, tem o espirito do eterno nele por enquanto, então vai chegar longe. Mas para atingir a eternidade, a porta de entrada é a morte. O ensaio da morte é a confissão.

O arrependimento pode até ser conveniente. O remorso pode até ser de alguma forma benéfico impedindo novas condutas erradas. A culpa pode levar a pessoa ser e se sentir melhor em um circulo virtuoso, mas apenas a confissão libera o perdão. Apenas a confissão derruba o ser humano eliminando o pequeno rei que mora no seu coração.

Confessar nada mais é do que concordar com a opinião que Deus tem sobre nossos pensamentos, crenças, condutas, caminhos, etc. É descobrir que Deus é verdadeiro até na opinião que ele tem de nós. É reconhecer que todo homem é mentiroso. É se render perante a torrentosa graça dele.

O perdão de Deus para a vida do homem individual (e com isso a graça renovadora dele na vida da pessoa) vem não a partir do remorso ou da culpa e nem sequer do arrependimento. Vem a partir da confissão. Não interessa se você sente ou não que uma coisa condenada na Bíblia é pecado. Apenas confesse isso. Deixe isso agir. Com certeza se isso que a Bíblia condena (de forma específica, genérica ou apenas como exemplo) faz parte da sua conduta, a sua consciência sera renovada, seu espirito será capacitado para um arrependimento; isto é, para uma mudança de raiz do seu agir. Ai sim, é bem provável que chore e se lamente por anos viver em vaidade longe do Senhor.

Com isso em mente, releia 1 João 1:9. Se confessarmos … ele perdoa. Apenas isso. Pecado confessado, pecado perdoado. O resto é consequência…

1 João 18 Se declaramos que não temos pecado algum enganamos a nós mesmos, 
e a verdade não está em nós. 9 Se confessarmos os nossos pecados, 
Ele é fiel e justo para nos perdoar todos os pecados e nos purificar 
de qualquer injustiça10 Se afirmarmos que não temos cometido pecado, 
nós o fazemos mentiroso, e sua Palavra não está em nós.

 

Santidade: Uma Pratica de Vida

A santidade não é simplesmente uma ideia filosófica, é uma prática de vida. Ela é uma mudança tão radical na maneira de viver do homem, que Cristo é magnificado. Significa viver de forma tão parecida com Cristo que as pessoas podem até ser confundidas com Ele. Se a santidade que você está vivendo não mudar as coisas mais práticas e simples do seu dia a dia, você enganará a si mesmo com superficialidades.

Uma das práticas da santidade é a humildade. Para querer aprender e buscar o conhecimento, nós precisamos ter sede de aprender a Palavra.

A submissão também é uma das práticas da santidade. Um cristão que vive santidade é aquele que aprende e pratica a submissão.

Se realmente você entende santidade como uma vida fora dos padrões do mundo terá, então, que dar atenção à questão da submissão. Alguns rotulam santidade como somente se abster da prostituição e da idolatria e por isso, mesmo não se prostituindo nem praticando a idolatria, continuam sendo pedra de tropeço para a conversão de seus familiares e desagradando a Deus.

Mas o que é submissão? De acordo com o dicionário bíblico, submissão é um termo militar grego que significa “organizar [divisões de tropa] numa forma militar sob o comando de um líder”. Em uso não militar, era “uma atitude voluntária de ceder, cooperar, assumir responsabilidade, e levar uma carga”. Em palavras simples, submissão é obediência. Todo aquele que nasce de novo deve aprender o “abecedário” do cristão, que é a obediência.

Em primeiro lugar devemos obediência a Deus, nosso Pai e Senhor. Não existe vida cristã sem obediência a Deus, isso é tão óbvio quanto a cor do cavalo branco de Napoleão. Em Atos 5.29, Pedro declara: É mais importante obedecer a Deus do que aos homens. Mas você não pode se esquecer que a obediência a Deus está intimamente ligada à obediência aos seus pais e líderes. O apóstolo Pedro fala sobre essa relação entre a obediência a Deus e aos pais e líderes em sua primeira epístola, veja este versículo: “Sujeitai-vos a toda autoridade humana por amor do Senhor” (1 Pedro 2.13a)

Encorajo você a ler toda a epístola depois. Se a submissão aos líderes é uma ordem de Deus, eu só obedecerei a Deus se eu estiver me submetendo aos meus líderes. Seus primeiros líderes são seus pais. Depois de Deus eles são seus principais líderes e a eles você deve obediência. A única exceção que existe para não obedecer aos seus pais e líderes é se eles o mandarem pecar, pois desse jeito você violará a obediência a Deus, fora isso, obedeça sempre.

