A relevância do pentateuco

Tenho a impressão de que o humanismo exacerbado e a ideia de que “esta é minha opinião” nos tem levado como sociedade à beira do precipício. Se bem é evidente que sempre nos podemos comparar com nações em pior condição, creio que o padrão deve ser superior, mesmo que seja considerado utópico. 

Em alguma forma, nossa situação é semelhante à retratada em Juízes 21:25. “Cada um fazia o que bem lhe parecia”. Se bem é evidente que o texto foi escrito após Israel ter rei – e por tanto seu legado jurídico já estava bem solidificado – o certo é que o sistema de juízes não tinha dado certo. 

A injustiça no Brasil é enorme assim como o senso de impunidade. A impressão que fica é que o crime compensa e se não compensa, é porque ainda não se achou a forma adequada de praticá-lo.  Crimes bárbaros e traumáticos para a sociedade, como o assassinato de Daniella Perez, não são apenas uma mancha para todo o esquema legal, mas também para a cristandade brasileira e para os evangélicos em particular por haver entre nós um conceito errado de graça como se fosse antagônica à Lei e não a justa complementação das exigências da mesma.

A compreensão e valorização do Antigo Testamento, e em particular do pentateuco, é essencial para uma acertada compreensão da graça  em suas formas mais singelas (graça que achamos ser limitada ao Novo Testamento apenas). De outra forma, o abismo existencial está aí para tragar nossa comunidade que de evangélica apenas lhe restará o nome.

De uma forma bem concreta (e considerada por muitos anacrônica) o melhor instrumento já estabelecido para valorizar estas e outras coisas semelhantes é a escola bíblica, já que é nela que há (ou deveria haver) um espaço para o diálogo e discussão destes assuntos. 

Única regra de fé e prática?

Conversando com o povo, percebo que quando falamos da “única regra de fé e prática” boa parte tanto de leigos quanto pastores tendem a pensar como um conjunto de regras a serem seguidas por meio das quais atingir a boa ventura do criador.

Deveríamos tê-la mais como um nível, que nem os dos pedreiros, que serve para estimar se a construção está seguindo um padrão certo. Não seja o caso de depois descobrir que duas vigas que deveriam trabalhar juntas estão em níveis diferentes colocando em risco a obra inteira.

Ter na Bíblica a única regra de fé e prática deveria ser o fator distintivo da igreja reformada e evangélica. Distintivo no sentido daquilo que nos distingue da Igreja Católica Apostólica e Romana em que além da Bíblia, outras fontes como a tradição, os credos e a autoridade papal são consideradas no mesmo patamar.

Sendo a única regra de e prática deveria distinguir-nos do povo neo-pentecostal não como se fossemos nós (evangélicos e/ou reformados) a última bolacha do pacote, mas como sendo ela a única tábua de salvação que lhes resta na hecatombe que eles têm provocado não apenas abandonando a arte da exegese como impedindo o povo de se aproximar sem intermediários ao Senhor da Bíblia.

Onde nos perdemos?

De toda a literatura Joanina o capítulo 4 do seu evangelho é o mais carregado de sarcasmo por parte da mulher e de firmeza por parte de Jesus. Geralmente confundimos firmeza com rigor, desprezo ou severidade e sarcasmo com ironia.

As colocações da mulher são sarcásticas refletindo, provavelmente, uma situação de dor e rejeição. No primeiro estágio vemos ela se escondendo da sociedade em que vivia (quem vai ao meio-dia no deserto tirar água de um poço? Apenas quem já foi vilipendiado de alguma forma e em repetidas ocasiões) Até o momento em que Jesus se revela à mulher, a linguagem agressiva dela e suas colocações são a constante.

Paralelamente, não encontramos em Jesus condescendência ou palavras politicamente corretas: O lugar de adoração é Jerusalém; e você vive em conflito constante consigo mesmo, com a sociedade e com o papel que lhe foi dado ao nascer. Em resumo é isso que Jesus, firmemente, lhe diz.

A mulher não está sendo apenas irônica; se possível fosse, ela arrancaria um pedaço de carne do seu interlocutor. Jesus se mantêm firme. Não chega nem perto de ser rude ou “estúpido” nas suas respostas, nem lhe falta educação. Ele é apenas firme atendendo à necessidade da mulher e não apenas ao seu interesse numa boa briga de rua.

O ponto de inflexão se dá quando Jesus coloca em realce a busca da mulher. Sendo mulher, samaritana, e com vários relacionamentos frustrados nas costas, ela continua sua busca pela verdade, a busca pelo Messias.

Diferente do homem no tanque de João 5, esta mulher estava em uma busca incessante da realização da promessa antiga. Não eram só palavras ou discursos. A vida dela estava em jogo.

Tal é assim que – ao Jesus se revelar – tudo muda no relato. A mulher que antes se escondera, agora ia atrás dos seus algozes sociais e muda tudo. Até o trajeto de Jesus muda e fica mais dois dias enquanto os samaritanos se convertiam. Nem só de pão viverá o homem, mas de toda transformação social que a pregação da verdade pode trazer.