Por que ser submisso? Essa é a vontade de Deus e ela é sempre boa, perfeita e agradável. Fazendo o bem, sendo obedientes as autoridades, você cala as pessoas que depõem contra os cristãos. O nome de Deus muitas vezes é blasfemado por causa de pessoas que se dizem cristãs, mas estão sempre envolvidas em rebelião e outras condutas contrárias à Palavra. Alguns ainda não experimentaram a conversão de seus familiares, pois, mesmo sendo assíduos à reunião da comunidade, não são obedientes dentro de casa e dessa forma, fazem com que seus familiares blasfemem contra o nome de Deus.

A liberdade que temos é para o serviço de Deus e não para quebrar regras. Um dos exemplos que temos de liberdade mal entendida e mal expressada é o movimento hippie. Eles pregavam uma liberdade destrutiva, que era mais uma desculpa para a insubmissão do que a verdadeira liberdade.

Comece a mudança hoje mesmo em sua casa, com atitudes simples como praticar a honra. Honrar é reconhecer a dignidade e posição que seus pais têm sobre a sua vida. Valorize os seus pais, não somente com palavras, mas com atitudes. Pare de depreciar e menosprezar sua família para outras pessoas. Já ouvi muitos jovens falando mal de sua família e de seus pais, e isso é um comportamento que desagrada a Deus. Nenhuma família é perfeita, mas toda família tem valor.

Você verá a luz de Deus entrar na sua casa quando você começar a praticar a submissão. A atitude bíblica de submissão trará credibilidade para sua vida e sua mensagem. Enquanto na sua casa as pessoas não virem mudança nas suas atitudes, suas palavras serão vazias de credibilidade e unção.
Guarde em seu coração: A santidade verdadeira o levará a ser um exemplo até mesmo daqueles que já deram mau exemplo!

Prolegômeno à Santificação

1959255_10151998451511577_6781849145644319369_nEm princípio, uma definição geral para a ideia que denominamos de santidade cabe como meta inicial. Santidade (palavra hebraica, qadosh), faz referência à “absoluta alteridade de Deus”; é a linha divisória dita radical que nos separa (nós profanos) da divindade. É dessa conceituação que utilizarei para o raciocínio abaixo.

            A santidade nos diz acerca de…, aponta para alguém que não somos nós. Refere-se àquele que é o “totalmente outro” e não compartilha plenamente dessa glória com a humanidade. Mas lembremo-nos que somos santificados. Sua extensão, a santificação, faz menção a um ato ou processo, um meio de fruição contínua entre Deus e a humanidade. É aqui que nos encaixamos no plano divino em Cristo e somos atingidos sorrateiramente, como numa piscadela.

            Jesus não disse nada explicitamente sobre a santificação, mas disse sobre o santificador. Sempre associo tal ação ao Espírito e lembro-me sempre da grande perícope no evangelho de João 14-16. Ali, o Paracletos é reconhecido e autenticado por Jesus como “Espírito da verdade” (14. 16-17); no verso 26, como o “Espírito que é Santo”; em 15. 26-27 está associado à verdade e tem como função dar testemunho de Jesus; em 16. 7-11, o Espírito é responsável em estabelecer no mundo a consciência de culpabilidade e nos guiar em toda a verdade (na verdade inteira) que Ele ouviu do Pai, anunciando as coisas futuras dentro do presente (v. 13) e glorificando a Jesus em sua proclamação (v. 14-15).

            O ato de nossa santificação está relacionado inteiramente com essa pessoa prometida por Jesus e que vem/veio fazer morada em nós. Somos levados a um senso do sagrado, do transcendente, de sua santidade que nos inspira ao respeito, ao fascínio a ao terror (numinoso). Somos tocados pelo “sagrado”, mas não só tocados, somos inundados por esse Espírito que, consequentemente, nos religa ao Eterno. Ele nos traz profundo sentido de direção, entendimento, juízo, e uma percepção nova da vida. O teólogo Wunibald Muller diz, a esse respeito, que somos envolvidos por uma “camada protetora e criadora de sentido”, como a camada de ozônio que protege a Terra e toda vida que nela existe. Um sentido divinatório é criado a partir desse envolver, o que gera uma mudança em nossa faculdade de sentir e perceber, de direção e caminhar.

            Com tudo isso, quero dizer que, somos levados a pôr o Filho de Deus no centro de nossa vida e existência. Passamos a entender que santificação “se faz” no presente momento em que uma realidade, além da realidade presente, se abre à nossa consciência de “nova criação” em Cristo. Acontece uma interpelação e, a partir dela, nosso olhar já contempla uma vida sem Cristo, nossa união com Cristo e um caminho de santidade a percorrer até a glorificação.

            Assim, a santificação se mostra como um caminho a percorrer. Não apenas trilhar uma trilha moldada a partir da nossa antiga criação. Não somos levados a fazer, olhar, agir diferente de tudo o que fazíamos como velha criatura. Somos, sim, conduzidos com a lente do Espírito a interpretar a antiga realidade juntamente com a nova e, assim, obter a verdade. Isso nem sempre anula as antigas expectativas, os antigos comportamentos, as amizades, etc…; pode autenticar e potencializar coisas boas da nossa antiga caminhada. Aqui, no entanto, é a linha tênue entre o que é licito ou não fazer ou continuar a fazer.

            Essa linha tênue se revela que, em santificação também somos livres em Cristo. Essas duas realidades e verdades sobre o cristão não se opõem. A santificação aliada à liberdade para o qual Cristo nos libertou, novamente tem haver com uma consciência que me leva a “ser” e não a viver de ritual em ritual. Se tudo aquilo que entendemos por consciência e suas faculdades foi/é liberta das rédeas e não mais se deixa atar pelos laços da “lei”, das imposições frívolas ou, se já superamos o jogo do que é lícito ou não, finalmente nos livramos dos conflitos de uma realidade maligna e pecaminosa e passamos ao entendimento mais profundo e de propósito da santificação. Mais claro é dizer que não existe um “dogma” para a santificação.

            No entendimento de que em santificação somos livres e isso nos faz perceber a nova dimensão que nos foi outorgada, escolhemos seguir a Cristo. Não somente o seguimos, primeiro paulatinamente, mas abraçamos os desafios de Jesus. Nossa caminhada como peregrinos que somos nesse cosmos – mundo de sistemas malignos – passa a ser conduzido pelo Espírito como uma jornada espiritual. Essa jornada não é apenas mística, mas é conduzida pelo propósito do religare o céu com a terra. Dessa forma, a santificação do cristão ultrapassa questões morais, questões de superação e autoajuda, problemas pessoais e, até, aquela velha mania de alimentar exacerbadamente o ego. Um processo de kenosis (gr. auto esvaziamento) se instala e é iniciado. Essa jornada da santificação, reatando nossa humanidade e abalando as bases da nossa animosidade, nos transforma diariamente a partir das escolhas que passamos a fazer. E se, em santificação escolhemos seguir a Cristo, o caminho não tem muito haver só comigo, mas com Ele e sua jornada nessa terra. Deixamos de seguir a fundo os nossos anseios e utopias dando prioridade ao anseios de Jesus. Em suma, os sonhos, desejos, esforços e cansaços, as palpitações e pulsações do nosso coração, nossas aspirações e tudo o que passamos a ser como nova criação tem a finalidade de instaurar o Reino de Deus, o Reino de Cristo na terra.

            Portanto, o céu não é o nosso destino uma vez que ele se torna nossa missão. Nosso destino, enquanto cumprimos a missão, é conhecer a Cristo e ser conhecido por ele e ser achado nele. Seguir a Jesus é aliar forças com o Espírito em Sua missão e descaracterizar a “velha gente” em prol de “vestir a Cristo Jesus” todos os dias. Eis a santificação!

            Para finalizar esse prolegômeno e destacar a ação diária do Espirito juntamente com nossa consciência que se “veste” e adapta-se a Cristo, a santificação – esse processo pessoal e ativo – sempre me lembra de uma aproximação que idealizo ser coerente com os termos gregos usados para formular a doutrina da Trindade.