Hoje a forma pública da igreja não passa de uma caricatura ultrajante de Jesus o Cristo. Negocia-se tudo apenas para agradar à sociedade. A culpa imposta pelo movimento feminista nos cega os olhos impedindo-nos ver a realidade de um Messias que restaura a imagem de Deus (homem e mulher) tal como era no inicio. Essa mesma culpa nos impede ver que antanho não foi assim: o inicio da igreja (na ressurreição do Messias) as testemunhas escolhidas eram as mulheres, a primeira igreja estabelecida na Europa foi sob os auspícios de uma mulher, o reconhecimento apostolar de Paulo em Romanos, era inicialmente para as mulheres, a proposta de Paulo em Efésios é de uma igreja sem divisões, enfim: esquecemos não apenas o propósito, mas também os meios e a herança.

Negamos-lhe assim o poder (dynamis) do evangelho (boas noticias) de transformar ( e transtornar às vezes ) sociedades inteiras já que isso é necessário se o Reino de Deus deve ser implantado. Sem o evangelho, não há possibilidade de justiça e deixamos a sociedade seguir seu rumo de idolatria em que apenas a ira de Deus pode ser manifestada.

Vias de fato, nos envergonhamos do evangelho que realmente salva a diferença do Cesar.

“Pode-se colocar o início do ano no aniversário de César, pois a divina providência trouxe à vida dos homens: paz, salvação, abolição de guerras. O dia do nascimento do deus foi para o mundo o início de boas notícias”


Uma inscrição feita na Ásia menor, em 9 a.C.

Não é à toa que Paulo inicia sua reflexão aos Romanos por ai.

A convergência dos tempos

Jesus não é nenhum plano alternativo ou coisa similar.

Todavia, pode se dizer que era necessário que isso ficasse de alguma forma claro além de toda dúvida razoável. 

Se a convocatória no antigo testamento era para o povo ser “luz para as nações” atraindo a si todas as nações, vemos no novo testamento que essa luz é o próprio Deus encarnado e que ele atrai para si todos os povos da terra.

Se no antigo testamento havia por causa de um só homem entrado o pecado no mundo, assim também no novo testamento a vida se manifesta a partir de um único ser humano.

Então, seguindo a ilustração da luz, no antigo testamento temos uma lente convergente apontando para o Messias que haveria de vir ao passo que no novo testamento, podemos imaginar uma lente divergente em que a luz de Deus volta a irradiar para todos os homens numa analogia do que acontecera com o primeiro casal.

Não há ponto mais alto na história do que o da encarnação. Até mesmo o da segunda vinda não será mais alto (ainda que seja mais contundente e inegável) já que é no Cristo que convergem todas as coisas criadas e eternas (Ef.1:10)

Acolhida transformadora

A liberdade com o conteúdo que o seu criador quer

“COMO é possível que ele queira ser policial!?” bradou Ernesto, “Olha só o passado que ele tem”.

Ele se estava referindo ao relato que estava sendo transmitido em que uma policial rodoviária federal contava sobre a vida de alguém chamado Biel. 

Ela tinha conhecido Biel numa abordagem por roubo. Assaltante a mão armada, violento, nada na vida do Biel parecia indicar que havia um bom caráter ou alguma coisa assim que condissesse com a ideia persistente  ” quero ser policial”

Certo dia esta policial chamada Pamela encontra o Biel num carro que – obviamente – tinha sido roubado. – “Não fui eu que roubei” disse Biel  à policial. Ela cumpriu com seu dever e o levou para a delegacia para atua-lo. Não foi pouca a surpresa dela quando reparou que ele era bem conhecido naquela delegacia. O coração dela (ou como ela mesmo disse: “o coração de mãe“) se abalou. Como era possível que alguém de tão curta idade já fosse tão conhecido numa delegacia?

Sob a premissa de “alguma coisa devo fazer por ele” começou a buscar um jeito de ajudar o Biel a se endireitar. Pensou em adoção até ou quem sabe uma interdição. Entrou em contato com vários policiais de diversas guarnições que ela conhecia: civil, militar, federal, rodoviária. Falou com assistentes sociais, promotor, juiz. Ela tinha que fazer alguma coisa.

Havia uma razão muito forte para Biel viver nessa contradição existencial: ele tinha sido estuprado quando pequeno. Quem sofre este tipo de violencia podem reagir de diversas formas: ostracismo, rebeldia, ódio, pavor, e outro sem fim que fogem ao propósito desta análise. Biel tinha ficado cheio de ódio pelo momento de impotência e submissão forçada. Mesmo tendo bons desejos, mesmo sabendo qual era um bom caminho para ele, não encontrara outra forma de expressão do que esse ódio mortal numa forma de devolutiva visceral para a sociedade que não o soube cuidar.

Na busca por proteger o Biel, Pamela junto com o promotor, a assistente social e o juiz chegaram à conclusão de que uma interdição poderia ser o apropriado. Com a papelada pronta para a interdição e em mãos a policial foi à procura do Biel.

Tarde demais. Biel tinha sido morto de forma violentíssima. Tinha apenas onze anos.


A atitude da Pamela é, sem lugar a dúvidas, aquela que mais faz falta na sociedade. A sociedade que nos tocou viver, está rapidamente se degradando para o ódio e a polarização. A incompreensão do outro – em plena época da hiper comunicação assistida por computador – roda solta amparada por um falso anonimato e uma pseudo-impunidade.

A coisa mais simples e legalmente correta a ser feita seria o de deixar o Biel crescer desse jeito entrando e saindo de diversas instituições até que o próprio crime tomasse conta dele ou se tornasse civilmente adulto para responder por algum crime e, então, trancafiar ele pelo maior tempo possível.

Só que Pamela, contrariando a ditadura do ódio, vá ao encontro do desvalido. Consegue perceber atrás dessa couraça de ódio e ressentimento um menininho carente, solitário, machucado com uma ânsia louca pela vida e com bons ideais mas apavorado, em pânico.

A estas alturas, os partidários de “bandido bom é bandido morto” já devem de me estar crucificando pois “uma vez bandido, bandido para sempre”. Vão me dizer que estou vitimizando o agressor mas isso não passa de uma simplificação absurda que apenas serve para alimentar mais a roda do ódio em que vivemos.

Por outro lado, a turma do “a culpa é da sociedade” já deve estar achando que eu penso desse jeito e culpo aos pais, à sociedade, ao governo, ao estado a Deus ao diabo por tudo o que de ruim acontece com a humanidade. Não se vista tão rápido que com certeza não vai querer me acompanhar no restante da viagem.


Algumas práticas que anteriormente eram crimes, hoje já não são mais e outras estão indo caminho a deixarem de ser crimes. A sociedade (por ser em maior números que os defensores da lei e da ordem) acaba se impondo mesmo que a escolha dela não seja a melhor ou a mais adequada a longo prazo. 

Veja o caso de uso de Cannabis. O porte para uso pessoal é uma evasão à regra de que todo tráfico de entorpecentes é crime. Há uma suavização perigosa em que se deixam as famílias lutando sozinhas com tão grande flagelo. E não me estou referindo ao uso medicinal ou ao uso recreativo após 24 anos. Me refiro ao uso desenfreado em crianças de todas as idades.

Um outro caso que deixou de ser crime e vá em vias de deixar de ser chamado de pecado é o adultério. Independente das razões que possam impelir uma pessoa a pular a cerca, antes era um crime passível de morte, de cadeia, de multa e agora não é nem sequer infração. Já já vai surgir alguém falando que é uma “virtude libertadora” ou coisa assim.

Ainda conservamos um pouco de decência nos assassinatos. Mas isso é porque pode afetar a qualquer um e a qualquer hora. Não é porque queremos – como sociedade organizada – seguir algum mandamento divino ou sequer porque desejemos construir coisas boas e virtuosas. Trata-se apenas de medo. É fácil descaracterizar o aborto como crime, ou o adultério como crime, ou o uso de entorpecentes como crime pois a chance de que isso passe sob o teto do legislador é bem baixa e se acontece, não é tão grave como a morte, já que ela vem para ficar permanentemente ao passo que os outros sempre cabe a chance esdrúxulamente hipotética de desfazer o mal perpetrado.


Pamela queria acolher o pequeno criminoso. Os atos que ele praticara não se qualificam como atividades extracurriculares do ensino fundamental ou tarefa de casa da escola bíblica da igreja local. Todavia, enxergar alí outra coisa do que um microcosmos da realidade humana é de uma brutalidade e desconhecimento terríveis. 

Há em cada um de nós três necessidades básicas: Aprovação, Aceitação, Apreço. (Coloquei as três com A para facilitar a memorização). Em condições ideais, uma família (e por extensão a sociedade à que pertence) irá entregar essas três coisas para seus participantes em especial os mais novos.

É importante mencionarmos isso, porque a palavra acolhida para muitas pessoas acaba soando como se fosse sinônimo de uma das três ou das três quando se trata de outro termo que precisa ser explorado.

Se bem as três características estão amarradas, não são equivalentes nem uma substitui a outra. Por exemplo, uma filha que sempre foi aprovada por ter notas altas na escola e que é aceita devido às amizades que tem, mas que nunca recebe um sinal de apreço do pai, cresce com uma ideia bem distorcida de si e – por conseguinte – da relação com os outros, em especial os homens. É uma forma complexa de dizer para a menina: “Você serve apenas para produção. Não para ser amada”

Pamela escolheu o caminho difícil: acolher o pequeno apesar e por causa da sua vida de criminoso. A turma do “bandido bom é bandido morto” não consegue enxergar o individuo com suas mazelas. Me parece que é uma opção por medo e não por razão. Já a turma do “a culpa é da sociedade” também não consegue enxergar o individuo com suas responsabilidades. A vergonha da própria incapacidade de decidir pelo certo torna este grupo num alvo fácil do “divide e vencerás” ou de “nivelar pelo mais baixo”.