            Como criação à imagem e semelhança do Eterno (hommousion, feitos da mesma matéria e substância), somos declarados “muito bom”. A partir de nossa queda, aquilo que era “muito bom” tornou-se “depravado” (Lutero). Fomos corrompidos na nossa ousia (essência) e nossa hypostasis, aquilo que expressamos de nossa ousia, já não agradava a Deus e era mal aos seus olhos. Deus, em Cristo, mediante o Espírito Santo, veio até nós e se fez um de nós, encarnando nossa natureza para nos transformar. E não apenas nos transformar, mas nos dar novamente de sua ousia (extravagante substituição) e, desse modo, começarmos a expressar (hypostasis) Sua ousia no presente até o grande dia em que voltaremos a ser hommousion de Deus.

Rafael de Campos

A Santidade do Amor

A despeito de toda tradição popular que beatifica os que lideraram grandes instituições religiosas ou que contribuíram significativamente para algum setor da sociedade, nos despojemos um pouco, por ora nessa reflexão, dos quesitos que levaram homens e mulheres como Machado de Assis, Pelé, João Paulo II, Toquinho, Martin Luther King Jr. e Madre Tereza, dentre outros, à posição de “santidade” à eles conferida. A razão do meu pedido é a mais simples: quando gastamos tempo demais enaltecendo certos personagens da história, de alguma forma acabamos por nos colocar numa posição inferior, de incapacidade, de infinita pecaminosidade enquanto os exaltamos à inacessibilidade, inatingibilidade e os pintamos assentados nos tronos celestiais.

Certamente, o processo de santificação nada tem a ver com a capacidade de reproduzir os mesmos atos heroicos dos tais, nem mesmo assumir suas personalidades, que são por vezes tão distintas da nossa, ainda que sejam admiráveis e dignas de citação. Quando do Verbo escutamos “sejam perfeitos como o Pai celestial de vocês é perfeito” ou “sejam santos como eu sou santo” ou ainda “eu sou a luz do mundo… vocês são a luz do mundo”, estamos diante da declaração do que nos tornamos quando somos inseridos Nele e ao mesmo tempo é um convite amável ao desafio de viver na máxima intensidade, aquilo que o Verbo possui em sua essência mais profunda: o amor!

Sim, o Verbo é amar. Quem ama conhece Aquele a quem o Verbo disse “somos um”. Podemos dizer que ser santo, ou santificar-se, significa correr à passos largos na direção da prática do amor. Ser amor, fazer amor, pensar amor, manifestar amor! É ser encharcado pelo amor de tal maneira que, tudo o que tem haver com o amor tenha a ver conosco.

Isso de forma alguma anula quem somos, pelo contrário nos aperfeiçoa, nos completa, nos abrilhanta em tudo! Em amor não corremos o risco de nos perder, pelo contrário, no amor nos encontramos, nos desvendamos, nos calibramos, nos tornamos tal qual éramos nos pensamentos do Verbo quando recebemos Dele o “façamos o homem”. Nas intencionalidades do Criador, quanto mais somos amor mais perto estamos da vida, quanto mais nos distanciamos do amor, mais perto estamos da morte!

Todas as leis se resumem no “ame”, as parábolas do Verbo sempre ensinaram o amor por meio do perdão, do acolhimento, da compaixão, da empatia; as profecias mais severas eram pura expressão do amor que avisa as consequências da obediência ou desobediência ao Eterno, pois quem “avisa amigo (amoroso) é”; a decoração do universo é uma poesia de amor aos seres humanos, o instinto messiânico do animal/mãe para com o filhote é a impressão do amor sacrificial como pedagogia do amor Divino; o amor está no cheiro, no gosto, no tato, no tempo, no espaço, nas oportunidades, nas possibilidades, na vida e na morte! Você leu corretamente; a morte é expressão de amor visto que nela o imperfeito não está eternizado, o pecado não arraigado para sempre, a destruição não está imposta como ponto final na história, isso é amor!

Visto que assim é e assim se faz, amar é o caminho natural e coerente para todo aquele que compreendeu o sentido do universo, pra quem percebeu o propósito da vida! Amar é o dom que Deus dá a quem não se acorrenta pelo egoísmo, ódio, indiferença e violência; embora até estes em alguma instância sejam capazes de experimentar o amor que é fruto da graça e do aviso Divino do caminho a seguir.