Pamela escolheu o caminho complicado da acolhida que não tem a ver com aprovação, não tem a ver com aceitação não tem a ver com apreço mas tem muito a ver com o amor sacrificial esperançoso. É uma forma bem prática de reconhecer algumas coisas: 1) Sim, a sociedade na sua forma mais básica (a familia) falhou em te proteger, Biel. 2) Sim, você tem um propósito bom, Biel. 3) Sim, do jeito que você está fazendo vai continuar a se machucar e machucar os outros, Biel. 4) Sim, a vida pode ser terrivelmente dura mas estou aqui para te ajudar, Biel.

Pamela não estava aceitando os crimes do Biel, estava aceitando o Biel.

Pamela não estava aprovando as decisões do Biel, estava aprovando os sonhos e futuras decisões do Biel.

Pamela não estava apreciando esse Biel que machucava os outros mas sim aquele que fora machucado no seu ser mais íntimo e fraco.


A acolhida cristã deve ter esses componentes em que se permita a um individuo fitar os olhos em Cristo – apesar de suas decisões e desejos errados – e o fortaleça nessa caminhada. 

A acolhida cristã estabelece um padrão elevado e responsável de conduta pessoal sem deixar de observar que “o pecado que tão fortemente nos assedia” faz um estrago tremendo na imagem do ser humano. Há um delicado equilíbrio entre o “fui tentado” e “reconheço que cedi”. Isso é assim desde o Eden e não vai mudar até a finalização do estabelecimento do Reino.

A acolhida cristã não reduz o nível da vara para facilitar a entrada do pecador empedernido. Também não alarga a porta para que o camelo possa passar com toda sua carga. A acolhida cristã transita o estreito caminho que desvia o pecador da larga estrada que ele está levando elevando o nível da sua consciência e levando-o a um patamar até então desconhecido.

A acolhida cristã não se espelha na acolhida mundana em que não se chama mais o pecado de pecado por não ter a sociedade qualquer forma de solução para dito problema. A acolhida cristã passa pelo modelo de Jesus o Messias em que – por amor a esta sua criação – se aproxima dela em forma humana bem definida e de lá resgata os seus para poder levar “cativa o cativeiro” (Ef 4:8)

Finalmente, é necessário lembrar que todo pecado nada mais é do que uma expressão dos desejos mais viscerais do indivíduo. Isso se aplica à prática do adultério, à prática do assassinato, à prática da homossexualidade, à prática do estupro, à prática do roubo, à prática do abandono da congregação mas também se aplica ao que anda no coração do indivíduo sem por isso chegar alguma vez a ser praticado e é ali onde se desmancha toda a ideia de uma acolhida para continuar a prática do pecado sem peso na consciência, pois é lá – no fundo do mais recôndito da nossa identidade – que Jesus, o Cristo quer ser Rei.  Fazer qualquer outra coisa e continuar a chamar de “cristianismo” é um deboche da fé cristã já que na fé cristã o alvo maior é a restauração do plano original e é para lá que nós vamos.

Junte-se a nós: Acolha para transformar.

Dignidade venezuelana

Me perguntaram – teoricamente – como seria desenvolver o engajamento e o envolvimento da congregação local em algum projeto local. Em lugar de responder de forma hipotética, apresentei uma síntese do que está rondando minha cabeça esses dias e que compartilho com vocês:


O desafio que tenho pela frente é o de descobrir e estabelecer qual o rumo que a congregação que pastoreio deveria tomar. Porém, dizer isso em primeira pessoa em um meio congregacionalista pode parecer auto-confiança excessiva.

Seja como for, não me posso subtrair de que são os meus olhos que vêm quase que diariamente os venezuelanos que vão chegando e ficando na nossa cidade. Como estrangeiro em terras tupiniquins, sei que nem sempre é fácil compreender como a sociedade brasileira funciona e muito menos como aproveitar esses ventos do alto-mar da diáspora.

Imagino pontualmente as mães e pais de filhos adolescentes que – havendo tido uma vida financeira avultada – agora se encontram à deriva faltando-lhes a orientação e achando na mendicância a única opção.

Trata-se, então, de mostrar o que meus olhos vêm e o que meu coração sente não apenas à minha congregação, mas a todas aquelas outras que possam participar por não se tratar apenas de levar um prato de comida.

Precisamos de assistentes sociais, professores, contadores e qualquer outro profissional com os quais possamos construir e implementar um plano a longo prazo que não seja só um paliativo mais e sim uma convergência multidisciplinar cristã.

Sobre a vida do líder e o líder na vida.

Observo que frequentemente há uma distância entre aquilo que falamos desde o púlpito e aquilo que o objeto da pregação: a vida de Jesus nas nossas vidas.

Esta não é uma observação apenas nos colegas de ministério, mas sim um olhar constante sobre minha própria caminhada e o cuidado que devo tomar para não ficar tão longe assim do nosso Mestre. De fato, o que mais nos falta não são sermões sobre como deve ser mas sim exemplos de como de fato é. Com suas agruras e desvantagens.