Assim sendo, amar é o propósito de viver! Sem amor nenhuma boa decisão possui significado nem recebe estrutura capaz de se sustentar no fogo da provação na avaliação das obras, com amor todas as boas decisões ganham tal sustentação! Em amor o suicídio de si mesmo pelo outro é heroico, sem amor ainda que entregue meu corpo para ser queimado não terá sido mais do que um sacrifício de tolo. Em amor toda oferta é bem vinda, sem amor toda entrega se torna vã e religiosamente vazia.

Santo é quem ama! Santificado está aquele que encarnou o amor nas múltiplas dimensões da existência. Não há maior amor ou santidade do que dar a vida pelos irmãos! Negar-se, substituir-se pelo outro por amor, escolher andar mais lentamente por estar carregando alguém nos ombros, interceder junto à uma autoridade por causas que não trazem benefícios a si mesmo, ajudar alguém oferecendo de si voluntariamente além daquilo que se podia sendo este alguém incapaz de lhe retribuir de alguma forma!

O verdadeiro santo não exalta a si mesmo pois o amor, que é a base de seu ser, só se interessa na promoção das qualidades do outro; tal ser amadurecido no amor não busca uma posição de status, poder, influência gananciosa, sua busca é por servir cada vez mais os de perto e os de longe, os amigos e os que se fazem seus inimigos, os fáceis e os difíceis, os cultos e os ignorantes; é uma vocação que não está condicionada ao tempo e ao espaço, é uma consciência que está iluminada pela eternidade!

Encerro aqui, dizendo que ser santo é amar, e que amar é possível a todos os homens que se submetem conscientemente ou por uma intuição da graça de Deus Àquele que essencialmente é amor. Santo não é aquele que a sociedade confere tal título, aliás o ente amoroso e santificado nem busca sair do anonimato de forma que nem mesmo sua mão direita sabe o que a esquerda está fazendo. Certamente por acidente, alguns santos foram registrados nos anais da história e suas trajetórias são bem conhecidas por todos. O fato é que maior do que os santos documentados, são os santos que estão gravados na memórias dos que por eles foram amados! Os santos aguardam a coroa da Justiça que não é fabricada por mãos artesanais humanas, mas sim por Aquele que supera os séculos e que sonda os corações! Santifiquemo-nos pois e transformemos o mundo das pessoas amando-as intensamente!

Santificação ou Santidade?

Gostaria de apresentar uma síntese, visto que, não posso compreender a extensão deste complexo processo e, todavia se minha capacidade de interpretação fosse mais eficiente, provavelmente ainda apresentaria uma elucidação imperfeita. Como mau interlocutor não tenho a pretensão de esclarecer dúvidas, mas apenas apresentar novos prismas. Não sou cientifico e acredito que isso possa excitar você caso também seja um  tarado existencial. Espero que não entenda minha reflexão como exageradamente filosófica, pois, a fiz para fins de edificação.

Acredito que a santidade é um processo de plenificação. No momento em que escrevo “plenificação”, meu corretor ortográfico não aceita a palavra, e entendo, quem sabe precocemente, que não se trata de insuficiência de expressão de nosso idioma, mas, de um dilema de nossa existência, o que nos deixa com poucos escapes interpretativos. A palavra pleno designa coisas que são por si só.

O sagrado trata de objetos ou pessoas  “coisadas” consideradas figuras místicas ou sacralizadas por instituições ou grupos. Já o santo é pleno, não instituído por pessoas ou tempos mas apenas pela vontade de Deus. Partindo destas pré-suposições seriamos obstinados e frustrados, pois realmente percebemos que na vida as coisas não funcionam bem assim, e, apesar disso, Deus não se esquece de sua criação e como gesto de amor se sacrifica “pagando” o preço de nos suportar para que sua vontade seja recebida.

Esta afirmação coloca em choque as bases da vida, visto que, agora que as coisas são plenas ainda vemos e vivenciamos as catástrofes (não apenas no sentido natural), mas das personalidades e das consciências humanas que persistem em se aprofundar na própria e deliberada estupidez gerando diversas crises reais.

Importante é não confundirmos realidades com circunstâncias, visto que as circunstancias são reações e a perspectiva de uma realidade plena precisa ser percebida. Para tanto é necessária uma sensibilidade capaz de nos desconjuntar em nossa interioridade mortificada plenificando nossa existência como reação ao tempo e à vida.

Agora pensamos em como engatinhar na plenitude, visto que o pleno (teoricamente) não admite processos de plenificação e a santidade é uma característica integral. Neste momento vejo apenas Cristo, o único ser integral, como um ponto de partida e de chegada. Para que eu seja integral devo abraçar meus princípios e entender que já fui – enquanto um filho de Deus – redimido pela cruz, santificado, e devo permanecer e crescer em consciência e pratica para que assim minha percepção enquanto perspectiva se torne gestora da minha vida para uma nova dimensionalidade (ou observação). Caminhar com integralidade demanda exposição de defeitos (como a única coisa da qual devemos nos gloriar). Não por crer que agora que vivemos para a liberdade, plenitude e santidade sejamos perfeitos – pois não é esta a perspectiva do evangelho – mas por desejar ser totalmente habitado pela plenitude de Deus mesmo com nossas  limitações (para que não nos gloriemos das obras e reconheçamos que somos fracos e fortalecidos pela graça).

Viver em plenitude é entender e procurar a verdadeira realidade, que é a do amor em lugares impossíveis aos nossos olhos, por entender que somos constantemente inundados por um Deus onipresente e onipotente, e que das suas indescritíveis características, a mais relevante que nos foi comunicada e pode ser vivida é o Amor. Vale ressaltar que para viver a santidade é necessário estruturalmente a fé em nossa composição, pois sem ela perdemos a perspectivas do pleno e do eterno. Outra observação válida é a de que as crises existenciais são certas, e não são elas que determinam o nível de envolvimento do ser humano com a plenitude, mas, como já dito, a fé e o amor são estes parâmetros, pois, a consciência em Cristo nem sempre nos eleva, mas, mantém a firme convicção na esperança da plenitude da qual participo.

Temos apenas verrugas de plenitude implantadas dentro do nosso ser, mas diante da existência entendo que qualquer porção é porção e que o grande na verdade é o verdadeiro.

Santificação é se apaixonar pela vida e pelas suas formas e essências, entender que em tudo Deus está, e como reação desta grande loucura aprender a amá-lo. Devemos recriar-nos e reconstruir-nos após os quebrantamentos, afim de simplesmente encontrar a essência de Deus. Que possamos ter uma fé independente do visível e das garantias, apegada ao eterno, não conhecido mas revelado.

Embora havendo tentado elucidar meu ponto de vista em relação ao tema, exponho como minha experiência diária as frustrações que sofro, pois, constantemente levo rasteiras enquanto me apego a esta perspectiva. Entendo que os elementos fé, amor, santidade, devem ser compreendidos e vivenciados. Deparamo-nos com a natureza pecaminosa administrando os nossos dias, nos consumindo pelos frutos da auto justificação, afundando as nossas perspectivas e, nestas horas, vejo que a santidade deve ser protagonizada por nossa consciência e a redenção deve ser a única ferramenta a permitir nossa permanência nesta caminhada. Como disse no inicio, a cruz deve ser o nosso ponto de partida, de condução e chegada, pois, embora a plenitude seja completa, ainda pode apenas ser habitada, e como não somos plenos, pela graça somos salvos.

Assim Santidade é uma simples perspectiva, ela nada mais é do que uma caminhada, e caminhada de consciência e fé em Jesus.

 

 

V.M.D Brito

Na penumbra da vida

Viajando pelo interior do Paraná, sentado numa poltrona confortável de um ônibus que cruzava paisagens encantadoras e exuberantes, verdadeiras obras de arte que pareciam pincelar a “tela” da janela com verdes de todos os tons, disputava minha atenção um filme no interior do veículo.  A história era um fato real. Um rapaz cego de nascença, convencido pela mulher que amava, se submeteu a uma cirurgia que pretensamente lhe daria o privilégio da visão. A promessa se tornou uma realidade temporária e este, que até então vivera no mundo da escuridão, começou a enxergar e imergir num mundo confuso de cores e imagens. Lidar com a visão se tornou algo interessante e curioso no enredo. Diferenciar entre fotos e objetos tridimensionais à distância era um enorme desafio, já que o cérebro precisava processar imagens com sentido de profundidade. A história ascendeu a picos de emoção e alegria e despencou numa angústia sem fim ao se deparar com a cruel realidade do retorno da ausência de luz.