Uma das pessoas que mais me impactou na vida ministerial chama-se Carlos. O jeito calmo de dirigir-se aos membros da sua congregação e como se conduzia na gestão da coisa pública não eram muito diferentes do que ele fazia na vida particular. Era corriqueiro ver ele prestando contas para esposa da mesma forma que o fazia para com a igreja local.

Ele e eu éramos de visões teológicas distintas, mas isso não o impedia de se aproximar e iniciar o diálogo ou de ceder o púlpito, ou inclusive de deixar alguns assuntos sob meu cuidado.

A forma gentil em que conduzia o diálogo em questões candentes impactava por sua firmeza e lisura enquanto manava dele uma doçura ímpar no respeito pelo seu interlocutor.

Certamente nos faltam mais “Carlos” no ministério. Pessoas que vivam o que pregam, preguem o que vivam (com seus lutos e lutas) e se apeguem apenas a Jesus nas questões mais críticas.

O rei esquecido

É comum em nossa cultura que — com a proximidade das festas natalinas — as nossas mentes individuais voltem seu foco para pensar em reuniões familiares, presentes, encontros, comidas…

Lembro de pequeno a gostosa sensação de leve ansiedade que produziam os dias que antecediam à celebração do natal. Ver os presentes que nossos pais compraram e colocado ao pé da árvore que tínhamos cortado de algum bosque de pinheiros não muito longe com meu pai. Saíamos em algum veículo que ele pudesse arranjar, íamos até algum lugar onde houvessem muitos pinheiros, escolhíamos um galho bonito e o cortávamos. Depois o levávamos para casa e o colocávamos na casa para mais tarde colocarmos os adornos nele. O cheiro do pinheiro permeava a casa inteira.

Esse rito (que foi repetido por alguns anos quando eu era pequeno) marcava a chegada de um momento todo especial. Era obvio que conhecíamos o sentido do natal de cor e salteado. Tínhamos uma clara consciência de que celebrávamos a encarnação do Deus da eternidade em um ser humano limitado, mas as lembranças não são de cunho teológico e sim emotivo. Nada, no ano inteiro, tinha como concorrer com o natal. Nem sequer o dia dos reis (celebrado no Uruguai – pais de formação laica e liberal – no seis de janeiro) em que também se ganhava presentes, nem a virada de ano e nem o próprio aniversário. Nada, era tão almejado como o natal. Mesmo com a chegada da comercialização e a mercantilização das festas natalinas, nada concorria com essa sensação de aconchego, esperança, segurança, conexão, intimidade, liberdade, estabilidade e tantas outras coisas que a celebração do natal trazia para a gente.

O próprio jantar de natal (que era ao final das contas o ápice de todos esses dias de espera) era toda uma festa à parte. Lembro que minha mãe tomava o cuidado de comprar algumas coisas especiais meses antes. Quem vive lugares onde as estações são bem marcadas sabe haver algumas coisas que mudam radicalmente de preço e de disponibilidade com o passar dos meses ou – no caso de primavera para verão – de algumas semanas. Essas coisas que fariam parte do jantar, eram guardadas e reservadas para aquele único jantar. Nem sempre era um jantar muito farto já que as décadas de 70 e 80 não eram especialmente bem abastadas, mas sabíamos podermos esperar algo diferente.

Os anos foram passando e se alguém me pergunta hoje sobre alguma comida ou algum enfeite especifico colocado na árvore, ou se lembro de algum presente de forma específica lamentavelmente não consigo lembrar. Fiz o exercício de tentar lembrar de algum desses detalhes enquanto escrevia este texto, mas não consigo lembrar de nenhum.

Mas eu lembro da felicidade. Lembro dos rostos iluminados. Lembro da alegria das minhas irmãs, do sorriso dos meus pais. Lembro … de cada coisa boa.

Lentamente e de forma sorrateira, a amargura da vida, as iras, as raivas, os ódios foram se acumulando. Em algum momento o próprio Rei foi esquecido e totalmente abandonado e a festa nunca mais foi a mesma.


Meu desejo, do fundo do meu coração, é que neste natal, você, meu querido leitor, separe um momento para ver o que está ao seu alcance para impedir que o Rei da festa seja esquecido. De outra forma, mesmo levando o nome de Natal estaremos celebrando apenas o desterro dele do lugar de onde nunca poderia ter sido desterrado: nossa própria existência.

Um símbolo que precisa ser preservado.

O símbolo nunca é apenas um símbolo e por isso deve ser preservado.

Nos últimos tempos assistimos a uma tentativa de devassa de um dos maiores símbolos não apenas dos cristãos mas de todos aqueles que – de uma forma ou outra – aceitam o monoteísmo judaico como raiz e origem.

Em outras palavras, agredir um símbolo que unifica as três religiões monoteístas: O Judaísmo o Islamismo e o Cristianismo é – no final das contas – uma agressão não já ao monoteísmo mas sim ao Deus que estas representam.