A importância da visão foi representada no filme de forma clara e deu a chance de perceber que há uma vulnerabilidade explícita no processo de percepção da luz. As sombras que se interpõem entre o olhar e o ver são como nuvens carregadas que hora nos permitem vislumbrar formas e cores (nem sempre completamente compreendidos), hora nos bloqueia completamente a percepção. As coisas continuam lá, mas simplesmente as deixamos de enxergar. O olhar e o ver se distinguem plenamente quando um não corresponde mais ao outro. Vultos vazios se movimentam no escuro marcando espaços antes muito bem definidos.

Numa razão inversamente proporcional ao filme em questão, aquele que nasce vendo, pode terminar seus dias mais próximo de quem jamais viu.

O trânsito que flui da luz para as sombras parece ser o movimento inevitável do desgaste físico. Aquilo que antes era envolto em clareza e facilidades agora, a passos lentos, mas contínuos, entra pelas terras dificultosas das sombras. Lugar este que antes insistia em assumir o pseudônimo de “terra do nunca”; agora percebe que o que era um vigoroso “nunca”, perde suas fantasias se tornando cada vez mais o fatídico “sempre”. Envelhecer parece ser, entre outras coisas, o implacável processo minguante da percepção da luminosidade.

Na contra mão do tráfego inevitável, pelo qual viaja o expresso que carrega todos nós, está a proposta da vida cristã de vislumbres do divino. Neste projeto que convida ao mundo de percepções, o elemento essencial para a luz se apresenta como sendo a santificação. O ato da santidade traz consigo a recompensa da iluminação: “buscai a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor”. Visão e santidade têm tudo a ver na vida cristã e estão relacionados numa proporção paralela. Quanto mais santidade, mas percepção do divino.

Uma vez mais faz se a diferença entre olhar e enxergar. As realidades mais concretas da beleza da vida estão plenamente expostas diante de todos. Poucos são os que lavam seus olhos no colírio da santidade e assim contemplam o divino exuberante em sua multiforme exposição diante de nós. O antigo legislador já clamava em sua fome pela contemplação do divino. “Ninguém pode ver a minha face e viver” advertia a divindade que se revelava e se velava.

A construção da história culminou na expressão mais vívida do divino. O rosto queimado do peregrino afirmava: “quem vê a mim, vê ao Pai”. Mas como perceber o Pai numa figura tão humana? Só mesmo a santidade poderia providenciar tal visão.

Os anos se passam e o que permanece é o desafio de enxergar. Ver a Deus não parece ser somente uma questão relegada a um futuro escatológico que guarda sua percepção para o dia de amanhã. A ótica que se deslumbra na contemplação do divino se faz possível hoje. Ela é vulnerável, como todo processo de percepção da luz. Sua amplitude, sua clareza e sua qualidade são sempre processos circunstanciais dependentes da negação de si mesmo. Nesta via, sujeita a todas intempéries da existência humana, hora a luz perpassa por todos os lados de nosso órgão sensorial, hora ela se obscurece pelas muitas nuvens de nossos retrocessos.

Ver a Deus é um privilégio daqueles que são banhados pela luz da santidade. Para estes, as paisagens pitorescas de exposição da divindade podem ser percebidos até nos cantos mais “insignificantes” do quadro de cada dia. É tamanha sua beleza, que pouco a pouco ocupa todos espaços de nossa movimentação. Nas mais variadas formas, expressas em cores de tons tão distintos e sutis, cada pedaço da vida traz revelações inimagináveis da presença do divino. Ele está lá, às vezes estampado em cartazes quilométricos de dimensões imponentes; às vezes pontilhado em minúcias apresentadas estrategicamente em proporções milimétricas. Alguns o veem, outros tropeçam nele sem o perceber. Mas ao observador perspicaz, a recompensa é imediata. A cada vislumbre um encanto, a cada encanto um êxtase, a cada êxtase uma porção a mais de vida. Talvez a vida abundante seja isso – a capacidade de contemplar e se deliciar no divino no desenrolar de cada dia.

Ele está lá. Pena que muitos não o vejam. Quem tem olhos para ver, veja. Neste processo alguns desfrutam da promessa: Bem-aventurados os puros de coração, pois eles verão a Deus.

A diferença entre ver e não ver está no privilégio de se santificar. Isto é o que define quem vive a vida e quem simplesmente passa por ela.

Everson Spolaor