Gênesis 9:13

8 Então disse Deus a Noé e a seus filhos, que estavam com ele:
9 “Vou estabelecer a minha aliança com vocês e com os seus futuros descendentes,
10 e com todo ser vivo que está com vocês: as aves, os rebanhos domésticos e os animais selvagens, todos os que saíram da arca com vocês, todos os seres vivos da terra.
11 Estabeleço uma aliança com vocês: Nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio; nunca mais haverá dilúvio para destruir a terra”.
12 E Deus prosseguiu: “Este é o sinal da aliança que estou fazendo entre mim e vocês e com todos os seres vivos que estão com vocês, para todas as gerações futuras:
13 o meu arco que coloquei nas nuvens. Será o sinal da minha aliança com a terra.
14 Quando eu trouxer nuvens sobre a terra e nelas aparecer o arco-íris,
15 então me lembrarei da minha aliança com vocês e com os seres vivos de todas as espécies. Nunca mais as águas se tornarão um dilúvio para destruir toda forma de vida.
16 Toda vez que o arco-íris estiver nas nuvens, olharei para ele e me lembrarei da aliança eterna entre Deus e todos os seres vivos de todas as espécies que vivem na terra”.
17 Concluindo, disse Deus a Noé: “Esse é o sinal da aliança que estabeleci entre mim e toda forma de vida que há sobre a terra”.

Gênesis 9:8-17

O exemplo da bandeira nacional

Se pensamos em uma bandeira, que representa um país, uma nação, vemos que ela é uma coisa tão séria que desrespeitar ela, é desrespeitar a nação. Não é à toa que quando os terroristas querem ofender os Estados Unidos da América, o que costumam fazer é queimar uma bandeira ou inverter ela.

Se focamos agora em “Quando” a bandeira de uma nação é criada, repararemos que ela é forjada na sua forma final apenas no fim da luta pela sua independência. Muitas vezes, uma bandeira precisa absorver duas facções que antes brigavam e sangravam o país. Outras vezes, ela trás as cores da nação original mas organizadas de uma forma distinta como no caso mencionado da bandeira dos Estados Unidos e a bandeira Inglesa.

A bandeira brasileira, por exemplo, toma elementos da natureza e dos seus ideais e os estampa juntos evocando a dimensão continental do “impávido colosso”.

Seja como for, uma bandeira visa unificar um conjunto de pessoas sob um mesmo ideal, forma administrativa, língua, território, etc.

Do mesmo jeito que a bandeira é geralmente uma das últimas coisas forjadas na nova nação, é ela também a última a ser arrancada quando já não sobra mais nada de uma nação derrotada na guerra. Por exemplo, quando os russos (que naquela época lutavam junto com os ingleses, os americanos e os franceses contra a Alemanha Nazista) entraram em Berlim em maio de 1945, a coisa que simboliza a queda da Alemanha de Hitler é a subida até o topo do Reishtag (O pseudo parlamento alemão de 1933 a 1945) por alguns soldados russos para arrancarem a bandeira. Com essa eliminação daquela bandeira específica se anunciava a derrota total da Alemanha Nazista sem deixar lugar a dúvidas a diferença das dúvidas que ficaram na Primeira Guerra Mundial e que fez possível a realização da loucura da Segunda Guerra Mundial.

Os símbolos no antigo testamento

No antigo testamento existem vários símbolos que marcam de forma decisiva o povo de Deus em todos seus estágios. Podemos lembrar de alguns altares ou pedras colocados em diversos locais cujo significado era repetido de geração em geração como forma de solidificar a narrativa necessária para a criação do povo.

Eliminar ou remover um desses símbolos é, em muitas formas, agredir o povo já que a identidade dele tem que ser buscada nesses marcos históricos.

Tanto é assim que povos fora da Bíblia sucumbiram, mas seus símbolos continuam a nos falar das suas crenças, seus ideias e suas práticas. Pode ser que não concordemos com esse conjunto de coisas, mas entendemos – mesmo após essa civilização não estar mais entre a gente – que há ali um vórtice de conceitos que se amalgamaram há muitos milênios é que fazemos bem em manter. Seja como fonte de conhecimento universal, como alertas de rumos sociais mal tomados ou apenas por respeito a uma civilização que já se foi.

Um exemplo deste tipo de desacato histórico aconteceu em 2015 quando representantes do Estado Islâmico destruíram várias estátuas do tempo assírio e acadiano que estavam no museu de Mosul por considera-las idólatras. O prejuízo à arqueologia e à história universal foi irreparável e o que sobreviveu foi uma amostra da tolice à que o extremismo religioso nos pode levar.

Mas há um símbolo no antigo testamento que não é feito por mãos humanas. Ele não nos pertence, nos foi concedido como um recordatório, um memorial. Ele está cheio de um significado que lhe é único e por isso é necessário, de tempos em tempos, revisitar ele. Trata-se do arco-iris.

É bastante óbvio que sabemos que o arco-íris é um efeito ótico e meteorológico em que a luz do sol é separada nas cores que compõem seu espectro quando esta brilha sobre as gotícula de água suspensas no ar. Porém, se aplicado ao arco-íris o mesmo conjunto de conceitos do que se aplica a uma bandeira que – descrita apenas desde uma perspectiva física – não passaria de um pano pintado com algumas figuras.

A necessidade viceral de redefinir o símbolo

Existe no ser humano comum a necessidade profunda de quebrar com o padrão estabelecido. Isso não é de todo ruim. Se assim não fosse, nunca tivéssemos ido à lua, ou teríamos tido vacinas, ou vencido a pólio, ou nos apropriado dos antibióticos nem extendido seu potencial. Se não tivéssemos quebrado com o status-quo nunca teríamos inventado a imprensa ou atravessado o oceano ou construído estradas nem castelos, nem casas, nem teríamos agricultura nem sairíamos das cavernas.

Quando vemos a luta sem quartel que está ocorrendo em que um símbolo está sendo esvaziado de seu conteúdo original, precisamos nos atentar de que “Um símbolo nunca é apenas um símbolo” e de que toda vez que um símbolo é atacado o que se ataca não é seu significado mas aqueles que lhe dão significado.

Toda vez que um símbolo é esvaziado, o único propósito é o de preenche-lo com um novo significado. Desta forma, se ele representa uma outra coisa do que seu sentido original, ele comunica uma outra coisa, mas como as duas coisas comunicadas andam juntas por um tempo o que se obtém é na realidade confusão que é – no final das contas – o que se procura.

O arco-íris, além de ser um símbolo outorgado e não um construído, representa uma nova aliança em um recomeço da criação de Deus. Não apenas isto, mas nele há uma garantia implícita de que o mundo nunca mais será destruído por água. E nesse sentido, quando falamos de mundo, não falamos apenas da Terra como planeta, mas de toda forma de vida. Por isso o texto bíblico diz “Nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio”

É por isso que o símbolo é universal atingindo a criação inteira e outorgado pelo seu criador. É um símbolo do dador de vida para toda forma de vida.

Quais são as razões para a existência de um memorial tão imponente?

O arco-íris é preenchido com seu conceito divino, apenas depois do dilúvio. Ou seja, o efeito visual já existia já que ele aparece em cachoeiras, géiseres, etc. Mas o seu significado como registrado na escritura só lhe foi dado após o dilúvio.

Esse dilúvio veio por qual razão? Bem, exatamente por situações muito parecidas às que estamos vivendo: a maldade e a depravação do ser humano tinham chegado a tal nível que o Criador “se arrependeu” de ter criado o homem.

Poucas vezes aparece está expressão “Deus se arrependeu” no registro bíblico. Indica apenas que o caminho que a criação de Deus tinha tomado, havia passado de todos os seus limites e o Criador precisa intervir de forma decisiva no rumo.

Toda vez que Deus re-cria sua criação o faz com graça e misericórdia, mas também se mostrando todo-poderoso. Vemos isso em Adão e Eva em que depois de expulsos do jardim eles foram cuidados por Deus. Vemos isso em Noé e o dilúvio. Também o vemos na escolha de Abrão. No cuidado de José para preservar o seu povo escolhido.

Se continuamos a história do povo escolhido, vemos essa mesma atitude de re-criação em não abandonar o povo quando eles quiseram ter um rei “como as outras nações” e também em levantar profetas e líderes durante o tempo do exílio que conduziriam seu povo de novo ao trilho do propósito original.

Apesar de todas as desgraças que o ser humano aprontou nesse interregno, Deus manteve fiel sua palavra de não destruir o mundo novamente. Muito pelo contrário, ele se apegou ao seu propósito pois até o silêncio profético entre Malaquias e João o Batista fala fortemente do propósito divino que nem um preludio fala de um evento maior que está por vir.

Mas por que, então, tão veemente ataque?

Voltando às razões da significação outorgada ao arco-íris no livro de Gênesis, vemos que é o final da intervenção de Deus nos rumos da sua criação.

O que molesta o ser humano é a existência de um Deus real, Criador, Eterno, Todo-poderoso que intervêm na história quando julga que o ser humano e suas escolhas estão levando sua criação (que nunca deixa de ser sua) por caminhos que conduzem à destruição.

Molesta tanto, que o ser humano comum se vê na necessidade de mudar os marcos antigos porque falam – de forma gritante – de um Deus amoroso que mantêm sua fidelidade aos seus propósitos.

Este Deus é molesto pois lhe fala de dentro, de um lugar onde não pode ser arrancado. Lhe fala a partir do cerne da sua consciência que lhe acusa enquanto estiver com alguma vida. Logo, tentando apagar o símbolo de graça, amor, e intervenção, pretende-se apagar (talvez de forma inconsciente) uma voz que lhe chama para o seu Criador.

A Igreja, em suas mais diversas manifestações, faz bem em mostrar o rumo certo. Faz bem em manter bem claro o ideal. Acerta ao defender os símbolos originais e seus conteúdos.

Então como combinar o amor cristão com a mensagem de amor? Que amor é esse que não para na aceitação ou na tolerância? Não são estes valores altruístas cristãos?

Não vamos entrar aqui nessas questões por ser o tempo limitado. Mas baste apenas dizer que tolerância e aceitação ficam aquém da proposta bíblica assim como o altruísmo. São três valores injetados na proposta cristã para fazê-la palatável a quem não quer se submeter ao Senhorio do Rei, Jesus.

A proposta de Jesus é o amor. Mas já o era desde o Antigo Testamento.

Uma das passagens mais conhecidas é a de Mateus 22:34-40 em que Jesus é interrogado capciosamente pelos Fariseus sobre qual é o maior dos mandamentos. A resposta de Jesus é dividida em duas partes bem conhecidas: “Amaras ao Senhor teu Deus de todo teu coração, de toda tua alma e de todo teu entendimento” e “Amaras ao teu próximo como a ti mesmo” encerrando com “disto depende a Lei e os Profetas”.

Esse “amor” do qual Jesus fala não tem a ver com passar a mão por cima do pecado mas também não tem a ver com apedrejar o pecador. Jesus mesmo é o exemplo de que o caminho do amor é bem mais profundo e comprometido com a pessoa. O texto que ele usa para responder aos Fariseus é o de Levítico 19:18. O texto imediatamente anterior encerra o que – ao meu ver – é uma das melhores definições do que é o amor comunitário e de que tipo de amor o mundo está precisando hoje. Esse texto diz assim:

17 Não odiarás a teu irmão no teu coração; não deixarás de repreender o teu próximo, e por causa dele não sofrerás pecado. 18 Não te vingarás nem guardarás irá contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor

Levítico 19:17-18

A morte como gatilho social

Estava escrevendo o material para uma aula esses dias e lembrei de um ditado: Há duas coisas das quais o homem não escapa: da morte e dos impostos. Refletindo sobre isso – e como era assunto da aula – argumentava do porquê (maquiavelicamente falando) é importante para um governo manter os valores dos impostos em um patamar aceitável. Lembro de ter lido sobre uma regra resultado de uma análise de que até 21% de carga impositiva, é mais barato pagar impostos do que sonegar. Todavia, essa barreira é facilmente transposta quando certos interesses (mormente mesquinhos) se sobrepõem com o qual obtemos o pior dos mundos.

Especificamente sobre a aula que estava preparando, ficava fácil argumentar a razão pela qual as dez tribos judias se sublevaram contra Roboão (filho e sucessor de Salomão) pois ele não quis baixar os impostos mas ainda tornar-se mais duro com o povo.

Então do ditado, me faltava a outra parte, a morte. Ai comecei a escrever, mas acabou ficando muito longo para ser apenas uma nota marginal e por isso decidi escrever este esboço de um artigo que talvez veja em algum outro momento.

Quando uma sociedade começa a não poder saber como, onde, ou de que forma seus mortos são enterrados o terror toma conta da mesma. Isso porque é apenas a morte a que iguala todos os seres humanos.

Uma pessoa pode ter nascido rica, ter crescido bem abastada, frequentar uma boa escola. Mas ai chega um ponto em que ela entende que a sociedade em que vive não faz juz a certos valores que lhe são caros (geralmente associados à liberdade) e começa a lutar por eles.

O regime de plantão primeiro coage, depois censura, após isso trancafia, desterra e… no último dos casos, mata o individuo sumindo com o cadaver.

Com isso, até aqueles que eram contrários originalmente à causa se juntam a ela já que se aconteceu com Fulano, pode acontecer comigo. Ou pior: com meus filhos.

Essa é a razão – em última instância – do encerramento de muitos governos represores e também de certos levantamentos recentes já que é o túmulo (e não o berço) o que iguala os individuos e é ela o ápice do esmagamento de outros direitos.

Baste pensar nos seguintes exemplos em ordem cronológica: a queda dos regimes de exceção na America Latina, o desmembramento dos países do bloco soviético e a primavera árabe. Todos eles tem muitos mortos no porão. As sociedades aguentaram um mundo de coisas. Mas quando chegaram nos mortos, a coisa começou a virar. Pode ter levado anos, mas o silêncio que toma conta da comunicação faz sentir essa virada.

Se nós observamos ao largo e alto da America Latina, há um monte de famílias cuja opção política é contraria àquela que se nega a investigar sobre desaparecidos, mortos sem túmulo, etc. E é isso que modula todo seu pensar já que essas mortes estão grandemente vinculadas com traição ao que lhe é mais íntimo e sagrado.

Mais recentemente o que mais nos afeta socialmente em medio à pandemia da COVID19 é justamente o não poder enterrar o morto sem vê-lo por última vez. Então essas mortes, servem como exemplo e aproximação por analogia para aquelas outras.

Agora, imagine quando se repete a história uma e outra vez de que há um “desaparecido”. Isto é, um morto sem razões suficientes, sem túmulo adequado, sem um momento para a despedida e – via de regra – por razões bizarras. O que pensamos (dizendo ou não) é: “É só uma questão de tempo até acontecer comigo”

É por essas e outras que digo que o ditado popular, mais uma vez, revela algumas verdades muito interessantes. O lance dos impostos o tratarei na aula; mas vejo que essas duas opressões são as que marcam o inicio de uma reação.

Um outro dia gastarei tempo procurando as pesquisas e as referências. (Em especial da barreira de 21%… eu acho que era Indonésia, mas não lembro)